Foto: Gil Lopes
Depois do assessor do presidente Marco Aurélio Garcia provocar a nação comparando a programação da TV a cabo à Quarta Frota, ou seja, que a hegemonia cultural americana corresponderia no âmbito bélico a presença da sua divisão naval no Atlântico Sul, a resposta veio rápida e contundente.

A Folha de São Paulo tomou a frente e disparou matérias, opiniões, declarações condenando a diatribe do governante: “Eles realizam, de forma indolor, um processo de dominação muito eficiente. Despejam todo esse esterco cultural (…) A emergência desse lixo cultural nos deixou numa situação grave.”

Bruno Barreto achou o discurso obsoleto. Domingos de Oliveira que em recente artigo no O Globo conclamava por um Ministério Da Arte e dizia “que qualquer criança, qualquer homem de bem, qualquer pessoa séria, sabe imediatamente distinguir o que é arte e o que não é, o que é o Bem e o Mal, o que é a Ordem ou Caos, o que é motivo de viver ou morrer, o que faz crescer ou diminuir”, se manifestou dizendo que o seriado House é muito melhor do que qualquer série da Globo. Daniel Filho patrulhou a declaração por conta do apoio do assessor aos governos de Fidel e Chaves. Já Roberto D’Avila apontou para a falta de regulação da TV aberta  onde apenas 12% dos filmes são nacionais e na rubrica séries e miniséries 71%  do tempo é ocupado por produtos americanos.

Um estupendo anúncio de página inteira do Bradesco Seguros para o musical americano Cats, apoiado pela Lei de Incentivo a Cultura do Ministério da Cultura, divide a página seguinte com imagens do Carnaval. Na sequência a reação continuou. Bruno Barreto novamente vaticinou: “cabe aos produtores criar produtos que sejam interessantes para as emissoras, qualquer imposição pode ser um tiro no pé”. Mas foi do editor de opinião da Folha, Marcos Augusto Gonçalves,  a pérola da manchete “Esterco, Go home!” onde argumenta que a cultura norte americana é decorrência do processo de interação e choques das culturas européia e africana. Invoca o jazz como fonte da bossa nova e relembra Oswald de Andrade e nossa capacidade antropofágica. Mistura na confusão João e Tom como influenciados pelos jazz na suas criações. Termina ideológico falando também em Chaves e na censura do governo chinês a internet e minimiza a participação da TV a cabo que atinge apenas 7,5 milhões de brasileiros com poder aquisitivo para pagar seu aluguel.

Antes do fim, mais uma página inteira com artigo de opinião agora assinado especialmente pelo cineasta e diretor de tv Luiz Fernando Carvalho que argumenta com o assiste quem quer e invoca o livre arbítrio: “proibir não”, seria contra os ideais democráticos tentar restringir o livre fluxo de informações. Relembra Cuba, Venezuela e China, fala em contra mão da cultura , em cerceamento de exibição de conteúdos na era da transmidia.

Nosso declarante deu um contorno de guerra no plano cultural. Tratou da guerra cultural que se trava hoje no mundo inteiro produzida pela globalização.

Na semana seguinte O Estado de São Paulo abriu seu Caderno 2 com a manchete: A Broadway é aqui.
Celebra São Paulo que se consolida como capital do canto e dança com a estréia de seis musicais importados. Termina dizendo que em São Paulo, o canto da Broadway agora parece não ter mais fim.

No Rio de Janeiro foi Madonna que municiou a mídia em pleno Carnaval. Dizem que a visibilidade da cidade foi projetada internacionalmente com a presença da pop star americana, trazendo benefícios para o Carnaval carioca. Paris Hilton, Beyonce e Alicia Keys também vieram.

Que país é esse?


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Produtor cultural, economista e diretor da Showbrás Produções Artísticas.

4Comentários

  • gil lopes, 3 de março de 2010 @ 16:18 Reply

    Ontem a propósito de anunciar a estréia do musical americano Cats no Jornal da Globo, o texto também foi: a Broadway é aqui.

  • Tatiana Samper, 4 de março de 2010 @ 18:04 Reply

    Cultura americana no meio da nossa cultura é ato consumado, não em processo, qual o estranhamento? O que me preocupa hj em dia não é o conteudo da tv a cabo, mas a rapidez com a qual as informações são transmitidas e como estamos mais perto das pessoas do que em qqer outro tempo, sem estarmos de fato perto, tanto no sentido físico, como afetivo. O que me preocupa é a maneira como as relações humanas mudam com o avanço tecnológico na informática, sem mudar qualitativamente o que deveria ser mudado.

    Bah, que papo batido. Papo chato de gnt da mídia que cria caso com a própria mídia e sua falta de limites, mas que tb não deseja ser limitada. Democracia não é igual a liberdade de imprensa. Pq, desde a ditadura, esse povo da mídia insiste em tratar a censura como o próprio fim da Democracia? Democracia não é igual liberdade de imprensa. Democracia não é igual liberdade de imprensa. Liberdade artística, sim, é importante e vital. Quisera eu, dentro da educação, ter a mesma liberdade de idéia, criação e expressão que a mídia tem. Mas na educação, que deveria ser uma das bases de formação do individuo, e não a midia, vc sofre todo tipo de cerseamento, censura e controle de todos os lados, lê-se governo (secretarias, ministerios) e família e claro, mesmo sendo um estado laico, da igreja.

  • gil lopes, 5 de março de 2010 @ 2:27 Reply

    SALVE Tatiana, é o samba do crioulo doido…ato consumado, e daí? temos que saber do que somos capazes, como será nosso jardim..ou então podemos passar o cimento…

  • gil lopes, 7 de março de 2010 @ 14:53 Reply

    e complementando a informação, a foto do artigo é minha mesmo, de um paredão em Nova York. No artigo anterior trata-se de uma pintura de Gonçalo Ivo. Créditos aos artistas! eheeh…

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