O público consumidor de quadrinhos, animações, jogos de RPG, card games e afins sofreu durante muito tempo com a falta de um mercado nacional que disponibilizasse estes produtos. A dificuldade de produção e de divulgação foram alguns dos fatores que minaram o desejo de alguns desenvolvedores de criar produtos para esse público.
No entanto, o cenário parece estar mudando. Enquanto o governo faz a sua parte, incluindo os jogos eletrônicos nas categorias que podem ser beneficiadas pela Lei Rouanet, os produtores independentes tentam por suas ideias em prática com a ajuda do financiamento coletivo. Projetos que englobam este mercado estão surgindo cada vez com mais frequência nos sites de crowdfunding. E mais: atingindo suas metas de arrecadação cada vez mais rápido.
Um destes casos é o jogo de RPG Violentina. Baseado no imaginário criado pelo diretor Quentin Tarantino, em filmes como “Pulp Fiction” e “Cães de Aluguel”, o jogo foi desenvolvido pelo arquiteto e urbanista, Eduardo Caetano, justamente para suprir a falta de produtos originais no mercado nacional.
O projeto foi ao ar pelo Movere e, em três horas, conseguiu atingir a meta de R$ 2 mil. Ao fim do prazo estipulado, o jogo havia arrecadado mais de R$ 9 mil. Segundo Caetano, o sucesso pode ser atribuído a vários fatores, como “a criação prévia de uma comunidade em torno do jogo, o apoio da blogosfera em parceria com a editora Secular Games e a própria repercussão inicial que o primeiro dia da campanha gerou”, explica.
Para ele o crowdfunding deve impulsionar o desenvolvimento desses produtos no país. “Os geeks são pessoas extremamente criativas. Deve existir muita ideia legal por aí, em banho-maria, esperando uma oportunidade pra sair da garagem”, afirma.
Quem também se deu bem com o financiamento coletivo foi o projeto Feed It!, jogo digital criado por estudantes da Design de Games da Universidade Anhembi Morumbi, que tem como base alguns elementos retirados do filme “A Pequena Loja de Horrores”. Atualmente em desenvolvimento para iPhone, iPad e iPod Touch, o projeto, hospedado no Catarse, ultrapassou a meta de arrecadação (de R$ 8,9 mil), somando R$ 9.865. “Quanto mais os projetos geeks forem concretizados utilizando as plataformas crowdfunding, mais os grandes portais de internet vão voltar suas atenções para esse público que está em crescimento”, afirma Luiz Dias, um dos desenvolvedores do projeto.
O sucesso dessas iniciativas nas plataformas de financiamento coletivo impulsionou outros produtores e desenvolvedores a apostarem no crowdfunding. A empresa Kaplan Project Comics, por exemplo, levou ao Movere o projeto do card game Mercenary Crusade. O jogo de cartas colecionáveis foi pensado como um dos elementos da narrativa, que também inclui brinquedos, jogos digitais e outros produtos licenciados.
A captação do projeto está em curso. Com o dinheiro, os desenvolvedores pretendem realizar a primeira tiragem do jogo. Para fazer com o que o projeto chegue ao maior número de pessoas – fase essencial para financiar um projeto coletivamente -, eles apostam na divulgação através de sites voltados para o universo geek e nas redes sociais, especialmente o Facebook. “Essas duas estratégias são fundamentais e capazes de criar o ‘buzz’ necessário para que alcancemos quem nunca ouviu falar de nosso trabalho”, afirma o desenvolvedor Alex D’ates.
Para ele, o mercado nacional geek deve apostar no licenciamento de marcas e produtos voltados para esse nicho. Este é o caminho que a Kaplan Project Comics deve seguir. “Nosso empenho é de criar um universo de personagens e histórias consistente, bem como de produtos que partem desse todo”, declara.
Há 51 dias do término da fase de arrecadação, o projeto Card Goblins já superou a meta de R$ 3 mil. “O jogo tinha tudo para dar certo, mas como não há cases de Card Games independentes, seria muito arriscado bancar e não acharíamos um investidor que quisesse arriscar”, diz Tiago Junges, desenvolvedor do jogo de cartas, sobre a escolha de colocar o projeto para financiamento coletivo.
Para ele, existe uma nova “moda geek” que deve aquecer o mercado brasileiro e incentivar os produtores a tirarem da gaveta seus projetos. “Presenciamos um grande ‘bum’ no mercado nacional independente de RPGs no ano passado e acredito que ele se estenderá aos jogos de tabuleiro em 2012/2013”, afirma.
Quanto à eficácia das plataformas de financiamento coletivo, ele declara: “O crowdfunding ajuda o independente a se tornar visível e temos muita gente boa produzindo muitos jogos e materiais bons por aí, só esperando uma oportunidade para aparecer”.