fernandoneves
Não sei o que vem por aí ou mesmo se vem, mas, em todo o caso… Mudanças da lei?

É bom que se diga alto e em bom som que, se a lei continuar como está, a arte estará sempre errada e o artista terá sempre que subir, de joelhos e de pires na mão, os 365 degraus da Igreja da Penha para pagar penitência.

Na verdade, fui alertado aqui mesmo por algumas pessoas sobre uma coisa que eu não havia percebido. Que a Lei Rouanet é feita para o empresário que, por sua vez, pode quebrar o nosso galho, isso, quando estiver de bom humor e o seu time tiver vencido. Não é uma maravilha? Sugiro, inclusive, que se não mudar muita coisa na estrutura da lei, ou se mantiver como está, que adote o nome de, “lei do saci de duas pernas”. Estamos mesmo acostumados a encarar um sacizão desse todos os dias, um a mais, um a menos, não fará qualquer diferença e ainda servirá de parafuso da engrenagem institucional de banco. O engraçado é que esse estalo me deu enquanto estava, quase quatro horas em uma fila de banco, um retiro espiritual.

A fila de um banco não é coisa pra qualquer um, o sujeito tem que ser graduado em monge, mesmo que seja um Rasputin Barba Vermelha, e começar a viver a intimidade com todo aquele mecanismo, já que não existe mais gerente em bancos. Tudo depende do sistema, e logicamente o sistema dará aquele abração de afogado na cultura brasileira.

Eu, particularmente, acho mais lucrativo, no meu caso, como músico, ir para um banco de praça, abrir o meu estojo, pegar meu instrumento e começar a tocar, permitindo que a rapaziada do bonde transeunte jogue “um troco qualquer” que, no final do dia, dê para comprar dois pirulitos e uma mariola. Acho isso mais sensato e prudente, quem sabe assim não vou construindo o meu público. Só sei que, com essa revelação espiritual de que a lei é para atender, não a arte, mas sim à empresa, sinto-me hoje numa realidade de quarta-feira de cinzas depois de me embebedar com chá de boldo.

Imaginem meus amigos, nessa terra de doutores, onde as sabedorias seletivas estão associadas às classes dominantes, a nobreza dos pensamentos, dos sons, das artes plásticas, das palavras, das expressões corporais, visuais, está com abrigo garantido nos templos de outrora e, dependendo, até mesmo a filantropia marqueteira de dar esmolas aos sábados, como manda a nossa tradição comercial. “Aí é meio muito pra mim”. Tenho mesmo que pegar o meu cavaco e cantar como Clementina, “ah me dá meu boné que eu já vou embora, ah me dá meu boné brincadeira tem hora”.

Jorge Caldeira tem toda razão quando diz que Mauá não serve como exemplo para o empresariado brasileiro por ser ele um grande empreendedor, principalmente nas estruturas de base. Os empresários brasileiros são, na realidade, negociantes, aspirantes a banqueiros que trabalham o conceito de agiotagem público privada, pois jamais tirarão dinheiro do bolso para investir em cultura, ao contrário e como sempre, usarão recursos públicos para o benefício privado, pior, de forma discricionária, na ampliação de seus ganhos. Somente isso, mais nada. Não querem investimento em absolutamente nenhuma área que por direito é da sociedade que paga seus impostos para investimento em infra-estrutura de seus negócios. Isso é tradição que vem desde as sesmarias. Para esse empresariado brasileiro, melhor dizendo, negociantes, o Brasil ainda é uma capitania hereditária. Esse placebo, difícil de engolir, é um derivado das múltiplas ações do mesmo remédio que chega ao povo em forma de supositório. O princípio ativo que nos é oferecido para essa introspecção que vem com o nomezinho de cibalena, é na verdade “DIMETILAMINOFENILDIMETILPIRAZOLONA”. Isso sim é um nome perfeito para o que vem depois.

Faço minhas as palavras de Leonardo Brant, ditas aqui mesmo nesta tribuna Cultura e Mercado.

“Não somos, e não queremos ser, isentos. Tudo o que escrevemos traz a carga emocional, ideológica e a experiência de vida de cada um. O importe é poder declarar isso. Não temos medo de corrigir nossos medos e equívocos, pedir desculpas por palavras mal-colocadas, contradizer o que acabamos de afirmar. A verdade absoluta é uma busca que exige humildade, obstinação e compreensão da própria fragilidade humana”. (Leonardo Brant).

E defendo, além da economia sustentável da cultura, a parcialidade em prol da arte e do artista e não a do empresário como é o caso da Lei Rouanet hoje. Defendo a cultura construída por uma teia de muitas mãos, independente do Estado e da agiotagem empresarial. E, se a Lei Rouanet é feita para o empresariado, como de fato, que o artista busque na sociedade, mas na sociedade mesmo, nas ruas, não na que se declara representante do povo, sem voto e sem procuração, é melhor que voltemos ao diálogo com os Zes, Tonhos, Silvas, pois, se essa gente construiu este país que hoje resiste até mesmo a uma crise mundial, que muitos não acreditavam ser possível, este povo que também somos, com certeza encontrará soluções viáveis para dignificar a arte e o artista brasileiros. Aliás, o povo brasileiro sempre foi, na essência, o criador e o sustentador de toda a dinâmica cultural deste país, inclusive para sobreviver cotidianamente, cada vez mais esmagado pela tirania do neoliberalismo que, espero eu, esteja com os dias contados.

Assim como está, acabamos usados por toda essa sórdida máquina, como bem disse Villa Lobos:

“Ainda vivemos como nos séculos XVI e XVII, considerando a música um passatempo de moda entre os senhores feudais, (hoje o é entre os burgueses) e o artista, com raras exceções, um galante e privilegiado escravo dos senhores porque escreve ou executa notas musicais”.

Proponho, por uma questão de dignificação e, sobretudo pela ética artística, que o artista brasileiro assuma uma postura de esvaziamento da política da Lei Rouanet que é a lei do empresariado brasileiro. E que jamais esqueça, “o último a sair que apague a luz!”


Bandolinista, compositor e pesquisador.

15Comentários

  • Leonardo Brant, 9 de março de 2009 @ 16:42 Reply

    Carlos, você como sempre pega na veia. Parabéns pelo artigo. Acho que vale acrescentar alguns elementos na discussão. O mecenato é um dos mecanismos da lei rouanet. a lei como um todo é composta por mais dois mecanismos, o FNC e o Ficart. Vamos ao primeiro. Ele é sim um mecanismo de apoio ao ivestimento privado. Ele é para as empresas. Uma lógica de privatização da cultura, iniciada com Sarney e levada às últimas consequências pelo Collor. FHC, o príncipe, foi um grande estadista, no sentido de cumprir a porca e suja agenda política do Collor. Como Lula também vai entrar para o time dos mais recentes estadistas brasileiros, não temos como abrir mão deste instrumento. Ele é importante, até mesmo como contraponto de outros tão importantes quanto este. A possibilidade de diálogo da produção artística com o empresariado, por mais vampiresca que seja a lógica, é fundamental. Mas não sem dinheiro público. Mas a lei rouanet regula também a entrada de dinheiro público. O problema é que ele é muito pouco e mal gerido. Isso sim causa a distorção. Por isso venho alertando aos leitores que não é vantagem acabar com a Lei Rouanet. Ela é torta, errada, mas já é. Vamos brigar por investimentos de vulto, autônomos. A sociedade precisa desenvolver uma proposta concreta de um fundo com essas características e brigar por ela. Precisamos de 3 vezes o valor da Lei Rouanet em invstimento direto do Estado na produção cultural. Só assim teremos um mecenato ativo e no seu devido lugar. Mas enquanto isso não acontece (e não acontecerá enquanto a agenda do Collor sobreviver), vamos de Lei Rouanet!

  • Giovanni D. Porto, 9 de março de 2009 @ 22:05 Reply

    A meu ver, a utilização dos instrumentos governamentais de subsídios à cultura são de extrema importância para o crescimento e desenvolvimento cultural do país, porém o que ocorre é uma eterna disfunção do propósito democrático desse ferramental.

    Os grandes estão sempre se beneficiando desses incentivos mesmo que não faça movimentar a engrenagem, além disso a utilização desse subsídio até o presente momento não é utilizado como um pontapé inicial para a sustentabilidade cultural dos empreendedores de projetos (artistas e produtores culturais) mas sim como forma de se fazer sobreviver a expressão cultural ou de apenas fazer existir sua obra.

    É fato que o artista de um modo geral está a apto, por natureza a produzir arte, porém esse fenomeno (da criação artística) depende intrínsicamente de um trabalho bastante complexo de gestão empresarial, de forma que obtenha uma existência duradoura e auto sustentável.

    A partir desse momento entra em cena uma série de outros profissionais de diversas áreas que deverão cuidar da cadeia de processos necessária para essa sustentabilidade da produção individual, para que a mesma se torne independente do mecenato e se torne um empreendimento de iniciativa privada, que caminha com suas próprias pernas, mesmo depois de ter sido gerida através dos incetivos fiscais.

    O ponto crucial dessa discussão é: o artista deve adequar sua produção, sua criação, sua expressão artística à sustentabilidade econômica do seu trabalho junto ao mercado e às empresas? De onde virá o pro-labore necessário para que o artista possa desenvolver seu papel de criador? E mais, uma vez que o subsidio governamental é apenas de isenção fiscal ficando o investimento de capitais por conta das empresas, o que fará com que estas invistam grandes quantidades de capitais senão a possibilidade de ganhos e prospecção?

    Fui músico durante anos, venho de família de músicos e atualmente curso a Faculdade de Comércio Exterior em Belo Horizonte, onde procuro desenvolver um método de gestão sustentável que proporcione a total independência financeira aos projetos empreendedores do cenário musical.Porém, o que consigo vislumbrar diante de todas as minhas pesquisas e referências é que, ainda precisamos do incentivo governamental, não como gestor da cultura como foi tentado de modo desastroso pelos estadistas descritos acima pelo nosso caro Leonardo, mas como pontapé inicial para o incremento no processo de sustentação da arte como produto comercializável.

    O que vem depois trata-se do estabelecimento de um diálogo entre artistas e produtores de arte com a comunidade empresarial e mais a concepção por parte dos artistas de um modelo de gestão empreendedor de seus negócios, para que seja possível alinhar as necessidades de ambos para que seja possível a inserção desse enorme contingente de criadores, umas das principais riquezas do Brasil, junto ao mercado globalizado.

  • Carlos Henrique Machado, 9 de março de 2009 @ 23:03 Reply

    Leonardo, como sempre as suas observações estão pautadas numa racionalidade que segue uma lógica absolutamente transparente. E se de Sarney a Lula, as coisas não caminharam, é bom que paremos neste exato ponto e juntemos outras peças para engrossar este mesmo cordão. Nem a direita, nem a esquerda, nem o centro, nem o legislativo, o executivo e o judiciário, nem os fóruns políticos e econômicos, a cultura hoje tem lugar estratégico. E aí, infelizmente tenho que voltar a Gil e a ineficácia sobre os quais venho repetindo aqui da visibilidade que o MinC aparentemente teve. Se isso foi melhor ou pior para nós, porque como sabemos, os microfones ampliam as boas e as más qualidades de um orador. E, no caso do universo institucional da cultura brasileira, o que temos assistido em todos esses anos é a reprodução de um perfilamento com ideologias nadas republicanas, nas faculdades de arte, nos resultados quase nulos para a grande maioria do povo, e o pior, a ampliação do fosso entre uma pequena parcela que domina espaços estratégicos do universo da cultura institucionalizada no Brasil e o povo que cada dia se sente mais distante desse ambiente restrito que se acumulou durante todo esse processo que hoje funde o antigo mercado internacional do show business com os grandes dominadores de todo esse sistema, pior, num perfilamento que, em muitos casos, beira um ideário ariano.

    Então, Leonardo, as coisas vão se tornando ralas diante da massa que produz, que ergue este país. Essa cultura dos salões, das leis diretas ou indiretas, vão perdendo a sua legitimidade.

    Lembro-me do período dos festivais, quando Chico cantou um dobrado com toda estrutura de uma banda do interior, com o título “A Banda”, e o país imediatamente se apaixonou porque se viu ali. O mesmo aconteceu com “Diaparada”, “Travessia” e tantas outras. Aquela explosão em que toda a população discutia música nas ruas, nas filas, nos mercados, nas padarias, falando de Tom, de Chico, de Edu Lobo, Milton e tantos outros, era uma manifestação riquíssima e que ganhava no seio da sociedade a legitimidade que Hermeto, Elis, Edu, Jacob do Bandolim, peranto o povo, aos poucos tudo isso foi mudando para pior, caindo a qualidade, a manipulação ficou explícita e o povo abandonou, fazendo com que os festivais perdessem a legitimidade. Não porque estávamos na era dos festivais, não, a coisa é cíclica na qualidade, dos gestores da época que sse utilizaram da má fé e tentaram impingir a marca da imbecilidade sobre o povo. Então, foram negados pelo próprio povo.

    Precisamos fazer uma outr leitura do nosso universo cultural, pois essa leitura que temos como oficial é um fracasso absoluto. Não são somente os governantes que não dão bola para a cultura, o mundo cultural como está é que trata a cultura de maneira menor, manipulável aos olhos deles, uma coisa sem alma, sem espírito de coletividade, sem emoção, sem respeito público, arrogante, unilateral, prepotente, segregadora. Muita gente mentirosa arrotando conceitos, blefando conhecimento quando sequer conhecem de si. E aí, tem o maravilhos jongo cantado pelos escravos desde a época em que eles cantavam em códigos a incompetência dos barões que faliram, que foiremontado e incendiou o Brasil na voz do nosso queridíssimo, o fantástico Almir Guineto que, em certo trecho diz, “Carreiro novo que não sabe carrear, o carro tomba e o boi fica no lugar”, e segue dizendo claramente que a sociedade não é tola, com outra belíssima frase, “O tambor tá batendo pra valer, é na palma da mão que eu quero ver”.

    Sim, tivemos uma decadência em todo o nosso universo de pensar e fazer a cultura dos cultos, rasos, mesquinhos, pequenos, se apropriaram dos poros do Estado. E o resultado está aí, essa caraca impregnada na nossa pele mestiça que a toda hora tentamos esfregar com bucha e sabão de coco.

    Quando vejo o Seminário Internacional sobre Desenvolvimento e a ãusência da cultura brasileira no centro dessa discussão, vejo toda o resultado dessa imprudente política que o Brasil vem construindo mais fortemente nessas últimas três décadas, como podemos discutir o desenvolviemento de um país deixando de lado a cultura do seu povo? Por que grandes debatedores não colocam isso em questão? Por que uma questão tão nevrálgica não está em nenhuma das pautas? Culpa deles ou nossa? A cultura hoje é brinde, é mercado, é esparadrapo numa ferida inflamada para esconder problemas mais profundos como educação, saúde, racismo que nós artistas estamos nos propondo a partilhar.

    Quem seria chamado a esse seminário? Professores de História da Arte brasileira para falarem de París ou nossos maestros para dar aulas de execução húngara e alemã? Ou ficariam lá ouvindo a leitura de uma bula para explicar a conceituação do artista que o marchã resolveu jogar holofotes?

    A cultura do Brasil já foi muito melhor. Estamos prostrados nas mãos de um pensamento obeso, de um pastiche vulgar, dessa replica escravocrata, dessa imbecilidade constituida, uniformizada que não produz uma centelha que fará algo parecido com o fogo que corre na cultura do povo. Isso tudo não tem legitimidade. É um golpe branco das elites econômicas, do burguês burro que leva um pé no traseiro nos salões mais caros.

    Esse alpinismo social em que a cultura serviu de degrau nos jogou num buraco negro, num jogo de varetas, numa poça de merda que hoje não podemos mexer para não fazer ondinha. E o resultado está aí, não há um mínimo de conceito hegemônico na alma da nossa arte institucional. Nada liga com nada, são fios desconectados numa sabotagem bárbara. E o povo, o que fez? Desqualificou tudo e todos que estão envolvidos nesse manancial de um suicídio coletivo.

    Imagino, Leonardo, que só tenha nos sobra uma coisa,inaugurar uma nova frente de discussão sobre a cultura brasileira sob o ponto de vista institucional, pois o que temos aí hoje é algo sem qualquer legitimidade diante da sociedade. Estamos numa ilha distante do próprio país, vendo a nossa capacidade de subsistência rarear pela nossa própria arrogância.

    Um grande abraço pra você e obrigado

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 10 de março de 2009 @ 0:26 Reply

    Leonardo, como sempre as suas observações estão pautadas numa racionalidade que segue uma lógica absolutamente transparente. E se de Sarney a Lula, as coisas não caminharam, é bom que paremos neste exato ponto e juntemos outras peças para engrossar este mesmo cordão. Nem a direita, nem a esquerda, nem o centro, nem o legislativo, o executivo e o judiciário, nem os fóruns políticos e econômicos, a cultura hoje tem lugar estratégico. E aí, infelizmente tenho que voltar a Gil e a ineficácia sobre os quais venho repetindo aqui da visibilidade que o MinC aparentemente teve. Se isso foi melhor ou pior para nós, porque como sabemos, os microfones ampliam as boas e as más qualidades de um orador. E, no caso do universo institucional da cultura brasileira, o que temos assistido em todos esses anos é a reprodução de um perfilamento com ideologias nadas republicanas, nas faculdades de arte, nos resultados quase nulos para a grande maioria do povo, e o pior, a ampliação do fosso entre uma pequena parcela que domina espaços estratégicos do universo da cultura institucionalizada no Brasil e o povo que cada dia se sente mais distante desse ambiente restrito que se acumulou durante todo esse processo que hoje funde o antigo mercado internacional do show business com os grandes dominadores de todo esse sistema, pior, num perfilamento que, em muitos casos, beira um ideário ariano.
    Então, Leonardo, as coisas vão se tornando ralas diante da massa que produz, que ergue este país. Essa cultura dos salões, das leis diretas ou indiretas, vão perdendo a sua legitimidade.
    Lembro-me do período dos festivais, quando Chico cantou um dobrado com toda estrutura de uma banda do interior, com o título “A Banda”, e o país imediatamente se apaixonou porque se viu ali. O mesmo aconteceu com “Diaparada”, “Travessia” e tantas outras. Aquela explosão em que toda a população discutia música nas ruas, nas filas, nos mercados, nas padarias, falando de Tom, de Chico, de Edu Lobo, Milton e tantos outros, era uma manifestação riquíssima e que ganhava no seio da sociedade a legitimidade que Hermeto, Elis, Edu, Jacob do Bandolim, peranto o povo, aos poucos tudo isso foi mudando para pior, caindo a qualidade, a manipulação ficou explícita e o povo abandonou, fazendo com que os festivais perdessem a legitimidade. Não porque estávamos na era dos festivais, não, a coisa é cíclica na qualidade, dos gestores da época que sse utilizaram da má fé e tentaram impingir a marca da imbecilidade sobre o povo. Então, foram negados pelo próprio povo.
    Precisamos fazer uma outr leitura do nosso universo cultural, pois essa leitura que temos como oficial é um fracasso absoluto. Não são somente os governantes que não dão bola para a cultura, o mundo cultural como está é que trata a cultura de maneira menor, manipulável aos olhos deles, uma coisa sem alma, sem espírito de coletividade, sem emoção, sem respeito público, arrogante, unilateral, prepotente, segregadora. Muita gente mentirosa arrotando conceitos, blefando conhecimento quando sequer conhecem de si. E aí, tem o maravilhos jongo cantado pelos escravos desde a época em que eles cantavam em códigos a incompetência dos barões que faliram, que foiremontado e incendiou o Brasil na voz do nosso queridíssimo, o fantástico Almir Guineto que, em certo trecho diz, “Carreiro novo que não sabe carrear, o carro tomba e o boi fica no lugar”, e segue dizendo claramente que a sociedade não é tola, com outra belíssima frase, “O tambor tá batendo pra valer, é na palma da mão que eu quero ver”.
    Sim, tivemos uma decadência em todo o nosso universo de pensar e fazer a cultura dos cultos, rasos, mesquinhos, pequenos, se apropriaram dos poros do Estado. E o resultado está aí, essa caraca impregnada na nossa pele mestiça que a toda hora tentamos esfregar com bucha e sabão de coco.
    Quando vejo o Seminário Internacional sobre Desenvolvimento e a ãusência da cultura brasileira no centro dessa discussão, vejo toda o resultado dessa imprudente política que o Brasil vem construindo mais fortemente nessas últimas três décadas, como podemos discutir o desenvolviemento de um país deixando de lado a cultura do seu povo? Por que grandes debatedores não colocam isso em questão? Por que uma questão tão nevrálgica não está em nenhuma das pautas? Culpa deles ou nossa? A cultura hoje é brinde, é mercado, é esparadrapo numa ferida inflamada para esconder problemas mais profundos como educação, saúde, racismo que nós artistas estamos nos propondo a partilhar.
    Quem seria chamado a esse seminário? Professores de História da Arte brasileira para falarem de París ou nossos maestros para dar aulas de execução húngara e alemã? Ou ficariam lá ouvindo a leitura de uma bula para explicar a conceituação do artista que o marchã resolveu jogar holofotes?
    A cultura do Brasil já foi muito melhor. Estamos prostrados nas mãos de um pensamento obeso, de um pastiche vulgar, dessa replica escravocrata, dessa imbecilidade constituida, uniformizada que não produz uma centelha que fará algo parecido com o fogo que corre na cultura do povo. Isso tudo não tem legitimidade. É um golpe branco das elites econômicas, do burguês burro que leva um pé no traseiro nos salões mais caros.
    Esse alpinismo social em que a cultura serviu de degrau nos jogou num buraco negro, num jogo de varetas, numa poça de merda que hoje não podemos mexer para não fazer ondinha. E o resultado está aí, não há um mínimo de conceito hegemônico na alma da nossa arte institucional. Nada liga com nada, são fios desconectados numa sabotagem bárbara. E o povo, o que fez? Desqualificou tudo e todos que estão envolvidos nesse manancial de um suicídio coletivo.
    Imagino, Leonardo, que só tenha nos sobra uma coisa,inaugurar uma nova frente de discussão sobre a cultura brasileira sob o ponto de vista institucional, pois o que temos aí hoje é algo sem qualquer legitimidade diante da sociedade. Estamos numa ilha distante do próprio país, vendo a nossa capacidade de subsistência rarear pela nossa própria arrogância.
    Um grande abraço pra você e obrigado por este bate-bola.

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 10 de março de 2009 @ 11:08 Reply

    Olá Giovanni

    Gostaria de me estender neste ponto que você coloca abaixo.

    “O ponto crucial dessa discussão é: o artista deve adequar sua produção, sua criação, sua expressão artística à sustentabilidade econômica do seu trabalho junto ao mercado e às empresas?”

    Giovanni, uma das coisas que foram construidas em torno de mitos e inverdades absolutas é que o artista tem que se adequar a um certo conceito de sucesso, como se a qualidade fosse um impedimento para alcançar tal triunfo.

    A indústria internacional nunca quis uma disputa franca dentro do Brasil, ela não foi para o mercado disputar, palmo a palmo, o seu espaço, ao contrário, invadiu redações, comprou colunas e colunistas, comprou rádios e televisõs, não só para divulgar seus produtos, mas também para execrar o produto brasileiro.

    Peguemos a Rádio Nacional que pode quebrar dois mitos de uma só vez, o da qualidade artística e o da associação, da formação educacional com cultura, a qual não me canso de dizer que outro mito.

    Naquele período que é classificado como “a era de ouro”, e você, pela história na música, deve saber que a Rádio Nacional tinha um programa de calouros conduzido por Aey Barroso que revelou grandes nomes como Altamiro, Elis, Tânia Maria e etc. Os maestros Radamés, Guerra Peixe, Moacyr Santos eram músicos de primeira linha se comparados aos grandes mestres mundiais. Instrumentistas como Garoto, Jacob do Bandolim, Dino Sete Cordas, Meira, Dilermando, Pixinguinha, Benedito Lacerda, Donga, João da Baiana, são só alguns nomes do timaço que compunha o extraordinário quadro de artistas nacionais. A rádio era um sucesso absoluto, proporcionalmente maior que a Rede Globo hoje. Ou seja, qualidade sempre foi o forte da Rádio Nacional.

    Bom, vamos agora ao outro mito, o da cultura e a escolaridade que constantemente é colocado em questão, que o homem de baixa escolaridade está associado ao homem de baixa cultura. Compare a média da escolaridade da população daquele período com a de hoje. Hoje é infinitamente mais alta que a daquele período, pois quase não havia universidade e, mesmo as escolas técnicas eram raras.

    O que acontece, Giovanni, é que fomos induzidos a muitos erros por interesses de domínio, então, o que temos, seja no mercado, seja no dito mundo culto, é uma generalizada febre de um corpo que foi abruptamente lesado pela força dos lobbies no domínio da comunicação, que é sim de massa, mas não significa que a massa seja burra, aliás, toda buginganga estrangeira e todas as falácias conceituais e todo pastiche que entrou no Brasil chegaram pela anti-sala da burguesia, até pela lógica de serem potenciais consumidores.

    Há, de maneira geral, um engano na estratégia dos marqueteiros. Agora mesmo estamos assistindo a tentativa de criminalizar o delegado que prendeu o banqueiro, e a população está reagindo de forma espetacular, invadindo blogs, jornalões execrando quem está do lado de Dantas. A sociedade está de olho em toda essa situação e apoiando irrestritamente o delegado Protógenes, pois sabe que rico aqui no Brasil não fica preso. E quando a população pode expressar a sua indignação, como neste caso, ela vem e atropela os factóides, graças à internet.

    Na questão cultural tem um fato que gostaria que observasse. Com o fim das modas musicais que pesadamente chegaram ao Brasil, estamos vivendo o período de uma faláca chamada diversidade cultural. Nessa boiada estõa tentando enfiar gato, pato, porco, enfim, na manada do mercado via lei de incentivo, toda a arca de Noé no numerário do jogo de bicho, como se cultura fosse mesmo um churrasco de gato. E ele se enganam imaginando que a sociedade está perdida. Apostam no velho ditado, o de bêbado não tem dono. Aí, quebram a cara, como vemos.

    Algumas ações hoje no Brasil são um sucesso, ao contrário do que a maioria quer chutar, essas ações se mantêm coerentes com proposta única ou, pelo menos, nas maioria de suas ações com uma única diretriz. Resultado, constrói pensamento, aprofunda os debates e a participação do público aumenta a cada dia. Isso acontece na Lapa, RJ. O mesmo se dá com o Instrumental Sesc Brasil. Dois processos diferente, um, a Lapa de forma natural e o outro, o Instrumental Sesc Brasil, institucional. Os dois mantêm-se coerentes em suas programações, ampliaram seu público, qualificaram seus profissionais, e o resultado não poderia ser outro, sucesso de crítica e público.

    Portanto, esse mito de que a comercialização está associada à baixa qualidade, é uma enorme mentira, pois o samba está aí bombando no Brasil todo, foi para os butecos, biroscas, clubes, uma música de qualidade que abarrota todos os lugares e promove a circulação da economia.

    Enfim, há no Brasil uma idéia, logicamente burguesa, que não me canso de ouvir, é que a orquestra tal foi tocar num bairro de periferia e a comunidade gostou. Ora, claro que gostou, se é através das periferias, grotões, favelas que Brasil se mantém musicalmente rico, é natural que essas pessoas em contato diário com a sua própria música goste de música, seja orquestral, dueto, quarteto, sendo de qualidade, será respeitada e aplaudida. O que essa rapaziada criada culturalmente nas ruas não aceita, é enganador, diploma como referência de cultura. Deslumbrado com isso é a alta burguesia.

    Repito o que disse a Leonardo: para essa sociedade o que vale é a frase, “É na palma da mão que eu quero ver”.

    Por isso Giovanni, precisamos fazer uma revisão no texto da cultura institucional no Brasil, pois o que temos é o restolho de cultura, do lado dos abastados só se sustenta se o Estado der amplo e irrestrito apoio, e o mercado, principalmente o internacional com cem por cento de garantia de votos com a compra da mídia, e ainda adulterar a urna.

    Obrigado por suas belíssimas colocações.

    Grande abraço.

  • Leonardo Brant, 10 de março de 2009 @ 11:11 Reply

    Carlos, acabei de estudar a política cultural brasileira de cabo a rabo, para o novo livro que devo lançar em breve. Não existiu um outro momento com tanto investimento em cultura como há hoje na história do Brasil. E este investimento, pela primeira vez, não está a serviço de um projeto político governamental. Isso é bom por um lado, pois vejo artistas conquistando dignidade fora do circuito governo/rede globo. E ruim, pois o custo para a arte e para a sociedade pode ser irreversível, concordo com vc nesse ponto. O que talvez discordemos é sobre o peso que isso tem sobre o sistema. Vejo o mecenato como apenas mais um indicador de uma doença maior: o Estado sendo tomado de assalto pelas corporações, sobretudo globais.

    Para as empresas, o investimento em cultura é um nada. Não é estratégico, tático no máximo. Isso pode ser oportunidade para quem faz cultura, pois temos as brechas das corporações abertas. E não há nada melhor do que essas brechas para compreendermos as lógicas do mercado e dialogarmos melhor com elas. Ou até mesmo para combater ou contrapor essas lógicas, como venho tentando fazer há anos.

    Meu medo, e confesso que penso e atuo movido por ele, é perder essa moeda interessantíssima, que é ter o centro do poder do mundo (as corporações) lado-a-lado com a cultura e com a arte, ainda que de forma frágil e contraditória. Uma moeda dessas de contrapeso para exigirmos do Estado a sua responsabilidade perante a cultura é fundamental, pois dá aos agentes do mercado a possibiidade de livre movimentação diante da centralização do Estado em relação à cultura.

    Não vejo uma relação de dignidade entre Estado e cultura. Pelo contrário, nunca foi tão clara a gestão política sobre os financiamentos estatais. Vejo o governo tripudiar em cima de mestres da cultura popular, com esmolas cada vez menores. Somos capitalistas, precisamos de mercado. Não quero uma sobordinação a esse deus-mercado. Pelo contrário, quero investimentos públicos três vezes maiores do que os privados, com transparência. Por isso é importante reforçarmos a importância do mecenato, da redução da carga tributária.

    Há um movimento coordenado para sufocar os agentes culturais, deixá-los à míngua, totalmente dependentes do Estado para depois alimentar a conta-gotas. Uma prática tando da direita maldosa quanto da esquerda despreparada.

    Por isso Carlos, acho que não é estratégico combater a lei rouanet neste momento. É tiro no pé, pois continua sendo a nossa única garantia de sobrevivência diante da fúria controladora do atual governo.

    A Lei Rouanet é responsável pela injeção de um bilhão de reais em mais de 10 mil projetos. Tem distorções, todos sabemos, mas não há nada comparado à sua capilaridade e abrangência nas políticas públicas de cultura.

    O Estado precisa fazer a sua parte, enfiar 3 bilhões numa conta, criar meios concretos de distribuir renda para os milhares de agentes culturais espalhados pelo país. Depois disso, quero discutir a Lei Rouanet. Enquanto não chegarmos lá, sou contra.

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 10 de março de 2009 @ 14:12 Reply

    Oi Leonardo, neste ponto discordo de você.

    “Não existiu um outro momento com tanto investimento em cultura como há hoje na história do Brasil. E este investimento, pela primeira vez, não está a serviço de um projeto político governamental”.

    Ao contrário, Leonardo, ficou bastante claro que, em primeiro lugar, com a presidência da OSESP nas mãos do principal cacique político do PSDB, o charmoso, ex-mil coisas, Fernando Henrique Cardoso e a demissão política, por email, do maestro John Neschling em razão das crítias feitas por ele ao candidato de FHC, deixa bastante evidente que há uma clara regra política em todo esse processo, da instituição pública, OSESP, com a maior visibilidade dos últimos tempos. E a ordem está associada ao que tem de pior no jargão político eleitoreiro, “ou está do meu lado ou está contra mim”. Este é um modelo tradicional à moda do coronel ACM que, aliás, tinha isso tão forte que fez com que FHC,quando presidente, pedisse desculpas, de joelhos, a ele em rede nacional.

    A imprensa paulista, principalmente transformou a OSESP, dentro de um, a meu ver, discutível conceito de qualidade como brasão da política cultural do governo do PSDB, fosse qual fosse o candidato ao governo de estado ou da presidência. Então, ela é sim um instrumento de poder do estado de São Paulo, PSDB, principal opositor ao governo. Digo mais, este modelo da OSESP espalhou suas apostilas por muitas prefeituras do PSDB, inclusive do projeto Guri.

    Repito, a arte pode sim ser instrumento de política de estado e do governo federal, estando ou não no comando, porque o uso dela na disputa´pelo poder é um instrumento de unificação em torno de uma causa cultural. Isso é tão forte que deveríamos assistir a um levante de toda a classe artística contra, aí sim, um estado policial onde um artista não pode falar mal de um governador, pois em consequência, será demitido por email. Isso não somente um descaso com o maestro, mas sim com todos os profissionais da arte. E alguém falou alguma coisa sobre este assunto? E a veja, Estadão, o Globo, por acaso disseram que isso é stalinismo? Cadê a indignação daqueles artistas do Canecão com este ato impositivo de lei da mordaça com um profissional da arte? E o secretário de cultura de São paulo, tão valente contra o MinC em defesa da OSESP, no que classificou como perseguição política, por que se emudeceu lá e não se ouve em lugar nenhum? Porque é da patota política.

    Tudo isso e as ramificações em todos os estados brasileiros dessa prática arbitrária de ideologias sociais tão afinadas com a modernidade fernandista tornam-se ferramentas de cooptação, de alienação e de instrumento político eleitoral nas três esferas do executivo, estando ou não o orientador desse processo, no caso, FHC, na presidência da república. É nítido que a OSESP era instrumento de marketing político sim. Agora, com essa mancha negra que ainda vai dar muito o que falar, é provável que o príncipe/sapo pule fora do brejo e vá presidir qualquer outra coisa além do seu instituto muito bem patrocinado por sinal.

    Então, a instrumentalização não está num conceito meramente hegemônico, porque o governo não tem o controle sobre o destino dos recursos da Lei Rouanet. Ao contrário, Leonardo, quando vemos a estática que instituições como Febraban, Fiesp e a imperatriz da comunicação, a Globo, nitidamente anti-Lula e pró-Serra, vemos que a Lei Rouanet hoje é o principal acessório de instrumentalização política, aí sim a sociedade nunca viu.

    Há mesmo mais verba para a cultura, mas com certeza a fotografia que temos apresentada em números, a cultura nunca foi tão instrumentalizada, manilável no jogo político. O que significa que ela vai se constituindo numa clara lei sem legitimidade diante da sociedade.

    É lógico que a esquerda não tem projeto algum de política cultural. E fica explícito que um formulário de 14 páginas como o do Pontos de Cultura ou de qualquer outro programa de repasse direto às manifestações culturais da sociedade, a esquerda não tem a menor idéia do que sejam as questões profundas sócio-culturais deste universo. E aí há manipulação social e política da mesma forma. O resultado está aí, comunidades inteiras em mãos de pessoas que estão dentro da estrutura do Estado brasileiro, usado como barganha política, principalmente nas esferas estaduais e municipais, quando, na maioria dos casos, não são abandonados ao relento, dependendo das instituições religiosas, comércio varejista para a aquisição de indumentárias e instrumentos.

    Por isso, Leonardo, reclamo tanto das nossas academias de arte. Seriam elas as guardiãs científicas e morais a dar suporte a uma política de valorização do homem através da sua cultura? Na realidade, é o Tango do Covil e, infelizmente deste mato não sai mesmo coelho em prol da cultura brasileira.

    Por isso, a tribuna Cultura e Mercado é hoje uma ferramenta fundamental para a cultura brasileira, pois estabelece uma relação de diálogo tão franco como vem acontecendo.

  • tito, 11 de março de 2009 @ 10:32 Reply

    como em outras participações, concordo plenamente com Leonardo, a atenção deve ser no FNC e não no Mecenato. Seria interessante uma mobilização da classe artistica para cobrar do Minc que faça uma reforma no FNC primeiro, amplie esse fundo e redistribua com transparência, ou seja, faça a sua parte, depois pense nas distorções do mecenato, por enquanto o mau empresáio que fala o Minc é o único que investe em cultura independente de seus interesses. O Minc tem feito insistentemente a política de “falar mau dos outros é melhor do que propor mudanças efetivas”.

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 11 de março de 2009 @ 12:32 Reply

    Tito!
    Os erros do MinC não abonam os erros de ninguém.

    Não podemos relativizar erros nesta questão e tratar de maneira seletiva os gargalos que impedem que todo um sistema de ações combinadas traga beneficios à produção artística brasileira.

    Os furos são letais de ambas as partes, não é uma questão meramente de calibre.

  • Leonardo Brant, 12 de março de 2009 @ 9:11 Reply

    Essa discussão está muito interessante. Pena que tive de ficar fora dela por dois dias.

    Penso que o uso e o abuso do poder, tanto no caso da OSESP quanto no caso do MinC, são vícios antigos do Brasil, relacionados à constituição do Estado e ao nosso frágil estágio de democracia.

    Mas não podemos colocar a culpa no mecenato. A Globo usa, e usa bastante, o governo também usa. Mas temos 10 mil proponentes utilizando. A grande massa dos utilizadores da Lei são projetos de até R$ 100, R$ 150 mil. Não há outro instrumento público que substitua isso, pelo menos por enquanto.

    Carlos: compreendo, concordo e fico indignado tanto quanto você com todas essas coisas. Mas o pior jeito de combatê-las, estou convencido, é cortar o mal pela Lei Rouanet. Ela está muito distante da raiz.

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 12 de março de 2009 @ 10:38 Reply

    Leonardo, a minha grande preocupação não é exatamente esta, da lei ou dos recursos com repasse direto, é na verdade, a de substanciar uma paisagem que inverta este varejismo que muito tem a ver com Gil. Estamos, sem perceber, há muitos anos na tentativa de contrapor ao mercado nos jogando num ambiente menor, distante dos aspectos antropológicos da cultura brasileira, que são o nosso grande ativo.

    Quando discuto que a cultura do rico no Brasil é uma cultura de brindes, acessórios das suas necessárias referências, bem ao estilo bicheiro, não estou exatamente preocupado com os rios de dinheiro que correm por esse caminho do universo comprado, clonado de outras civilizações que não podem ser apresentados como sustentador de um diálogo global.

    Se o Bradesco crê que investir em Broadway como faz em sua campanha instituciona tem peso substanciada na lógica de diversidade, enquanto imagem, é possível compreender que ele, mesmo acreditando ser um equívoco do ponto de vista comercial, que tem o direito até de patrocinar os golfinhos de Miami e etc. O problema é que esse quadro reduz toda essa discussão em torno da grandiosidade da cultura de um país a um pensamento de clube de diretores lojistas para aquecer as vendas de natal. Um papai Noel de shopping, um gatilho qualquer de estímulo a um determindado produto. Isso nada tem a ver com o desenvolvimento do país porque trata de uma coisa meramente publicitária. Não há nisso nada a não o próprio evente em si.

    A nossa discussão, a partir de Gil, ao contrário do que muitos dizem, se apequenou. Gil é um grande artista, tem conhecimentos profundos da arte, das questões do país, do homem brasileiro, mas preferiu apostar na aventura de tentar fazer de tudo, um mercado, emprego, renda. E tenho certeza que ele também estava pressionado pelo momento e em dar a cultura significado de produtividade contratando mão-de-obra, ou seja, acabou por jogar a cultura num paralelo da construção civil. Com isso, fomos jogados num embaraço, pela desestrutura própria desse universo brasileiro, por ordem do sentido de sazonalidade e ficamos fora do foco da grande discussão nacional.

    Infelizmente, Leonardo, hoje a cultura não é mais vista, e com toda razão, como uma mola propulsora do aspecto macro do desenvolvimento nacional. Isso não muda em nada as bases estruturais. As congadas mineiras, os congos capixabas, as folias de reis, os jongos, e tantas outras manifestações são de um país republicano e se sustentam por obra de um outro sentido cultural, como você cita em seu livro, “Diversidade Cultural”, a lógica do pertencimento, com força simbólica estão muito distante da discussão sobre economia cultural, o que termina por jogar luz com foco errado na cultura, como um balcão de pescaria infantil.

    Então, a nossa cultura está ficando cada vez mais distante dos centros nervosos das grandes discussões. Quem perde não é a cultura, mas o país como um todo. O Brasil precisa muito mais de sua cultura do que a sua cultura do brasão do Estado. Este conceito vem sendo contruido no Brasil durante quinhentos anos, como é da naturezada cultura do povo. Saber fazer essa leitura é a nossa maior urgência. E o primeiro passo a ser dado é inverter a conceituação. A educação precisa da cultura, não o inverso, porque é a cultura que propõe diretrizes a partir do homem, e aí, volto à Broadway, sem a menor implicância ou xenofobia, mas o que aquilo pode contribuir com o país quando somos jogados no centro da discussão como ja aconteceu em muitos momentos da vida brasileira, principalmente na Semana de 22.

    Nã há vilões, não há heróis, este é um erro que fomos buscar no mercado norte-americano, gente salvando o planeta. A cultura tem que se desvencilhar dos ícones, ela diminui a sua função quando caminha por essa dependência, pior, fica efetivamente sem legitimidade diante da sociedade. Cultura não é o lugar para detentores de verdades absolutas. Essa introspecção de agentes alheios à sociedade, como muitos creem ser possível com couvers de outras civilizações, tão apreciada pelo nosso universo erudito, é nos jogarmos numa sentença diminuta diante do que de fato interessa a um grande debate, seja em que aspecto for. Essa, a meu ver, é a grande questão. Não defendo fronteiras comerciais e ou estéticas, ou uma xenofobia barata, mas acredito que seremos sempre, interna e externamente, respeitados quando apresentarmos, numa troca de flâmulas, algo que de fato represente hegemonicamente o sentimento comum do homem setanejo, matuto e dos pampas. Não uma lógica conceituada num plano de governo, até porque qualquer coisa fora das escolhas da sociedade, será sempre uma massa falida de argumentos.

    A justiça, coisa fundamental para a democracia, está associada a muitas questões no que se refera à cidadania do homem, mas sobretudo, o diretio de se expressar a aprtir de suas lógicas e sentimentos.

  • tito, 12 de março de 2009 @ 16:16 Reply

    Oi Carlos, entendo e concordo perfeitamente com suas colocações, você assim como o Leo seriam excelentes opções para assumir o Ministério, mas acho que suas colocações estão diretamente ligadas a políticas públicas de cultura com valorização das manisfestações artísticas plurais de nosso País, acredito que o conceito de Mecenato é diferente, apenas uma ferramenta de marketing comercial utilizando isenção fiscal que por sua vez promove a atuação de artistas que de alguma maneira atendem os interesses comerciais da empresa.

    Vc acha que a aprovação dos projetos de lei Rouanet deveriam ser conceituais? ex. beneficiar projetos que promovam a nossa diversidade cultural, sejam descentralizados, democrático, com teto máximo para proponentes, etc… seria até interessante, mas e na hora de passar pela empresa, será que eles estão preoculpados com isso?

    Claro que seria interessante um trabalho de concientização dirigido empresario, do tipo “investir na cultura utilizando isenção de impostos e tb valorizando nossa diversidade cultural” mas continuo achando mais fácil a utilização de fundos para investimento mais democrático em paralelo ao mecenato.

  • Maria Alice Gouveia, 13 de março de 2009 @ 7:50 Reply

    Carlos Henrique:

    Creio que depois de longo período de discordância, tenho que dar a mão à palmatória e dizer que concordo em larga margem com o que você disse neste seu último post.
    acho que ficar discutindo a cultura brasileira apenas sob a ótica da lei Rouanet é como, mal comparando, ficar discutindo a escrita sob a ótica da caneta Bic ou do lap-top.
    A Lei Rouanet foi criada como instrumento, num momento de desespero da classe artística, já que Collor havia extinto todos os canais de dialogo e também de repasse de verbas do governo federal para as produções culturais. Esse instrumento tomou essa feição, em parte, porque sabemos (pelo menos os que como eu trabalharam anos na administração pública)que é muito mais fácil o governo abrir mão de receita do que criar despesa. E também, como Collor já havia deixado claro o seu repúdio a tudo que fosse cultural, o que sobrava, senão apelar para as empresas, nem que fosse por uma contribuição interessada (que é o que a lei prevê), e em vários casos interesseira -o que a lei tenta timidamente barrar.
    Por isso eu concordo plenamente com você quando diz que não há viloes nem heróis. Temos que sair do pequeno e começar a pensar grande. A subvenção direta do governo, como você bem mostra no caso da OSESP que é apenas um de uma legião, leva à subserviência, ao “você não sabe com (ou de) quem está falando”. Vamos que vamos. Obrigada, Carlos e um grande abraço. Maria Alice Gouveia

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 13 de março de 2009 @ 16:10 Reply

    Tito e Maria Alice

    Vou responder aos dois. A cultura nasce e se mantém de forma natural, tanto nos seus aspectos ativos ou passivos, ou seja, artista e sociedade como forma de estabelecer diálogos, construir demandas de pensamentos críticos, um mesmo ser humano reage artisticamente dentro do seu tempo e espaço, não há como fugir disso. E o instante da arte pode nos revelar alegrias e perturbações e, dependendo, pode imortalizar uma paisagem pelos seus aspectos em determindado período político da sociedade. E dentro dela, os focos vão sendo ampliados por vários agentes. A mesma quesão será vista por vários ângulos, o que proporcionará caminhadas no sentido do futuro mais produtivas pela força do próprio equilíbrio. Não sabemos quem são esses personagens, e nem cabe a arte analisá-los simplesmente como personagens, mas elementos que estão inseridos num contexto que, podem sim por força meramente simbólica nos colocar diante de um quadro de síntese. Tentar reproduzir aquele momento, ou seja, copiá-lo é um erro tão gritante quanto o jogo de advinhação do futuro.

    A cultura não faz julgamentos, não anda pra frente e pra trás como muitos querem, ela tem sua própria cadência, com mais ou menos injeção financeira. Qualquer ato que perturbe esse ambiente funciona como um cisco em nossos olhos, um objeto estranho àquele funcionamento. O que nos cabe neste momento, é a observação do que é componente desse globo ocular e o que é cisco que chegou trazido por ventos, furacões, por força alheia a naturalidade, tenha o olho a cor que tiver, azul, verde, castanho ou preto. Essa coloração fica neste momento em segundo plano, não pode ser ela o ponto de análise. Teremos que compreender porque se deu o vento ou o furacão, a partícula que invadiu esse meio e o remédio capaz de devolver a ele suas funções naturais que vão ficando mais opacas naturalmente, mas servirão como base para o desenvolvimento de outros olhos de outras gerações. Mas aquela visão não volta, não simplesmente porque ela não pode ser recuperada, porque as imagens que ela hoje guarda só existem na memória daquela retina. Os outros olhos que virão independentes da genética, enxergarão outros aspectos do mesmo mundo, mas o mundo mudou e o seu emocional não é o mesmo.

    Por isso a cultura e a arte não são obra de um querer individual que fará político sob o ponto de vista orientador. Se assim fosse, estaríamos travados na primeira fase da lei de Darwin. É a cultura do homem, no seu cotidiano, que orientará o artista, o gestor, o produtor, o político, o comerciante, o empresário, o capitalista e o comunista.

    Por isso, construir uma visão discrcionária de benefícios, vamos construir uma visão discricionária da própria sociedade e, com isso, estimular ainda mais os nossos grandes desequilíbrios.

    A cultura é o grande ativo de uma sociedade justamente porque é o campo nervoso da nossa crítica que nos faz refletir sobre todos os nossos aspectos emocionais e, consequentemente, serão expostos através de diálogo com a sociedade, uma manifestação condizente com este momento. E isso inclui os traumas, alegrias e tristezas dos ricos e dos pobres e suas necessidades. No entanto, acabamos nos encontrando com o sentido humano comum, mas como as demandas de intervenção, principalmente civilizatória é maior num mundo, digamos, culto, tão amedrontado em se ver em qualquer tipo de atraso que a sua necessidade de aquisição, fruto de sua perturbação social, nos joga na crença de que este estado de espírito merece mais investimento.

    Do início ao término do ciclo do homem, vamos estabelecer desenhos, não de forma meramente mocional, mas social, mas os dois, efetivamente, serão devolvidos ao lugar de origem e ao mesmo ponto de equilíbrio, disso não temos como fugir.

    Na cultura, quando trabalhamos com a cadeia seletiva, mais, menos, herói, bandido, certo, errado, somos imediatamente remetidos ao erro. Esse não é um mundo de julgamento, é um mundo de reflexão e não podemos refletir sobre mentiras, dados falsos, manipulados pela ganância, pelo interesse e pela mesquinhez. Não podemos nos jogar na aventura de sermos desumanos com os outros para sermos mais humanos conosco. O corpo de uma sociedade assim apresentará distorções, doenças. E o braço polpado durante anos de trabalho duro, pagará, quando aquele outro braço tão sacrificado adoecer, pois será devolvido doente ao mesmo corpo, agor,a sob o ponto de vista global.

    Portanto, o equilíbrio das forças, ou seja, dos pensamentos, dos sentimentos, é questão primária, fundamental. O equilíbrio não está numa questão ideológica de direita ou esquerda, ele está na lógica de origem, para a rosa, nem tanto sol, nem tanta chuva, a busca por equilíbrio num ambiente tão contaminado é a principal função da leitura contemporânea de uma sociedade.

    Por isso combato tanto a sagração unilateral da arte conceitual e, ao mesmo tempo, da musculação musicval imposta pela visão atlética que alguns domadores impõem hoje à crianças e adultos que só suportam uma jornada dessas debaixo de psicotrópicos. Como se diz popularmente, isso é jeito e não força. E garanto a vocês, Tito e Maria Alice, da mesma forma que há contribuição igual do empresário, do gstor, do artista, do produtor, do historiador, do antropólogo, enfim, de toda a sociedade para se construir, não exatamente modelos, mas módulos que podemos classificar como projetos que contemplem o conjunto da sociedade em que esses cidadãos nascem, crescem e morrem. Da mesma forma, pensando corporativamente, os mesmos agentes farão buracos no casco da mesma canoa e irão todos naufragar mais rapidamente.

    É por isso que fujo de vilões e heróis. Agora mesmo, a minha discussão sobre o choro não está mais propriamente no estilo, que fará tempo e local. Tenho discutido que o choro é um estado da alma, da arte brasileira, pela nossa própria formação, triste na felicidade e felizes na tristeza. Galhofeira e científica, crítica e afetiva.

    Abraços a vocês e obrigado por enriquecerem o debate.

  • marcelo Varanazzi, 30 de maio de 2009 @ 13:25 Reply

    Meu caro, com apenas uma pergunta, pdoera’ entender o que menciono:Porque os artistas (ricos)Globais, manipulam a lei Ruanet?E porque essas empresas, partocinam apenas esses artistas, que nem vou citar muitos, como a Atriz Fernanda Montenegro,cito essa em especial porque a filha e o Genro sao donos de companhia de cinema .Essa e mais uam meia duzia, manipulam o “mercado Ruanet”.A gente tem tanto talento, com leis, esperando ha 8 meses para serem aprovadas, perceba, em Brasilia, para serem editados no diario Oficial.’E muito louco essa linha fina, obscura e trasnparente dos dirigentes desse departamento.Portanto, vimos que foram demitidos alguns deles, mas continua essa jogada de se manipular a Leia Ruanet para o eixo Rio e Sampa.E ,pode perceber que todos os projetos desse eixo,recebem o carimbo imediato dos dirigentes desses deptos.Vc me diria o que disso?’E fato verdade, estamos tratando de algo que existe!Compreende?Portanto, objetive o assunto.Obrigado!

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