Neste artigo de Almandrade, uma análise das abordagens políticas das questões relacionadas à arte: “na maioria das vezes, são discursos onde a cultura não passa de uma fantasia, uma miragem no fim do túnel”
Nas chamadas políticas culturais emergenciais, na maioria das vezes, são discursos onde a cultura não passa de uma fantasia, uma miragem no fim do túnel.
Como ela não é assunto prioritário, foi transferida para a iniciativa privada. Os investimentos visam retornos, fala-se em números, percentuais, nas leis de renúncia fiscal, sem uma idéia clara de cultura e seu papel na sociedade.
Todo mundo se acha no direito de opinar, o patrocinador, o empresário, o político, o produtor cultural, o professor universitário, o curador etc. menos o artista e os que trabalham diretamente com as práticas artísticas, os operários da linguagem.
Depois da descoberta tardia que a cultura não se restringe às linguagens artísticas, as práticas acionadoras do pensamento crítico passaram a ser vistas com desconfiança, “coisas de elite”, foram marginalizada e o entretenimento passou a ser o centro do financiamento público. A festa passou a ser o alvo dos investimentos públicos e privados em detrimento da cultura pensamento.
O que deveria ser uma política pública de cultura? Uma pergunta oportuna em momentos de transição política, quando as reivindicações reaparecem e as disputas por cargos públicos emergem. Antes de ser um problema de economia, de leis de incentivo, de política partidária, a cultura é um dispositivo da cidadania, um direito básico que deve fazer parte da formação do sujeito.
“A cultura é coisa do homem que mora num certo lugar e num certo tempo” (Gerardo Mello Mourão).
Portanto, antes de falar dos reduzidos recursos econômicos destinados à área cultural, é estratégico se pensar em intervir culturalmente no modelo de desenvolvimento que afeta o meio ambiente, as condições materiais, sociais e culturais de uma comunidade.
Uma política de cultura deve primeiramente levar em conta o quanto ela contribui para o imaginário das pessoas, tornando-as capazes de assumir decisões nas suas vidas. Que ela é uma forma de relacionamento com o mundo e seu cotidiano, antes de ser uma mercadoria e um objeto da política.
Relegada à condição de entretenimento, passou a fazer parte das diversões, regida pela economia da cultura. E tudo que faz a economia crescer, que gera emprego e renda é ético nesta sociedade onde o emprego é cada vez mais difícil.
Mas a ética e lógica da cultura é outra. Se a diversão faz a economia crescer, atende a demanda de habitantes, e turistas carentes de lazer, poucas vezes contribui para o aumento e transformação do repertório.
O homem vive entre a natureza e a cultura. E a cultura é uma construção do homem. Um trabalho. Resultado de um longo caminho. Cada cidade, estado ou região tem uma cultura que lhe é própria e múltipla.
Uma política de cultura deve garantir a liberdade das diversas manifestações, sem qualquer interferência, e transferir as decisões para quem faz cultura, quem conhece as particularidades das linguagens, quem diretamente lida com o patrimônio material e imaterial que faz o acervo de uma cultura.
E quando se fala de artes, produtos diversificados e delicados e ao mesmo tempo conhecimentos específicos que fazem parte de uma cultura, o político, o produtor ou o atravessador deve ser substituído pelo técnico ou o especialista do metié.
E uma instituição que trabalha com as artes tem como princípio estimular a liberdade de expressão e não servir com extensão de outras políticas ou de outras instituições.
Almandrade
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