Com o crescimento das redes computacionais e, principalmente, o crescimento da importância da Internet, o tema inclusão digital ficou mais que no foco de ONGs e do discurso político como forma de promover, não só o fator humano, mas também a própria política.

Fotos com negros e mulatos sentados de frente para um monitor pálido como os beges e encardidos CRTs e computadores montados de carcaças recicladas da sociedade branca, higiênica e politicamente correta, que mau são capazes de rodar um Windows XP, povoam os noticiários e propagandas “filantrópicas” convocando a sociedade a doar o seu lixo eletrônico para quem não pode ter nada além desse lixo digital.

Mas a inclusão digital é bem maior que filantropia. E foi num dia desses, em que tive a necessidade de entrar em Piraí – RJ, quando viajava pela Dutra, para acessar um banco 24 horas, que encontrei o sentido de inclusão de fato. Ao entrar na cidade, passando pelo seu parque industrial que dá inveja a algumas capitais, e passando pela principal praça da cidade, me deparei com uma cena, que para muitos no Brasil, seria surreal. Estavam lá, crianças com seus notebooks recebidos nas escolas pelo projeto do governo federal acessando a Internet, na praça, sentados em pares ou trios, compartilhando a INFORMAÇÃO GRATÚITA de uma Internet sem fio e pública promovida pelo governo municipal.

Fiz questão de saltar e passear por entre eles, seus PCs rodavam uma versão do Linux, que é um sistema operacional livre, uns estavam jogando algum jogo, outros simplesmente utilizavam algum sistema de mensagem instantânea ou acessavam alguma informação diversa em algum blog ou tutorial de ensino.

Por que esse universo de liberdade computacional e inclusão digital na cultura daquela cidade ocorreu de forma tão natural?

Alguns fatores preponderantes podem ser enumerados, mas um deles, a liberdade, é o mais importante, ao passo que essa liberdade só pode ser alcançada quando o poder público a promove, ou seja, por meio do acesso ao computador pessoal de qualidade e atualizado em seus recursos tecnológicos, sem atravessadores, sem ONGs, sem computadores Frankenstein. Com isso, a inclusão digital se completa por si só, não são necessários cursos de digitação, cursos para ensinar a fuçar no Word, PowerPoint, Excel, ou “Cobol”, ou “Dbase”, as crianças aprendem por elas, curiosas e ávidas pela informação, como na pedagogia da autonomia.

A seqüência de tudo isso, é a INCLUSÃO DA INFORMAÇÃO DIGITAL, que transforma a cultura de um povo. Pois o que é a cultura de um coletivo, se não um padrão natural de comportamento seguido por ele? É então, quando a tecnologia pura, encontra a formação cultural do ser humano, incluindo pela informação a pessoa que antes, apenas dava voltas na praça sem o que discutir, permanecendo pequeno perante o mundo. Pois “Somos do tamanho daquilo que vemos e não do tamanho da nossa altura” (Fernando Pessoa).

O maior engano é propagar que a Internet sem fio, ou os notebooks do governo, promoveram a ampliação do universo daquelas crianças. O que o fez, foi a informação e a participação ativa na formação dessa informação, diferente dos meios dominantes de broadcast, porem sem as ferramentas apropriadas cedidas pelo Estado, único capaz de representar a coletividade, a informação não chegaria a esses cidadãos de forma livre.

E quando pensamos em uma cidade como Piraí, onde vivia o maior escravocrata e o rei do café Joaquim de Souza Breves, que dominou a cidade pelo chicote e detinha mais de dez mil vidas sobre seu julgo no século XIX. E saber que lá não só respira liberdade, mas é a liberdade que lá respira dos filhos dos escravos, que hoje se revolucionam pela informação, traz a nós uma sensação de saudação de uma dívida quase eterna com o povo de lá.

Por outro lado, em qualquer cidade comum, a industrialização vertiginosa e veloz, causaria um déficit social acentuado, primordialmente, causado pelo inchaço da cidade quando não preparada para este processo devido ao despreparo técnico dos originais daquele lugar. Fato que não ocorreu em Piraí. E por que motivo? Resposta simples, a população local foi incluída na industrialização. Foi preparada para o processo, desde as medidas modernizantes que tornaram Piraí uma das sete cidades mais inteligentes do mundo, à manutenção deste processo promovida pelo governo federal. Portanto, quem entra na cidade nota que nada se alterou em sua dinâmica urbana ou de ocupação dos espaços. Quem visita a cidade nota que continua sendo uma pequena cidade do interior do Vale do Paraíba, porém o pensamento a torna maior, até mesmo, que São Paulo.


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Desenhista, Arte -Finalista, Desenvolvedor de Software e Bacharel em Ciência da Computação e Sistemas de Informação.

3Comentários

  • Carlos Henrique Machado Freitas, 29 de abril de 2010 @ 0:20 Reply

    Do Blog do Zé Dirceu!

    Banda larga no Brasil é dez vezes mais cara
    Publicado em 27-Abr-2010
    Vejam vocês o que um estudo do IPEA apurou: o Brasil paga…
    Vejam vocês o que um estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), divulgado ontem, apurou: o Brasil paga dez vezes mais por acesso à conexão banda larga do que os países desenvolvidos. Em 2009, na renda mensal per capta brasileira, o custo dessa internet rápida era de 4,58% contra 0,5% desses países.

    Para o Instituto, três fatores explicam o alto preço do serviço no nosso país: o baixo nível de competição; a elevada carga tributária; e a baixa renda da população. Para alterar esse quadro, as sugestões do IPEA são: mudanças na Lei Geral de Telecomunicações (de 1997), que posiciona a internet como um serviço agregado à telefonia; redução das desigualdades regionais; diminuição de lacunas no mercado e no acesso; menor carga tributária; e cuidar, além da infraestrutura, também da qualidade da conexão.

    Não é preciso comentar aqui a importância deste estudo, frente ao Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), proposto pelo governo federal com o objetivo de massificar e universalizar o acesso à internet no país, oferecendo a banda larga a um preço médio de R$ 30,00 por mês.

    PNBL faz mercado se mexer e despertar para a concorrência

    Até fins de 2008, dos 58 milhões de domicílios no nosso país, 79%, ou seja, o equivalente a 46 milhões não tinham acesso à internet. Apenas 12 milhões (21%) tinham. Na área rural a realidade é ainda mais perversa: a conexão em banda larga chega a apenas 3,1%, ou seja, a 266 mil residências de um total de 8,6 milhões no campo.

    Esses números constituem, por si só, mais uma – e forte – razão para que o governo discuta, elabore e implante o PNBL e para uma aprofundada discussão das medidas sugeridas pelo IPEA, não só para fazer a internet rápida chegar a mais lares, como também para barateá-la.

    Além do excelente estudo do IPEA, o bom dessa história é que com ele e com a discussão do PNBL, o mercado teve uma extensão da realidade e finalmente se mexeu. E ao contrário do que diz o Estadão, já começou sim a regulação e a concorrência. Basta vermos matérias como essa que o jornal publica hoje com o título “Sky diz que leva banda larga a todo o País por um quarto da proposta da Oi”.

    Não deixem de ler o estudo do IPEA.

  • CULTURA E MERCADO :: revista eletrônica :: blog :: rede :: podcast … – digital, 29 de abril de 2010 @ 12:14 Reply

    […] sss://culturaemercado.com.br/ideias/pirai-e-exemplo-na-inclusao-da-informacao-digital/Mas a inclusão digital é bem maior que filantropia. E foi num dia desses, em que tive a […]

  • Web Secom » Inclusão digital da informação, 3 de maio de 2010 @ 11:45 Reply

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