Há umas semanas noticiamos aqui no Cultura e Mercado que três dos filmes premiados no Festival de Sundance foram produzidos por meio de financiamento coletivo. As plataformas de crowdfunding têm sido o caminho para projetos de audiovisual já no meio universitário, embora isso ainda não seja matéria abordada em aula.
“Nossos professores nos instruíram a buscar diferentes formas de financiar nosso projeto, entre elas o crowdfunding. No entanto, não há realmente um estudo deste coletivo, nem de como preparar um material de apresentação que engaje as pessoas de forma que elas contribuam financeiramente”, conta Luiz Guilherme Moura, diretor do curta Estação da Luz.
Projeto de estudantes de audiovisual do Centro Universitário Senac – São Paulo, Estação da Luz é um curta metragem de aventura de 10 minutos sobre a imaginação de um menino de 7 anos. Certo dia ele ouve falar sobre a Estação, e intrigado, acredita que se trata de uma estação do ano. A partir daí, o público entra no mundo imaginário de Jonas e nos deparamos com situações interessantes.
O projeto conseguiu mais que o dobro do valor solicitado e as gravações começaram nesta semana.
Para inscrever a ideia no Catarse, Moura tomou como exemplo outros alunos que financiaram seus projetos dessa forma e contou com o suporte de professores e da própria equipe do Catarse na orientação sobre o que geralmente funciona e o que não funciona para fazer um crowdfunding bem-sucedido.
Já para Camile Liguori, produtora do curta-metragem A Terra é Azul, a situação foi diferente. “Sinceramente, nunca houve incentivo ou discussões aprofundadas sobre o tema dentro do meu ambiente acadêmico. O assunto é tratado de maneira bem superficial, como uma nova alternativa para produções independentes, mas não como uma opção séria para projetos/empresas já consolidados”, afirma.
A Terra é Azul conta a história de um escritor recluso com o desafio de escrever um livro didático sobre a teoria do Big Rip e o fim do mundo. Ele se veste de astronauta durante seu processo criativo, o que cria uma zona de conforto e isolamento com o mundo à sua volta. Enquanto acompanhamos ele lutando contra seu bloqueio criativo, conhecemos as personagens que são suas poucas ligações com a realidade: sua vizinha, seu porteiro, seu editor, e Yuri, seu peixe-beta. Faltando 11 dias para o término do prazo para financiamento no Catarse, falta pouco para o projeto atingir sua meta (R$ 1.705).
Para Guilherme Nasser, diretor do curta, o fato de filmes financiados nesse formato estarem sendo mais reconhecidos – como em Sundance – auxilia na criação de mais projetos e na maior independência dos criadores. “O cinema independente cresce com ajuda de pessoas que diretamente aplicam seu dinheiro, o que mostra que antes mesmo do filme estar pronto já existe um público pré-disposto a assisti-lo. É uma espécie de independência não só de grandes produtoras, mas também de programas de incentivo cultural e de patrocínio privado. Uma outra forma de trabalhar”, acredita.
Além disso, segundo ele, significa que cada vez mais as pessoas têm o interesse de apoiar o que querem ver no cinema. “Elas compram a causa antes de comprar o filme, e de alguma forma sentem-se engajadas ajudando na produção”, diz Nasser.
Para Guilherme Moura, o coletivo está na essência do audiovisual. E o reconhecimento de obras que foram financiadas coletivamente mostra que se uma ideia é boa, não há barreiras para que ela saia do papel e se torne realidade. “Produções independentes sempre existiram no cinema, e o crowdfunding é mais uma plataforma para realizadores que querem criar conteúdo mas não têm dinheiro.”
Mas dá para produzir um longa-metragem dessa forma?
Moura acredita que sim e cita como exemplo projetos emplacados no Kickstarter – de onde saíram 17 dos indicados ao Sundance e os três financiados coletivamente e premiados -, que arrecadaram mais de três milhões de dólares. Porém, por ter um orçamento geralmente maior que o de um curta, requer uma estratégia de divulgação mais bem trabalhada.
“Na verdade, não importa o tamanho de seu projeto, é fundamental pensar em como ele vai tocar as pessoas e como isso vai convencê-las a tirar a carteira do bolso e contribuir com sua ideia. Para alcançar uma meta elevada, acredito que seja necessário fazer com que seu projeto ganhe uma certa visibilidade para além do grupo de amigos. Se você engajar as pessoas, oferecer um produto de qualidade e recompensas interessantes, você consegue o que precisa”, afirma.
Já Camile Liguori acha que é preciso ir além disso. “Financiar integralmente o valor de um longa seria bem complicado, mas não acho impossível. É preciso ter nomes de peso no elenco e já ter muitos contatos encaminhados com grandes empresas, patrocinadores e gente disposta a investir pesado. A divulgação também tem que ser mais forte, principalmente para a mídia. É um trabalho em dobro.”