O diretor da Organização dos Estados Ibero-americanos, Daniel González, atrela a capacidade de implementar políticas culturais à própria capacidade de fazer política e dispara: “o grande desafio é a desigualdade brasileira, que tem uma base cultural”

O argentino Daniel González está à frente do escritório brasileiro da OEI e tem realizado esforços para o avanço das políticas nas áreas de cultura e educação. Recentemente lançou um programa de livro e leitura para o Brasil e investe na formação de uma rede de museus e de formadores de gestão cultural. De seu escritório em Brasília concedeu a seguinte entrevista:

Leonardo BrantQual a sua visão quanto ao momento histórico-social que estamos vivendo em termos de políticas culturais. E em que direção aponta a gestão do Gilberto Gil?

Daniel González – Esse período aponta para a consolidação de uma estrutura governamental para a cultura. Neste momento, nessa estrutura interna do ministério, que é relativamente recente, e no processo de preparar e implementar que está em andamento há pouco tempo, começaram a aparecer questões interessantes. Além da situação da reforma do prédio, foi um pouco uma figura e imagem do que acontece nas políticas. Primeiro uma bagunça, depois surgem alguns resultados. Há o aparecimento do ministério, portador de alguns recursos pouco valorizados pela cultura governamental, um ministério que não é poderoso, mas que tem uma estrutura burocrática mínima. Minha percepção como observador externo é que uma política pública que tenha relação com a questão social possa articular uma política federal com a dos outros governos do território, dos estados e dos municípios. Existe uma constituição que delega ao governo federal a proposta de políticas amplas, cujo trabalho é dos governos territoriais. Relativamente às políticas sociais, esse é um problema enfrentado, e não está fora a questão da cultura. Esse é o grande desafio das políticas culturais, e a gestão cultural do governo federal tem também que trabalhar com isso no próximo período. Buscar mais articulação. Há muitas questões, não só no Brasil, mas em legislações dos países de primeiro mundo uma parte da realidade está em aplicar. O candidato deve ter a legislação, um marco normativo. Mas no Brasil temos essa situação, e a do Brasil é particular em que o governo tem que encontrar ainda um lugar para encaixar bem. Porque as possibilidades de trabalho ligadas à sociedade real, concreta, de outro nível. Essa é uma questão importante para a área da cultura, que exista mais articulação com todos os governos e todos os municípios. Nesse período, por exemplo, os pontos de cultura representam uma questão muito importante para se pensar nessa linha, uma experiência que cria uma nova regra de gestão das culturas no território, uma consolidação e continuidade de políticas necessárias para melhorar. A experiência dos pontos de cultura nesse sentido é muito interessante. O grande problema é de como passar das grandes idéias para realidades que são muito contrastantes, especialmente no Brasil e na América latina, aqui sendo isso especialmente forte, a desigualdade social brasileira. Aqui há um desafio muito grande. Outro tema importante que tem relação com o trabalho que precisa ser aprofundado é uma valorização positiva das culturas populares. Há um esforço grande para se tratarem delas com seriedade, em outros países não há essa tradição, mas elas são tratadas pelo prisma do exótico, interessante para o turismo ou para manter um núcleo de identidade mais localista, é um trabalho a longo prazo. Mesmo com pouca experiência, na América latina há uma batalha para que as culturas populares sejam respeitadas e aceitas como expressões próprias da diversidade. Chegar à aceitação de expressões exóticas ou puras que são novas, sempre tem maior aceitação dentro dos projetos de política culturais expressões absolutamente legitimas.

LB – Nesse campo em que você atua, na relação do Brasil com os nossos vizinhos mais próximos, mas também com os paises ibéricos, quais os pontos positivos da nossa política, suas características próprias, inéditas, avançadas. E quais as nossas deficiências mais gritantes?

DG – Em toda a América Latina, poucos países tem estrutura de gestão de políticas públicas em nível nacional, estruturas de formulação, de gestão, o Brasil é um deles e são poucos, o México também tem, a Colômbia. As políticas mexicanas são muito diferentes comparativamente a outros países. A construção da identidade moderna mexicana tem relação com o empenho nessas políticas de cultura, de dinâmica própria. A Colômbia, o Chile, nos últimos anos, com muito esforço e trabalho, conseguiram avanços importantes. O Brasil está nesse conjunto de países em que as políticas culturais vão avançando. Creio que temos alguma experiência nessas políticas, em condições especiais, que são bem interessantes em relação ao conjunto latino-americano. Uma delas é a constituição do funcionamento das câmaras ministeriais. Isso dá uma possibilidade de expressão e de reconhecimento do setor de políticas culturais muito mais ampla do que parece. O Brasil amadureceu bastante nesse campo, a experiência com resultados, é uma experiência que vai ter réplicas em outros países, que também vão avançar nessa questão. Como inspiração, não tendo que fazer exatamente o mesmo, mas que vai possibilitar outros avanços. Outra linha que penso ser bem inovadora, não do ponto de vista de proposta, mas de práxis, a constituição de uma câmara interministerial entre cultura e educação. Todo ator que tem relação com educação de cultura fala isso. É muito inovador conseguir fazer. Um caminho, uma primeira etapa, uma questão importante quanto ao sistema educacional é que eles ajeitaram, escutaram e trabalharam em cima de questões curriculares. Nessas reformas, em outros países, especialistas em cultura foram ouvidos, opinaram, houve um diálogo aberto, para que fossem feitas propostas coerentes com o currículo, tendo-se que fazer um esforço de imaginação para encontrar uma forma de se encaixarem ambas as propostas. Outro avanço foi a questão da leitura, livre leitura. Ano passado houve o encontro ibero-americano da leitura, não se trata somente de se trabalhar em cada país, mas de se proporem olhares mais amplos sobre o que está acontecendo. A experiência brasileira de conseguir articular educação e cultura é uma primeira questão. Não há na experiência brasileira uma articulação. Tem a ação própria do campo do ministério da cultura, e outras do ministério da educação, claro, por terem competências diferenciadas, mas vai-se criando uma proposta conjunta. Há questões que têm de ser resolvidas através de um esforço de todo o governo. Por exemplo, a questão das bibliotecas. O acesso ao livro tem que ser resolvido de um jeito objetivo. É verdade que em países mais desenvolvidos têm-se mais acesso para a compra de livros, o livro através da compra, do mercado do livro. Mas nesses mesmos países existe o acesso público aos livros, às bibliotecas, junto com a possibilidade de uma parte importante de a população receber o livro através do mercado, toda a população tem possibilidade de acessos aos livros através das bibliotecas públicas. Espero que o Brasil possa fazer realmente da questão das bibliotecas uma forma de exercitar o direito de acesso ao livro.

LB – E você acha que o Brasil está no caminho de universalização desse serviço?

DG – Tem que haver uma estratégia para isso. No último ano foram criadas, acredito, 500 bibliotecas. Temos que pensar com alguma orientação. Uma primeira, como meta para trabalhar, é que todo município brasileiro tem uma biblioteca que tenha diferentes aspectos da vida cultural, que esteja aberta na semana e com um acervo razoável, que não são vinte livros. A biblioteca não pode ser somente um depósito de livros, mas um espaço de promoção da cultura. Foram então criadas no último ano, bibliotecas, mas ainda estão faltando recursos para que todos municípios tenham bibliotecas, com pessoas qualificadas e uma proposta de articulação local com o sistema educacional. Essas propostas de articulação transformam um direito numa realidade, isso é muito importante. A Colômbia, por exemplo, avançou muito nesse sentido, com um trabalho muito sério, criando pequenas bibliotecas em lugares de acesso difícil, de população pobre, com propostas criativas. O que tenta fazer a OEI é possibilitar um espaço de troca de experiências, tentar levá-las de um lugar para outro. Estamos envolvidos internacionalmente com essa questão da leitura, as propostas do encontro ibero- americano da leitura aceitas pelos ministérios da educação. E estamos agora tentando criar uma revista do núcleo ibero-americano de leitura para facilitar essas trocas. Encontramos na América Latina um espaço de dirigentes de nível de formação interessante, suficiente nesse âmbito. Outra questão é que temos acadêmicos, pesquisadores, pensadores que têm um alto nível de trabalho. Falta uma articulação, isso é uma questão evidente. O formador dos professores é importante, a OEI tem o objetivo de tentar transformar e sistematizar aquele conhecimento a partir de experiências de conhecimento regional ibero-americanas para que chegue ao âmbito da sociabilidade entre as pessoas. Nisso estamos trabalhando agora, através de um projeto de leitura, com educadores, bibliotecários, de se olhar para outras experiências latino-americanas.

LB que a OEI é um ambiente de troca, e retomando a questão anterior, quais as experiências no Brasil que você considera com potencial de surgir como modelo? Além das citadas articulações setoriais?

DG – Os pontos de cultura são uma experiência inovadora. A questão do mercado ainda não completou o ciclo. Muitos países latino-americanos estão hoje num processo de consulta e de participação social para se definirem políticas públicas. O caso chileno é ilustrativo, com uma grande experiência de participação. A Bolívia entrou num processo complexo de reflexão sobre o que tem de ser a cultura referentemente à reforma da constituição, que é um tema que estava na agenda política do país. A Bolívia é um país de um pluralismo cultural muito evidente, quanto aos aspectos em que a constituição do país tinha de contemplar. Há um trabalho na Bolívia sobre essa questão que é muito importante para definir uma política de cultura. Em termos de discursos e práticas, as propostas das políticas públicas estão começando. Têm sido feitas mudanças grandes em muitos aspectos no país.

LB Ainda sobre a questão do discurso e da prática, uma das grande críticas que o Gil tem sofrido dos setores ligados à cultura é que os discursos do Gil seriam muito retóricos e que não teria base em termos de programas de ação. Você concorda com isso?

DG – Nas questões sociais no Brasil sempre há um problema nessa questão entre a constituição e a realidade de direcionar e trabalhar essencialmente pelos estados e pela prefeitura. É um papel que se tem de encontrar para cada caso, que tem relação com a cultura política e a estrutura desta no Brasil, a idéia de maioria legítima na câmara, no senado. O caso brasileiro é um extremo. As mudanças não acontecem porque o governo está longe de constituir uma maioria pelos próprios legisladores, é uma função importante mostrar esse papel. Penso que gerar imagens, propostas, discursos. A lógica faz parte do mundo da cultura. Tem que se falar disso. O problema da ausência de recursos da verba pública é serio, mas não se pode deixar de falar, reconhecer e promover a vontade que existe na sociedade.

LBEm determinados aspectos, essa característica pessoal do Gil se tornou institucional. As pessoas no ministério dão um suporte para a atuação dele no ambiente do discurso, de novas agendas públicas. A questão do modelo de TV Digital, o Gil entrou sem ser convidado nesse processo, algo que esta localizado na casa civil junto ao ministério das comunicações. Ele interveio com a fala de “opa, eu também preciso ser ouvido e participar” e acabou inserindo ingredientes importantes nessa luta. Vejo isso como avanço, mas por outro lado ele ficou fragilizado, não no governo, mas na sociedade. Eu estou fazendo uma avaliação disso como um processo de desdobramento do processo da ANCINAV. Ele chega com um discurso que não tem amparo, sustentação nem no próprio governo que ele faz parte, nem na sociedade. Ele acaba correndo o risco de ser desqualificado. Olha o que a mídia fez com o Gil. Difundiu uma imagem de censor, que felizmente é uma imagem que não pega

DG É evidente que a ANCINAV foi uma proposta que não deu certo porque havia problemas. Sobre o padrão da TV Digital penso que mesmo que as condições sejam as melhores, houve um grande fracasso quanto à questão da cultura. As propostas fracassaram, quando dentro do debate sobre o padrão não se conseguiu ter uma proposta clara, forte, é uma questão grave. Só aparece a questão técnica e o aspecto da concorrência. O que tem de orientar isso é a uma proposta orientada para o bem público, e a cultura ter poder para isso. E o grande fracasso foi não se ter tido uma decisão regional, um grande fracasso. Como no debate do Mercosul, uma decisão do mercosul sobre o padrão não existe porque cada país tem suas próprias definições e debates, e essa questão básica que influi no PIB, na questão do imaginário da sociedade, uma capacidade de exportar valor, criar um mercado audiovisual regional forte, potente.

LB – Existe aqui uma outra questão que é o de se criar salvaguardas em relação à indústria cultural, em bloco, e também em relação às questões internas de cada país. O Brasil, por exemplo, tem uma questão interna seríssima, que é a ingerência política da Rede Globo, e que uma decisão em bloco seja capaz de bloquear essas forças locais. O Brasil não está afeito a essas estratégias de conformação de forças políticas internas e externas para o desenvolvimento de políticas culturais?

DG Pôr limites a algumas aspirações das entidades privadas em relação ao bem da comunidade. Temos daí uma função própria do Estado. Mas também há a possibilidade de que apareçam pequenos concorrentes. A constituição do mercado no espaço audiovisual, podemos ver por outro lado o que vai ser a TV Digital, e chamamos TV porque é o mais parecido com esta realidade. É quando os europeus, portugueses, italianos deram nome ao que tinham relação com o que conheciam.

LB – É um programa de convergência audiovisual

DG Algumas experiências no cotidiano, receber imagens textos pelo telefone celular, falar no computador, enfim, estamos num período de transição do que poderá ser a tecnologia da comunicação em 20, 30 anos, por isso eu falo de fracasso, de o setor cultural ser estrutura do governo. Mas também cultural e civil existem, o laço é forte, mas não conseguimos nesse campo um avanço. As únicas mudanças foram a de especulação técnica. Existe uma possibilidade de se criar uma negociação conjunta dos países latino-americanos do Mercosul, há outras possibilidades. Na união européia, por exemplo, tem-se uma preocupação por se ter capacidade de negociação, e o mercosul precisa avançar nesse sentido. Tem que ser um projeto, que está começando a andar, e não vamos andar para trás, mas está mais devagar do que eu gostaria. A questão do padrão da TV Digital é também uma questão comercial, do mesmo jeito que para as indústrias automotivas temos políticas integradas.

LB – É mais um mercado integrado que uma política integrada…

DG Mas para alguns setores da economia temos políticas; naquele âmbito foi um fracasso de conseqüências muito importantes para a cultura e a sociedade.

LB – A gente fez uma análise um pouco agressiva, talvez radical, de que a posição da sociedade civil em relação à função social da cultura retrocedeu embora a gente tivesse ampliado essa percepção a uma elite intelectual. Os programas de governo dos candidatos à presidência, por exemplo. Nem o Lula conseguiu desenvolver o plano à altura da formulação do ministério. Na eleição anterior houve um documento que chama a “imaginação a serviço do Brasil” que tem uma base ideológica e estratégica, às vezes contraditória, mas existe uma visão conceitual forte, um plano de ações um pouco desengonçado mas tem. Hoje a gente retrocedeu, essa base conceitual foi esvaziada. o PSDB nunca teve um plano estruturado para isso e continua não tendo, a Heloisa Helena não tem nenhuma linha, o Cristóvão Buarque tem sete pontos instrumentais e nenhum deles reconhecendo cultura como eixo emanador de desenvolvimento. Queria a sua opinião em relação a essa mão do estado, essa interlocução estado-sociedade que é inédita. Qual o efeito disso? Ao fazer essa tentativa de articulação, o Estado não está tirando essa força da sociedade, desarticulando-a? Fico preocupado porque essa sustentabilidade para tais discursos e ações está na própria sociedade, então não se pode ter uma ação vertical

DG – Este é um problema que a sociedade brasileira tem que resolver sobre o seu governo, além do “quem é o presidente, o ministro”. Não é essa a causa, somos responsáveis por encontrar a solução para essa questão. O sistema nacional de cultura é uma proposta que ainda não aparece com força na sociedade, mas que já começa a ser considerada. Penso que uma questão fundamental é criar um sistema de cultura que supere a fragmentação própria dessa estrutura governamental, criar esse sistema e respeitar a constituição. Começar a funcionar é um desafio que supera não só a estrutura do ministério porque é uma questão do governo, de decisões políticas que dêem conta dessa necessidade de ter um sistema nacional de cultura popular. Não que tenha de ser a primeira, mas que seja uma das prioridades. Imagino funcionando um sistema onde a estrutura governamental tenha outra relação com a sociedade civil. Voltando a uma questão que já discutimos, que é tentar encontrar o papel do governo federal de manter prioridades de políticas públicas gerais, mas também fazer trabalhos de compensação em regiões, estados, setores, minorias, que possam cuidar e garantir o exercício de direitos para todos. Isso é uma questão muito séria. Nos projetos eleitorais, como você disse, a cultura não aparece. Entendo que pelo menos cada candidato tivesse um posicionamento quanto a isso. Não há uma vontade acima do debate eleitoral, da briga. Em todos, em geral, tivemos uma questão muito boa dos candidatos e do ambiente político porque era a oportunidade de falar de outro tema que não fosse aquela agenda de questões dos escândalos. Há ainda outro tema em relação a essa eleição que é a questão da educação. No início das campanhas esse tema era mais forte, depois foi caindo. Estou convencido de que os candidatos também estão convencidos da importância desse tema. Estou igualmente convencido de que as políticas de educação que apareceram foi uma resposta às exigências da sociedade.

As expectativas populares, muito sérias e de fundamento legítimo, são superiores à realidade.O sistema de gestão pública da educação é um problema muito grave. Em relação à educação o perigo reside em que a tentativa seja frustrada e gere uma imagem de que “não vai dar certo”, de que não há saída. É muito importante a educação ter permanecido na agenda do debate eleitoral. Penso ter o escândalo consumido e atrapalhado toda essa agenda, e trata-se de um tema central. A expectativa da população não é respondida com maturidade. Um avanço e a população já reconhece, Não falo daquele que está esperando a revolução há quatro anos. Começou-se a gerar então a imagem, o discurso do “não tem jeito”, que a educação seria uma possibilidade para o Brasil. E o discurso eleitoral não foi nem um pouco qualificado, mas pelo menos foi um tema importante que participou do debate. Cultura é um pouco diferente, porque não esteve na agenda política do debate eleitoral. Mas também aparece no discurso do Gil e cria-se expectativa. O problema quando uma questão importante aparece na agenda é que então vira moda, e a moda passa para outra moda, apropriada por pessoas que têm outras preocupações. E depois passa-se a outra coisa. Há uma preocupação muito legítima da sociedade, há uma militância de educadores que no cotidiano constroem e mantém o sistema de educação, especialistas, pesquisadores que fazem um esforço muito grande para se ter o melhor de educação possível para a sociedade. Um casal quando começa a namorar jura amor eterno e no cotidiano tem que resolver as situações, gerar um discurso, uma imagem, um compromisso. É a condição para se criar o projeto. É evidente que o governo federal precisa de mais recursos para a própria estrutura. O patrimônio brasileiro, para o qual existem alguns programas, é fantástico e precisa de outro atendimento. O grande desafio, além dos investimentos que o governo tem de fazer, seja federal ou estadual, quanto ao patrimônio, é a desigualdade brasileira, que tem uma base cultural. Se a cultura não consegue a política também não. A Itália, por exemplo, tem uma condição de oferecer saúde para a população que nenhum país da América latina tem, e isso é cultural. Se uma criança tem fome na Itália, é um escândalo para toda a sociedade. Uma criança que tenha fome, uma , o governo tem que dar satisfações, e isso também é cultura. No programa de governo tem que se chegar a um ponto em que a sociedade não aceite. Esse é um tema que foi importante, que é a cultura política dos anos 70 e como as culturas populares, muito ricas, tem a ensinar às culturas hegemônicas, na versão de cada país. Não estou falando de uma questão folclórica. Um caso extremo, em que um materialista ateu com uma consciência do valor da sociedade e do respeito, é uma questão transcendente do cotidiano, que tem comparação com uma visão religiosa. Isso, na nossa cultura hegemônica, se perdeu. Mas em outros países se tem essa consciência. Para toda a América latina essa questão parece se ater a outros diálogos com culturas populares, que são essenciais se quisermos construir uma situação humana de paz, essa é uma questão. O Brasil teve uma experiência quanto a isso, o surgimento do PT que tinha uma linha de trabalho. Mas o acesso ao governo gerou algumas situações. Passar do discurso à pratica não é fácil, e o Brasil tem muitas capacidades. Alem das dificuldades há sempre um olhar sobre o que está acontecendo no Brasil, e também esse país é exportador de empresas culturais, na música, nas novelas.

Leonardo Brant


Pesquisador cultural e empreendedor criativo. Criador do Cultura e Mercado e fundador do Cemec, é presidente do Instituto Pensarte. Autor dos livros O Poder da Cultura (Peirópolis, 2009) e Mercado Cultural (Escrituras, 2001), entre outros: www.brant.com.br

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