Aconteceu nesta semana, em São Paulo, a Feira e Congresso ABTA 2013, principal encontro do setor de TV por assinatura e banda larga da América Latina, promovido pela Associação Brasileira de Televisão por Assinatura. Foram três dias de painéis e conferências com importantes nomes desse mercado, dos setores público e privado.

Foto: Luis Alberto Martinez RianchoA ministra da Cultura Marta Suplicy, que participou da conferência de abertura, afirmou que uma pesquisa conduzida pelo MinC aponta que, na população abarcada pelo Vale-Cultura, a maior parte já tem TV por assinatura. Ainda assim, a inclusão do serviço – que estava prevista no projeto original do Vale-Cultura, mas foi retirado por conta da grande reação contrária – pode ser reavaliada.

Marta também disse que conversa com Manoel Rangel, presidente da Ancine, sobre como dar musculatura à agência para acelerar o processo de análise de projetos que receberão recursos incentivados ou oriundos do Fundo Setorial do Audiovisual, uma cobrança das programadoras. Segundo a ministra, a Ancine deve estar adaptada à ampliação de escopo de atuação até o final deste ano, já que aumentar o volume de produção nacional é estratégico para a imagem que o Brasil tem no exterior.

Denise Gomes, sócia e produtora executiva da BossaNovaFilms, disse que a lei deu aos produtores mais acesso aos canais de TV paga. “Hoje recebo na produtora diretores dos canais, nacionais e internacionais, querendo conhecer a estrutura. Já é um ganho enorme trazido pela lei”, disse. Mas apontou que uma das maiores dificuldades dos produtores no momento é ter um fluxo de caixa. Segundo ela, os recursos demoram para chegar “por questões burocráticas dos canais internacionais ou da Ancine”.

Manoel Rangel apontou dois grandes desafios para a agência reguladora: 1) rever o paradigma estabelecido ao fomento e ao estímulo do audiovisual brasileiro fixado pela Lei do Audiovisual em 1993 – “O foco da agência tem que estar mais nas obras e menos nos papeis que levam à produção destas obras. O papel do estado deve ser mais leve e mais ágil. Devemos focar mais no resultado e menos nos processos”, disse Rangel; e 2) a construção do Prodav, o Programa de Desenvolvimento do Audiovisual, com o mapeamento das demandas e carências do setor – “O Prodav vai atuar fortemente para dotar o país de um sistema de investimento mais ágil, baseado na performance das produtoras ao desenvolver, produzir e lançar produtos”, disse.

Programação – Rangel afirmou que recebe muitas reclamações em relação à quantidade de reprises de conteúdo brasileiro nos canais. “Sabemos que é do interesse do espectador alguma dose de reprise. O setor precisa reorganizar suas práticas e se alinhar ao interesse do cidadão. Executivos das empacotadoras, no diálogo com as programadoras, estarão atentos à qualidade da programação”, afirmou.

Fernando Medin, principal executivo da Discovery Network no Brasil, disse que a repetição preocupa a todos, mas faz parte da dinâmica da TV paga. “Não acredito que nenhum canal grande esteja exagerando na repetição. Eles dependem da audiência”, completou.

Paulo Saad, VP de canais pagos da Band/Newco, lembrou que conteúdos só podem ser usados no cumprimento das cotas durante um ano. “Quando o programador compra um conteúdo, precisa usá-lo ao máximo durante o primeiro ano. Trata-se da otimização do custo por hora de conteúdo”, completou.

A operação de TV, no entanto, compartilha da preocupação de Rangel. “Se o produto começa a ter o carimbo de repetido, nosso cliente não vai ficar satisfeito. Isso nos preocupa realmente”, disse Antonio João Filho, diretor geral da Claro TV.

Segundo Medin, o peso da nova lei foi suportado integralmente por dois agentes econômicos: as operadoras, que aumentaram a oferta de canais sem aumentar preço; e as programadoras, que tiveram que estruturar novas áreas de programação e aumentar o volume de produção.

Produção – Roberto Martha, diretor sênior de produção da Viacom, destacou que tem se relacionado com mais produtoras do que costumava lidar antes da necessidade das cotas e diz que a lei impactou a operação da programadora, que precisou se organizar para o recebimento de projetos. “A capacidade de realização foi um desafio que a gente passou esse ano. A gente só tem mais se tiver capacitação e novos talentos que possam ser testados e comecem a dar resultados”, observou.

Mas o cenário para as programadoras independentes brasileiras não melhorou tanto com a lei, segundo Tereza Trautman, diretora da CinebrasilTV. Para a executiva, a Ancine não levou em conta o equilíbrio financeiro do mercado que ela regula, tanto do ponto de vista das produtoras quanto das programadoras. “Foi feito de forma predatória. Fez com  que os canais nacionais recebessem pouco pelo licenciamento e mal podem pagar pelo conteúdo”, afirmou, alegando que o faturamento anual médio de uma programadora independente de canal superbrasileiro equivale ao orçamento de um longa mediano.

Já Cícero Aragon, diretor da BoxBrazil, contou que a lei teve efeitos positivos sobre a programação, fazendo nascer o projeto de canais nacionais que ele tinha há bastante tempo. “Existe espaço para canais brasileiros além da cota, canais que se justifiquem pela sua própria qualidade. A operação hoje é deficitária, mas acreditamos na qualidade dos canais, acreditamos que podemos ser alavancadores da produção industrial brasileira”, disse.

Publicidade – A dificuldade de regionalização para atender o varejo foi apontada como um dos principais entraves ao aumento da publicidade na TV paga. Embora o meio esteja crescendo expressivamente nos últimos anos, a TV por assinatura não tem conseguido o mesmo ritmo de crescimento no volume de investimentos publicitários. A questão foi levantada por Orlando Marques, presidente da Associação Brasileira de Agências Publicitárias (Abap) e do grupo Publicis. “Hoje esse é o grande problema da TV paga. Para o varejo é fundamental que você possa ter a audiência o mais segmentada possível”, destacou.

Segundo Marques, outra dificuldade do meio é o Custo Por Mil (CPM), ainda muito mais caro, segundo ele, que o da TV aberta, e os contratos panregionais, fechados pelas programadoras internacionais em suas bases no exterior sem levar em conta as especificidades da audiência brasileira (e sem que a compra de mídia seja feita no país).

Fred Müller, diretor executivo comercial da Globosat, e Guilherme Valentini, VP de publicidade da Fox, concordaram que a TV paga não consegue atender a questão da regionalização necessária para o varejo como a TV aberta, mas afirmaram que já têm trabalhado com o varejo. “Esse público é o que consome mais marcas. Deveríamos ter um share maior do que o que temos hoje”, avaliaram, reconhecendo que o mercado publicitário tem uma demora em acompanhar o declínio de alguns meios e o crescimento de outros. Marques acredita que a crise no meio revista pode levar novos investimentos para a TV paga. “Eu acho que vai haver uma migração do segmentado de revista para o segmentado de televisão”, disse.

Distribuição – O Brasil fechou o primeiro semestre do ano com 16,96 milhões de domicílios com TV por assinatura, conforme balanço divulgado pela Anatel durante o evento. No mês de junho, o serviço adicionou 26,6 mil assinaturas líquidas. As contas da Anatel, contudo, ainda são imprecisas pois os números da Sky estão sendo ajustados e não estão sendo calculados os novos assinantes do SeAC, sobretudo da Net, que afirma ter mais de 100 mil assinantes nas cidades novas em que passou a operar este ano.

Em junho 2013, os serviços de TV por assinatura estavam presentes em 27,8% dos domicílios no país, de acordo com as estimativas da Anatel. Apesar do crescimento das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a região Sudeste ainda lidera esse indicador, com a presença desses serviços em 39,3% dos domicílios.

Porém, de acordo com estudo da argentina Business Bureau, existem 24 milhões de residências com acesso a TV paga no Brasil – 7 milhões a mais que as declaradas pelas empresas do setor e reportadas à Anatel. Essa diferença representa o número de residências que recebem sinal de maneira irregular – conexões piratas, clientes inadimplentes que continuam recebendo o serviço e outras irregularidades. O levantamento, encomendado pela Turner, Fox, e Chello Media, foi feito a partir de pesquisas de campo, por telefone e pessoalmente.

Pirataria – De acordo com Antonio Salles, diretor do Seta (Sindicato das Empresas de TV por Assinatura), as conexões piratas ocorrem principalmente de duas maneiras: a primeira é a instalação do serviço em residências sem assinatura por meio de cabos “puxados” de residências pagantes – o popular “gato”; a segunda é a distribuição de set-top-boxes genéricos, como “AZ Box”, “Azamerica” e “Lexusbox”, capazes de receber o sinal da operadora e decodifica-lo, oferecendo acesso a todos os canais e serviços.

Esse segundo modelo, disse Salles, é profissional, tem raízes internacionais e é motivo de grande preocupação para empresas do setor. “Eles são sofisticados, têm grande capacidade logística e de produção e são organizados. Os seus aparelhos parecem muito com os originais das operadoras”.

Segundo ele, a pirataria é incentivada por uma cultura de buscar a gratuidade nos serviços e por uma percepção de que os serviços das operadoras seriam muito caros ”Mas o que é caro? No valor da mensalidade está a remuneração de produtores, atores, operadoras e impostos. Isso envolve investimentos em aparelhos caros de produção, a construção de redes inteiras de transmissão de sinal e muitos outros investimentos”, questionou.

Ele disse que as operadoras agem principalmente de duas maneiras para combater o avanço da pirataria: se organizando em grupos representativos para conscientizar autoridades e com tecnologia, através da criação e constante renovação de códigos de criptografia para o sinal. Mas o apoio das autoridades ainda é pouco. “Avançamos no campo jurídico, com pareceres muito claros que classificam a pirataria como crime, mas ainda há muito pouca ação efetiva”, disse.

Em janeiro de 2013, foi criada a Alianza Contra la Piratería de Televisión Paga, grupo formado por representantes do setor de televisão por assinatura da América Latina para combater a pirataria na região. De acordo com Marta Uchoa, diretora do grupo, os aparelhos piratas não são fabricados em nenhum país da região. “Cerca de 90% dos aparelhos ilegais vem de Coreia e China, e são transportados por ar, mar e terra. É um problema de toda a região”, disse ela.

O grupo busca conscientizar autoridades locais. Desde sua criação, já teve participação na abertura de 18 investigações e nove ações que paralisaram a oferta de serviços clandestinos em toda a região. O grupo também comemorou a primeira destruição em massa de decodificadores piratas realizada pelo governo do Paraguai, a primeira condenação em um caso de pirataria de sinal de TV paga na Colômbia, que resultou em pena de 40 meses, e a regularização das zonas francas do Uruguai.

Contudo, combater a pirataria nas ruas, destruindo os set-top-boxes piratas, e cortando o sinal de centrais piratas, pode não resolver a solução. A opinião é de Cristofaro Mune, analista sênior de segurança da Riscure Security Lab, empresa especializada em testar a segurança de equipamentos eletrônicos. De acordo com Cristofaro, que também participou do painel, o pirata consegue acesso às chaves dos códigos de criptografia em set-top-boxes legalizados da própria operadora. Por isso, as operadoras devem promover testes constantes e transformar a segurança em um dos principais critérios para a seleção de equipamentos.

*Com informações do site da Tela Viva


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