Foto: Zyberchema
Confira as contribuições do Grupo de Trabalho do Patrimônio Cultura do Ministério Público Federal ao projeto de lei que derruba a Lei Rouanet e cria o Profic. O relatório aponta problemas na manipulação de dados para realizar a propaganda junto à opinião pública, diz que o MinC não tem dados para medir a eficácia do Pronac e demonstra que o próprio MinC não tem solução alguma para a redistribuição regional de recursos.

CONTRIBUIÇÃO DO GT – PATRIMÔNIO CULTURAL AO PROJETO DE LEI EM CONSULTA PÚBLICA SOBRE INCENTIVO À CULTURA

O Ministério da Cultura lançou consulta pública no processo de elaboração de uma nova lei, cuja finalidade será a de substituir a Lei Rouanet. Com a intenção de contribuir para o debate público em curso, o Grupo de Trabalho Patrimônio Cultural, estabelecido na 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, apresenta as considerações que seguem.

1 – É, sem dúvida, necessário um trabalho de revisão da lei que instituiu o PRONAC, mormente sobre seus aspectos relacionados ao mecenato. Não se pode negar que tal lei, no entanto, ainda que imperfeita, contribuiu sobremaneira nos últimos anos para uma transformação no cenário do investimento da cultura nacional. De um quadro de inexpressivos investimentos, passou-se, sobretudo em razão da previsão da renúncia fiscal, a um patamar em que o investimento privado supera o próprio orçamento do Ministério da Cultura.

2 – Atualmente, sob o argumento da democratização do acesso à cultura, e de sua melhor distribuição regional, bem como da necessidade de aumentar a participação estatal nos rumos das políticas culturais, as quais em verdade são alavancadas pelos investimentos econômicos que lhes são direcionados, o Ministério da Cultura propôs uma minuta de projeto de lei que, após analisada pela Casa Civil da Presidência da República, pode vir a ser encaminhada ao
Congresso Nacional para aprovação de uma nova lei.

3 – Embora de uma forma geral, as mazelas apontadas pelo Ministério da Cultura no diagnóstico realizado sobre o setor cultural possam ser verdadeiras, o fato é que elas possuem sustentáculo em frágeis interpretações de dados e indicadores. Não se desconhece que a análise do MinC tem suporte em sua base de dados e em fontes outras como as análises do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entretanto, os esforços mais recentemente realizados por estes órgãos na tentativa de possibilitar uma leitura mais profunda do setor cultural estão longe de possibilitar um caminho seguro que possa evidenciar de forma categórica as reais fragilidades do sistema atual e menos ainda as chances de sucesso da novel proposta do Ministério da Cultura. Não dispõe o MinC, ou pelo menos não apresentou à sociedade, dados sobre os investimentos culturais realizados pelo setor privado, sem recurso aos incentivos da Lei Rouanet. Esse dado “invisível” sobre os aportes voluntários e praticados sem o auxílio de recursos públicos seria fundamental para desenvolver uma leitura mais completa do funcionamento do setor cultural, em especial da economia cultural e para a avaliação dos impactos da supressão da Lei Rouanet. Seria necessário que o Ministério da Cultura, na reformulação de uma política como essa, apresentasse solidamente os níveis de acomodação e dependência das leis de incentivo à cultura no seu viés mecenato.

4 -A construção de um conjunto de indicadores que permita uma avaliação precisa da área cultural é indispensável também para permitir uma participação qualificada da sociedade na consulta pública que está em curso. Contudo, o
Ministério da Cultura sequer disponibiliza em seu site sua base de dados. Observe-se que uma mesma base de dados pode permitir diferentes interpretações a partir da maior ou menor abrangência dos dados levados em consideração para a realização da análise. Fica, pois, prejudicada, a transparência do processo e por conseqüência, afetado o caráter democrático da consulta, já que se torna quase impossível ao cidadão exercer uma crítica qualificada ao discurso apresentado pelo Minc, quando não se tem acessos às mesmas fontes de dados que foram utilizadas para a construção desse discurso. Juridicamente, há, inclusive, vício de legalidade que pode levar à invalidade da consulta pública.

5 – Com efeito, um exemplo do que se afirma é a fragilidade dos dados sob os quais se funda o tão propalado argumento da desigualdade regional nos investimentos culturais realizados no Brasil. Se por um lado é intuitiva que o maior aporte dos recursos esteja sendo destinado à Região Sudeste, por outro é categórica a necessidade de que o MinC, para realizar suas avaliações, se atenha a dados confiáveis, o que não ocorre no caso. A afirmação não é leviana, pois é de fácil comprovação o fato de que o Minc, após ter recebido recomendação do Tribunal de Contas da União, no Parecer Prévio sobre as Contas do Governo da República, no exercício de 2007, para que adotasse providências no sentido de “reduzir as desigualdades regionais mediante a aplicação do montante de recursos captados por meio da renúncia fiscal (Mecenato) de forma desconcentrada e proporcional à população”, respondeu à Corte de Contas, encaminhando Nota Técnica Conjunta SAV/SEFIC, afirmando que “o MinC detectou que o baixo investimento nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste é também influenciado pela pouca demanda originária dessas regiões, cujo acesso à informação sobre procedimentos e possibilidades de apoio e às empresas potencialmente patrocinadoras ainda é deficitário.” Ressalte-se que com tal explicação, o próprio MinC justifica a aplicação de recursos do Fundo Nacional de Cultura de forma desigual entre as regiões, em contrariedade ao previsto no art. 4°, I, da Lei 8.313/91. Mas o argumento mais grave para as nossas constatações foi a de que o MinC admitiu que “a informação sobre a concentração regional de recursos captados verificada é influenciada pelo fato do sistema gerencial utilizado pelo MinC para registro dos projetos e seus trâmites não permitir o lançamento de informações acerca das localidades onde os projetos acontecem. Assim, os dados de captação estão orientados pelo domicílio do proponente e não do projeto. Isto faz com que muitas ações de abrangência nacional já existentes sejam contabilizadas como uma única proposta geralmente apresentada por instituição localizada na Região Sudeste.” Pois bem, sem que tal distorção tenha sido corrigida, o MinC se apóia nesses elementos já tidos por si mesmo como imperfeitos para realizar a sua definitiva leitura acerca da concentração regional dos recursos captados.

6 – De outra parte, o projeto apresentado para substituir a Lei Rouanet não dispõe de um só artigo que garanta a correção de rumos da propalada concentração regional dos recursos. Embora o discurso do Ministério da Cultura tenha acentuado a todo tempo tal distorção como uma mazela a ser combatida, em verdade, apenas previsões principiológicas, como as já contidas na Lei Rouanet, fazem vaga remissão à necessidade de apoiar a expressão cultural das diversas regiões do país. Ou seja, o projeto de nova lei não possui um só dispositivo que garanta a mudança do status quo, o que demonstra grande disparidade entre a ação e o discurso.

7 – O projeto padece de um grave déficit: possui uma baixíssima densidade normativa, ou seja, depende excessivamente de regulamentação posterior. São inúmeros os dispositivos que remetem à necessidade de esclarecimento por meio de decreto regulamentador ou, o que é pior, de decisões do CNIC – Comissão Nacional de Incentivo à Cultura. A mencionada comissão, aliás, transformar-se-á, pelas atribuições que recebe do projeto, em verdadeiro órgão legislador sobre a cultura nacional e tampouco tem sua composição e funcionamento minimamente previstos em lei. Diante de tal quadro é de se perguntar de que vale um processo democrático de consulta para uma lei que pouco define o setor cultural e que entrega a sua regulamentação à decisão posterior e solitária do Ministério da Cultura durante a elaboração de um decreto ou a uma Comissão Nacional, a CNIC, que igualmente será criada conforme decisão do Ministério da Cultura. Parece intuitivo que o caráter democrático que se tenta imprimir à consulta vale muito pouco, pois o projeto de lei nada define sobre os pontos nevrálgicos que envolvem a matéria por ele tratado, e a fase que realmente interessará, e que será a regulamentação da lei, não conta com processo democrático de consulta pública. Um ponto extremamente sensível, que é o estabelecimento dos critérios que nortearão a pontuação dos projetos e definirão o grau de incentivo a ser concedido, deveria estar estabelecido em lei e não pela CNIC. Segundo propala o Ministério da Cultura durante a divulgação do projeto, “os critérios para cada cota serão definidos, anualmente, pela CNIC. Isso vai permitir a criação de critérios claros e públicos, definidos em parceria com os próprios setores. E serão analisados por um corpo de pareceristas externos ao ministério.” Se todos esses vetores já estão definidos, por que não estão previstos no projeto de lei? Outro exemplo é o fato de que o único instrumento verdadeiramente novo criado pelo novo projeto que institui o PROFIC, o Vale Cultura, não conta com qualquer diretriz estabelecida pelo que será a futura lei. Nenhum artigo foi a ele destinado, contudo o Ministério da Cultura divulga publicamente que “a proposta do Ministério para o Vale Cultura é de um valor mensal de R$ 50. O governo dará renúncia fiscal para 30% de seu valor, o empregador pagará 50% do valor e o trabalhador, 20%. O Vale Cultura, que será criado por lei específica, poderá ser utilizado para acesso a artes visuais; artes cênicas; audiovisual; humanidades; música; e patrimônio cultural.” Pergunta-se, por que a lei não dispõe sobre isso se o Ministério já construiu uma proposta a respeito?

8 – O projeto apresentado precisa dispor sobre as faixas de isenção do setor audiovisual, sob pena de serem geradas distorções no tratamento da área quando comparada às demais áreas culturais tratadas pela lei que substituirá a Lei Rouanet. É preciso que se informe o que fica mantido na lei do audiovisual (lei 11.437/2006) e que pontos da nova lei a derrogam ou sobre ela se aplicam, ou ainda que se justifique o tratamento desigual de setores igualmente
tutelados pela Constituição Federal.

9 -São previstas faixas de incentivo muito inferiores às vigentes, além da vedação de lançamento das despesas, com grave risco de diminuição dos recursos destinados à Cultura. Há que se considerar, ademais, eventual impacto econômico negativo, face à desigualdade em relação aos incentivos previstos pela Lei de Incentivo ao Esporte e pelo Fundo Nacional da Criança e do Adolescente. Apesar de previstos em diferentes tetos do Imposto de Renda, há que se considerar eventual limitação do setor privado em efetuar simultaneamente todas as atividades incentivadas pelas diversas legislações.

10 -A destinação integral dos recursos provenientes da arrecadação da Loteria Federal da Cultura ao Fundo Setorial das Artes, restrição instituída pelo artigo 9º, §2º do projeto, diferencia tal setor das demais formas de expressão cultural, quando tais áreas estão no mesmo patamar constitucional de proteção.

11 -O artigo 15, §2º do projeto é muito vago. Deveria a própria lei e não uma comissão estabelecer critérios para o investimento de recursos do Fundo Nacional de Cultura. Igualmente, é de pouca clareza o que o artigo quer dizer
com “participação da unidade da federação na distribuição total de recursos federais para a cultura”. Infelizmente, o projeto não cria explicitamente mecanismos ao Mecenato que incentivem a promoção do equilíbrio territorial
do investimento.

12 -O artigo 32 emprega a palavra acessibilidade sem que se possa compreender do que se trata. É impossível saber o que significa “acessibilidade do público”, já que o termo poderia ser interpretado como condições de acesso físico a pessoas com deficiência, à democratização do acesso por meio dos preços praticados ou ao potencial de adesão do público aos bens e atividades culturais a serem oferecidos. Cumpre ressaltar que uma das críticas à lei vigente é justamente a possibilidade de incentivo público a atividades que não dependem de tal incentivo para sua realização, ou que, pelo preço praticado, restringem demasiadamente seu público. Não há, entretanto, mecanismos legais para a correção destes vícios no projeto.

13 -O artigo 43 do projeto é claramente inconstitucional, além de empregar técnica já ultrapassada na construção de tipos penais. O tipo penal ali previsto é excessivamente aberto e não descreve adequadamente a conduta tida por
ilícita, inviabilizando a ampla defesa. Igualmente a pena prevista para o crime ali previsto é bem menor do que a pena do estelionato, delito ao qual é correlato. A pena é tão baixa que levará facilmente à prescrição, sobretudo considerando-se o tempo que o Ministério leva para detectar irregularidades, já que não fiscaliza a execução dos projetos e analisa as prestações de contas muito tempo depois de suas apresentações. Vale lembrar que a prescrição
penal começa a correr da data do fato ilícito e não da data de sua descoberta. E é fato público a morosidade do MinC na análise das prestações de conta,o que, inclusive, já levou o TCU, por ocasião da apresentação do seu relatório sobre as contas do governo no exercício de 2006, a recomendar que o Ministério da Cultura, tendo em vista estoque de prestações de conta pendentes de análise no órgão, que passasse a realizá-las de forma tempestiva.

14 -O projeto que revogará a Lei Rouanet nada observa sobre a impossibilidade de análise do mérito cultural. Ao contrário, prevê a análise do mérito para aplicação de faixa de isenção de 100%, o que aponta para a abertura da perigosa prática do dirigismo cultural, contrário ao Estado Democrático de Direito.

15 -O projeto não traz definições dos termos legais que utiliza, como patrocinador, co-patrocinador entre vários outros.

16 -O inciso VI do artigo 54 do projeto revoga expressamente o artigo 9º da Lei 11.483/2007, ou seja, a atribuição do IPHAN de receber e administrar e zelar pela guarda e manutenção dos bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico, e cultural oriundos da RFSSA, sem atribuir tais deveres a outro órgão com competência para a tutela de bens culturais, em detrimento da efetiva preservação de tais bens.

17 -Apesar de prevista a revogação expressa da Lei nº 8.313/1991, não há qualquer regra transitória que permita o incentivo cultural enquanto não houver novo regulamento, nova constituição da CNIC e a criação de critérios de pontuação dos projetos, com evidente lesão à coletividade e ao setor cultural. Segundo, é necessária a expressa menção à inaplicabilidade da limitação prevista no art. 93 da Lei n. 11.768/08, sob pena de o mecenato estar limitado ao prazo máximo de cinco anos. Há que se considerar, ademais, a dificuldade do setor privado em absorver o novo marco legislativo, com evidente diminuição de projetos e recursos durante o processo de adaptação. Por fim, há que se ressaltar que falhas da lei vigente poderiam ser supridas por sua alteração.

Em conclusão, embora seja evidente a necessidade de aprimoramento da Lei Rouanet, o projeto apresentado pelo MinC contém vícios de inconstitucionalidade, de legalidade, além de graves déficits acerca da matéria que se propõe a normatizar. Apóia-se a revisão da Lei Rouanet, mas tal revisão não precisa ser realizada por meio de sua total supressão, parecendo ser suficiente a revisão legislativa de determinados pontos da lei. Caso o MinC veja como imprescindível a total revogação da Lei Rouanet que tal revogação ocorra em prol da criação de uma lei de melhor qualidade, o que o projeto proposto não consegue alcançar.


Pesquisador cultural e empreendedor criativo. Criador do Cultura e Mercado e fundador do Cemec, é presidente do Instituto Pensarte. Autor dos livros O Poder da Cultura (Peirópolis, 2009) e Mercado Cultural (Escrituras, 2001), entre outros: www.brant.com.br

9Comentários

  • Leonardo Brant, 26 de maio de 2009 @ 18:24 Reply

    Vale uma observação. Temos alertado a sociedade para os riscos do novo projeto apresentado para o MinC e sua faceta anti-democrática. Em função disso, sofremos vigilia e massacre ideológico. Fomos chamados de defensores da elite e do dito “mercadão” do eixo sul-sudeste. Não conformados com esse jogo sujo, partimos pra cima. Não recuamos. Estamos muito cientes do que estamos defendendo, sabemos o que está em jogo. Com isso, colocamos toda a nossa reputação em defesa do interesse do setor cultural, que sofre com a incompetência e com uma política populista autocrática do Ministério da Cultura. Quando a grande mídia começa a entender a profundidade do que estamos denunciando, dizem que estamos compactuados com ela, no centro do poder midiático global. Quem dera!

    Mas a publicação deste relatório do Ministério Público intriga. Com uma audiência digna dos artigos e provocações mais comentados da história do Cultura e Mercado, ela recebe o silêncio, anestésico e estapafúrdico de quem defende a indecência do MinC.

    Sinto com esse relatório o conforto do dever cumprido. As instituições democráticas enfim tomarão conta dos ditadores de plantão. Resta saber o tamanho do forrobodó causado por esse discurso oportunista, desconectado com a complexa realidade da atividade cultural no Brasil.

    A máscara caiu. O item 5 do relatório revela-nos de forma inconteste a verdadeira face deste frágil MinC, que sofre nas mãos de gente despreparada.

  • Carlos Henrique Machado, 27 de maio de 2009 @ 12:25 Reply

    Leonardo
    O que não se pode admitir é falar em democracia sem que a sociedade possa exercer o livre arbítrio. Tem que passar pelo crivo do grande capital, ficar de joelhos no milho e fazer penitência ao banqueiro da hora, com os recursos extraídos dos impostos pagos pela sociedade. Se o Minc não tem legitimidade para isso, não tem para nada, sequer servir de intermediário da sociedade com o empresariado. Fecha-se o Minc e vamos a saída à bangu. O que não podemos é dizer que o setor privado garante a democracia. Você pode ter toda a razão em dizer que a sociedade está cometendo um grande erro, mas temos que admitir que a democracia nao se constrói com acertos e erros, constrói-se com exercício de cidadania, através de debates em busca de novos caminhos, longe, bem longe do setor privado que é patrão por excelência e donos do Brasil. Aliás, mostraram bem quando querem ser gentís com quem lhes serve especiarias em bandeja. O Globo de domingo mostrou que, via Lei Rouanet, o modelo Jabor de chalaça do PSDB funciona bem, pois mesmo estando 23 anos longe da produção cinematográfica, ao apagar das luzes levantou os míseros trocadinhos de 10milhos pra cima com o Santo Aike Batista com a sua babação de ovo típica do principado FHC.

    A verdade, Leonardo, é que estamos vivendo um momento de tanta interferência desse setor privatizado com suas teias neoliberais, que vivemos um marco histórico da mediocridade institucional da cultura brasileira. democracia é o povo quem faz e não as empresas. Privatização, terceirização e culturobrax (Lei Rouanet)são estorvos neocolonizadores.

  • Leonardo Brant, 27 de maio de 2009 @ 14:18 Reply

    Concordo, mais uma vez, e plenamente, com as suas palavras. O problema todo está no capitalismo e sua lógica de concentração e mais valia. Mas não estou vendo nenhuma proposta de combate efetivo ao capitalismo. Pelo contrário. Os bancos vão bem, obrigado. As montadoras idem. O que vejo é um discurso fácil, populista, sem qualquer tradução em proposta efetiva, concreta. Vamos jogar o investimento “privado” no ralo e não colocar um mísero centavo nos fundos. Aliás, pra que tanto fundo se não sabemos a origem do dinheiro. Sem contar que esses fundos são equivocados. Sou contra um fundo setorial para as artes. Arte não é setor. É algo fundamental para a formação do indivíduo e da sociedade. Algo que sustenta e dá perpectiva para a sociedade. Como pode abordada apenas por uma perspectiva setorial, portanto econômica?

    Ou seja, para fazer isso que vc propõe precisaremos de um projeto de verdade, não aquela piada. Retrocedemos, no mínimo, duas décadas com o Profic, o que é uma pena.

    Concordo que o mercado não garante a democracia. Mas contra governos autoritários em ambientes capitalistas, o mercado pode servir como força de equilíbrio. E se o Estado é fraco, devemos fortalecê-lo com líderes e equipe técnica decente. E estamos longe disso.

    Por último, só tenho o que comemorar a volta do Jabor, um dos nossos maiores cineastas. Aliás, essa bem que poderia ser uma forma de ele abandonar seus comentários infames e fazer o que realmente entende. E se tem um artista conseguindo viabilizar sua obra, mesmo que eu não concorde com a sua orientação ideológica, ou não me agrade a sua linguagem, vou mais é comemorar.

    Abs, LB

  • Carlos Henrique Machado, 27 de maio de 2009 @ 20:15 Reply

    Imagino Leonardo que não seja somente você a comemorar essa faceta de Jabor. Milhares de pequenos gestores, artistas, produtores que acritaram nessa mentirada toda que envolve a Lei Rouanet, devem estar felizes da vida com a vitória estrondosa do nosso Fellini. Isso sim é um gol de placa da democracia cultural, voto do povo não vale nada, é ditadura. Democracia é a captação dos 10milhõezinhos de Jabor. Aliás, o filme tem um nome bem sugestivo.

  • Leonardo Brant, 28 de maio de 2009 @ 14:39 Reply

    Carlos, não conheço os detalhes da captação do dinheiro do Jabor, que está longe de ser um Fellini. Acabo de consultar o sistema da Ancine. O filme está captando desde 2007 e tem “apenas” R$ 4.034.935,74 captados, bem longe dos R$ 10 milhões citados.

    A mentirada continua solta por aí. A turnê do ministro ainda não terminou e quanto mais longe ele vai maior é a história de pescador. E a crise continua, menos pro Jabor, é claro…

  • Carlos Henrique Machado, 28 de maio de 2009 @ 18:52 Reply

    Oi Leonardo
    Citei o episódio do Jabor que vai justamente na contramão de um mínimo de vida democrática possível no planeta Rouanet. Não quis fulanizar, só me baseei numa matéria em que ele é o entrevistado. Acho que essa matéria foi um contraataque fulminante no retórico discurso de que a lei é boa e que precisa de uns pequenos ajustes, como defendem alguns, sem sequer mencionar que ajustes são esses. Acho, Leonardo, exatamente o mesmo que você, que a cultura é o fundamento primeiro de uma sociedade e, por isso mesmo creio que é um suicídio entregar nas mãos da total irresponsabilidade com este fundamento, ou seja, do empresariado brasileiro, pior, com aquele amargo gosto que eles estão sempre com aquela famosa lei do Gerson sempre a favor da horta dos Aikes e dos feudos da Febraban e FIESP.

  • Leonardo Brant, 29 de maio de 2009 @ 0:01 Reply

    Carlos, e o artista? Onde fica o artista nisso tudo? A Lei Rouanet não é o que sonhamos na vida, mas é o que temos. É uma irresponsabilidade abrir mão do que temos em troca de um discurso demogógico e sem qualquer verossimilhança. Para o artista é um desafio. E a Lei não funciona sem o artista, sem o produtor, sem a sociedade. Não é a empresa que manda na cultura. É o artista. E com fundos vazios, sem tostão, mandará menos ainda. Minha luta é por mais dinheiro, nunca por tirar da cultura o que funciona (mesmo que – supostamente – mal e porcamente). Então vou continuar do lado de cá da briga, ainda mais pelo prazer de discutir com artistas e pensadores do seu gabarito. Abs, LB

  • tito, 29 de maio de 2009 @ 5:31 Reply

    Oi Léo, engraçado você perguntar pro Carlos onde fica o Artista, pois ele e um, dentre tantos que lutam em caminhos diferentes da Lei Rouanet, infelizmente no caminho dos “com fundos vazios”. É fato que a lei promove alguns artistas assim como tantos outros estão muito longe dela.

    Acho que a lei não caminha sem o artista e produtor como vc disse, mas ela tem caminhado com muitos poucos artistas e produtores não acha?

    Concordo plenamente que o Minc falhou em apresentar uma proposta que melhore a lei, mas convenhamos, existe uma “turma do deixa disso” consideravel para mantê-la ao invés de melhorá-la. Chamar o Juca de ditador? e essa turma aí? qué o quê? Portanto, onde está o artista! está no meio disso tudo, pagando a conta junto com a sociedade.

    abs

  • Carlos henrique Machado, 29 de maio de 2009 @ 18:47 Reply

    Leonardo
    É justamente a questão do artista que foi jogada nessa tinturaria, onde as cores desapareceram, tudo ficou preto. A cultura, renitente. O jogo da Lei Rouanet não está nas quatro linhas, por isso a Rouanet não tem torcida. Tudo foi e é feito no tapetão. Os artistas com os quais convivo, de várias áreas, carregam bastante daquele samba que o Zeca gravou, fica mais ou menos assim, “Você sabe o que é Lei Rouanet? Nunca vi, nem comi, eu só ouço falar.”

    A rapaziada, de maneira geral, ou aceita o peso da frustração ou corre atrás do famoso “eutrocinador”, ou seja, bate o córner e corre pra cabecear e, por incrível que pareça, como só depende da nossa paixão, conseguimos até fazer uns golzinhos.

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