Nascido em São Paulo e nacionalizado, o Fórum de Cultura Populares ampliou sua ação administrativa com a criação de uma organização não-governamental, uma rede de emails de caráter nacional e a Cooperativa de Cultura Popular, para viabilizar mercado de trabalho.  

SÃO PAULO – Do modernista Mário de Andrade, a Florestan Fernandes e Paulo Freire, diversos pensadores – ainda que talvez não suficientemente – já debruçaram seu olhar sobre a cultura popular brasileira. Seja de maneira alarmista, como fizeram muitos folcloristas ao declarar que a cultura do povo estava acabando, seja politizando-a, como nas discussões levadas a cabo no Centro Popular de Cultura, o CPC da UNE, durante a ditadura militar.

De lá para cá, algumas discussões avançaram, e novos desafios surgiram. Da parte governamental, a criação da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural, chefiada atualmente pelo ator e produtor Sérgio Mamberti, significou uma disposição favorável da gestão do Ministro Gilberto Gil em relação ao tema.

No entanto, como é usual na política, nada acontece no Estado se não houver uma pressão da sociedade civil. E ela existe pelo menos desde agosto de 2002, quando foi oficialmente fundado o Fórum Permanente de Cultura Popular (FCP). Influenciados pelas discussões do movimento da classe teatral, Arte Contra a Barbárie, que culminou na conquista da Lei de Fomento ao Teatro, profissionais do circo, teatro, música, produção cultural, resolveram juntar-se para organizar um movimento que discutisse a cultura popular. A primeira reunião, no galpão Raso da Catarina trouxe cerca de 80 pessoas. “Demoramos para decidir o que seríamos. Depois de um ano e meio, optamos por ser uma rede, um espaço livre de articulação. Decidimos também que nossa vocação seria discutir política pública”, explica um dos fundadores e atual presidente do Fórum, o produtor cultural e antropólogo Marcelo Manzatti. A articulação deu certo e, muitos grupos de trabalho e discussões depois, surgiu a primeira grande materialização: a realização do o Seminário Nacional de Políticas Públicas para as Culturas Populares (SNPPC), em parceria com o Ministério da Cultura (MinC), que aconteceu em Brasília em 2005, e teve uma segunda edição em 2006. A partir de então, a organização em fóruns acabou se espalhando pelos estados, restringindo as ações do FCP ao Estado de São Paulo.

E o que é o fórum hoje? “Ele representa um espaço público de discussão, onde de fato existe uma representação reconhecida pelos setores governamentais”, opina Daniel Mã, integrante do Fórum, músico e cientista político. Existe ainda a função consultiva, já que muitos dos seus integrantes passaram a dar consultorias em editais e fóruns regionais. Manzatti descreve a tarefa do movimento hoje como uma base de sustentação para que as comunidades consigam sobreviver: “eu acho que o trabalho do fórum é o de preservar a possibilidade da dinâmica de modificação e evolução para que seja mais condizente com a sustentabilidade da comunidade, para que lhes sejam dadas opções concretas”. Isso porque cultura popular é uma questão cultural, mas é, antes de tudo, uma questão econômica e social, daí a dificuldade de elaborarem-se políticas públicas para o segmento. “Não adianta você dar uma viola novinha pro cara e ele estar sem dente” – comenta Manzatti.

Nesse sentido, as políticas públicas que mais afetam as comunidades tradicionais atualmente são as que envolvem posse de terra para quilombolas e povos indígenas. “Ao preservar as condições de vida daquela comunidade, serão preservadas também as expressões culturais. Eu preservo a natureza, o meio ambiente, eu garanto o acesso a terra, então, teremos as raízes com que eu faço meu remédio e minha alimentação vai se manter”, complementa.

Comunidades tradicionais x Classe média
Depois de delimitar o Estado de São Paulo como espaço de ação, o FCP resolveu ampliar suas opções administrativas. Foram criadas uma organização não-governamental, uma rede de emails de caráter nacional – com 2.200 associados atualmente – e a Cooperativa de Cultura Popular, para viabilizar mercado de trabalho. Mas, como a maioria dos mestres e grupos tradicionais são completamente marginalizados, essa opção administrativa não pode atender seus interesses, a não ser os que estejam mais organizados como artesãos, por exemplo.

A cooperativa é, então, destinada aos chamados recriadores, artistas que se utilizam das influências da cultura popular para criar e recriar, como, por exemplo, grupos de maracatu, forró e moçambique paulistas que existem não por tradição, mas por identificação artística e estética.

A questão dos recriadores, porém, divide opiniões. Isso porque, geralmente, estes artistas são egressos da classe média, e se, por um lado, podem fazer a ponte com as instituições governamentais, chamando atenção para a causa, do outro, tem muito mais facilidade de conseguir retorno econômico e reconhecimento público. Para Alfredo Bello, músico e dono de um dos maiores acervos de música tradicional brasileira, “ o que preocupa é a relação que os recriadores têm com as comunidades. Como eles lidam nos lugares onde bebem na fonte. Tem muito oportunista nesse meio”.

Marcelo Manzatti, apesar de reconhecer que existem muitos “sanguessugas”, chama atenção para uma concepção um tanto romântica de que as comunidades tradicionais devem ser “preservadas”. “Esses caras não estão numa bolha, eles estão na sociedade. Se eu sou um compositor, não posso compor um samba porque não sou do morro?”

De qualquer maneira, os desafios são muitos para quem trabalha e/ou se preocupa com as diversas questões que o universo da cultura popular abrange.

Daqui pra frente…
No final do ano, o MinC planeja realizar o Fórum Nacional das Culturas Populares. Cada estado deverá realizar uma edição própria do fórum a fim de eleger representantes para o fórum nacional. Desta reunião, um representante será escolhido para a mais nova cadeira criada no Conselho Nacional de Política Cultural, destinada às culturas populares.

Para participar da rede de emails escreva para culturaspopularesBR-subscribe@yahoogrupos.com.br

Georgia Nicolau


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Georgia Nicolau é jornalista e produtora cultural

2Comentários

  • Silene Farias, 27 de julho de 2007 @ 17:09 Reply

    Faço parte de um grupo de Folguedo, o Eco_Diversional Marupiara Jabuti-Bumbá. Muito bom saber do Forum Permanente sobre Cultura popular.

  • Manoel, 27 de novembro de 2008 @ 21:59 Reply

    Olá amigos, apenas hoje me deparei com está entrevista. Quero felicitar o Marcelo pela iniciativa e a Geórgia pelo artigo. Quero aproveitar para apresentar um ponto de vista. O fórum de cultura popular aqui no Paraná não é o que aparenta. É claramente partidário, anti-democrático, agindo em prol de si mesmos, sinto por vocês acreditarem nesta represntações regionais que praticam a desinformação e alienação! Os representantes tem agido em nome deste fórum, sem ao menos serem atuantes como mestres populares, membros de comunidades ou qualquer coisa que os qualifique. Ao contrário, são uns quatro artistas urbanos de Curitiba, agentes políticos e funcionários públicos da área de cultura.
    Enquanto isso, as entidades representativas e legalizadas, ficam sem informações fundamentais para que possam fazer uma efetiva e responsável para a representação cultural do Paraná. O fórum de culturas populares no Paraná é subsidiado por atividade política e partidária e não tem legitimidade.
    Tem participado de eventos junto ao MinC a revelia das artes e da cultura paranaense, sem a menor competência para suas ações, sem dados, pesquisas e sem ao menos manter comunicação ou troca de informações com demais movimentos. Negam-se encontrar com as outras entidades para esclarecer suas ações. Não respondem de forma clara aos movimentos e comunidades. E em suas peregrinações ninguém fica sabendo o que estão defendendo. A não ser o óbvio, seus respectivos interesses! Os representantes do fórum popular do Paraná não representam à cultura do Paraná, fiquem sabendo os membros do fórum popular do resto do Brasil, no Paraná vocês não existem.

    Abraço,

    Manoel Neto

    Presidente do Fórum de Música do Paraná
    Membro do Conselho Municipal de Cultura de Curitiba; Colegiado Setorial de Música do CNPC/MINC; Fórum das Entidades Culturais do Paraná;
    Participante da Conferencia Nacional de Cultura; II Seminário Nacional de Políticas Públicas para as Culturas Populares; Grupos Transversais da Economia da Cultura do MinC/IBGE/IPEA; entre outros.

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