Bate vento novo no Sul, mas não é o minuano clássico dos invernos. Em junho de 2010, depois de dezoito meses de debates, a Assembléia Legislativa aprovou a Lei 13.490, novo marco da cultura do Rio Grande. Projeto do Executivo apresentado em fins de 2008 como resposta a mais grave crise do sistema estadual de incentivo à cultura, o texto foi aperfeiçoado e representa uma grande esperança para os produtores culturais do Estado.

Criada em 1996, a LIC – Lei Estadual de Incentivo à Cultura injetou mais de 300 milhões de reais na cultura gaúcha. Como sói acontecer, não foram criados mecanismos de gestão para dar conta de tamanho sucesso, especialmente na análise de prestações de contas. Turbinada pela Lei Bernardo de Souza, de 2001, assim nomeada em homenagem ao recentemente falecido deputado que acolheu a proposta da comunidade cultural, a captação de recursos atingiu mais de 30 milhões/ano entre 2002 e os anos seguintes. Pelo texto, as empresas menores puderam investir mais e 200 municípios gaúchos entraram no sistema. No mesmo ano, foi criado o FAC – Fundo de Apoio à Cultura, que permaneceu no limbo até hoje por falta de dotações dos sucessivos governos.

A gestão polêmica de Yeda Crusius no Governo se iniciou com 1.200 prestações de contas sem análise e a virtual paralisação do sistema por ordem do Tribunal de Contas. Confiada à alienígena Monica Leal, que logo escolheu para si o papel de Elliot Ness da cultura, a SEDAC – Secretaria de Estado da Cultura entornou o caldo de vez. A mídia marrom entrou na parada quando apareceram bandidos de verdade e a primeira prisão de um produtor cultural no Estado por falsificação. Como se sabe, uma andorinha faz a noite quando a imprensa a escolhe como símbolo. A resposta imediata foi a queda da captação de recursos a patamares ridículos e inéditos.

O projeto que chegou à Casa do Povo tinha uma virtude básica: a sinergia entre o incentivo indireto – Benefícios Fiscais – e o direto – Fundo de Fomento. Para ter o benefício, o contribuinte deveria doar a parte não dedutível ao FAC.  Na versão aprovada, para deduzir cem por cento o contribuinte doa dez ou cinco por cento (patrimônio histórico). Foi mantida a tabela da Lei Bernardo, segue cabendo ao CEC – Conselho Estadual de Cultura escolher os projetos contemplados e a comissão que decidirá o apoio do FAC será constituída em separado. Definiu-se de vez o significado da regularidade do Produtor Cultural e os mecanismos de controle foram aperfeiçoados.
Como concessão, a comunidade cultural concordou que o teto do benefício anual será de até meio por cento da receita líquida do Estado, mas nunca inferior ao teto do ano anterior. Em suma , algo entre os 28 milhões que o Governo tem autorizado nos últimos anos e o valor real, cerca de 80 milhões. No início de 2011, caberá ao Governador eleito definir por Projeto de Lei o teto do ano.

Sem mecanismo local forte e casa arrumada, ficará complicado gerar contrapartidas a investimentos federais. Esta deverá ser a regra contemplada para atrair recursos da União no polêmico PL 6722 , o Pró Cultura, que o Ministério da Cultura tenta emplacar no Congresso até o fim do ano.

Pioneiro na implantação da LIC, o Rio Grande tem agora um mecanismo moderno, que une fomento indireto por incentivos fiscais a um fundo que distribuirá recursos por edital. A tarefa que resta, a que o tempo demonstrou ser bem complicada,  será dotar o gestor dos meios para administrar esta conquista e evitar que os urubus tomem conta de novo do campo.

Vale a pena conhecer a Lei 13.490 na íntegra, aqui mesmo no Cultura e Mercado: clique aqui.


Produtor e diretor de cinema e TV, atua também como advogado e consultor cultural. Fundador e primeiro Presidente da APCERGS, é Secretário do SIAV-RS.

1Comentário

  • paulo tedesco, 9 de agosto de 2010 @ 9:10 Reply

    Excelente comentário, parabéns. Raro ver coisas como essas, nesse tom, muito bom mesmo. A cultura merece e agradece.

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