As corporações precisam criar novas perspectivas e dimensões capazes de aprimorar seu relacionamento com a sociedade e com os mercados. A cultura, a ética e a sustentabilidade precisam ser dissecadas muito além das visões departamentais e dos discursos prontos, porém vazios. Investimentos em empreendimentos socioculturais e cidadania corporativa devem ser entendidos como inteligências para a configuração de ações e relações orgânicas, conscientes e efetivas com a sociedade.
Este estudo pretende formular uma terceira via, capaz de abarcar a confluência de interesses público e privado numa sociedade cada vez mais pautada pelo consumo e pela voracidade dos mercados. A proposta apresentada não visa esconder ou dissimular os interesses privados das empresas, tampouco minimiza as fragilidades da gestão pública da cultura e da fragmentação da sociedade civil, alheia e distante dos processos de participação e construção da nossa recém conquistada democracia.
A relação das empresas com a cultura não está restrita à maneira como se desenvolve o seu mecenato empresarial. Deve incluir todas as relações humanas num ambiente organizacional, as dinâmicas de convivência com as comunidades onde se faz presente e a corresponsabilidade pelo desenvolvimento cultural da sociedade onde desenvolve suas atividades mercantis.
A partir das considerações apresentadas, é possível propor uma série de apontamentos em torno de práticas empresariais. Desse modo, atuar em cultura com responsabilidade pode significar:
- A preservação e a promoção da diversidade cultural a partir de práticas culturais de cada indivíduo, grupo social ou território.
- O respeito e a celebração das capacidades locais, desenvolvendo, a partir do diálogo, mecanismos próprios para o aprimoramento dessas práticas.
- A valorização das ações culturais como forma de garantir a autoestima e a capacidade de expressão de todos os cidadãos.
- A garantia do protagonismo das pessoas envolvidas no processo cultural.
- A busca do diálogo e associação das ações com as políticas públicas existentes.
A relação entre uma empresa e a ação cultural incentivada deve extrapolar a mera busca de visibilidade. Nessa situação, os sistemas de aferição quantitativos de audiência e exposição reforçam a falsa sensação de que produtos culturais de alto valor educativo têm menor valor comercial, pois seu apelo tende a ser reduzido.
A análise do objeto de investimento deve levar em conta fatores mais abrangentes como:
- Riqueza e profundidade da pesquisa estética e de linguagem.
- Qualidade e profundidade da experiência cultural.
- Vínculo identitário em relação à memória e à formação cultural do ambiente social onde está inserido.
- Credibilidade dos agentes envolvidos.
- Independência e liberdade de criação e expressão em relação às instâncias de poder (governos, grupos empresariais, mídias tradicionais).
- Resíduo e capacidade de continuidade da ação a partir do investimento.
- Condição e capacidade de sustentabilidade da ação cultural.
Precisamos reconhecer e valorizar a Cultura como elemento fundamental para o desenvolvimento humano e social. Compreende o compromisso de todo cidadão com todas as formas de vida como condição indispensável e indissociável para a sua própria evolução. E trabalha pela construção de um novo sentido público para a cultura, mais abrangente e contemporâneo, capaz de lidar com a compreensão dos fenômenos e contradições da pós-modernidade.
* trecho do livro O Poder da Cultura.
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