Hoje, os jornais fazem a crítica de teatro como se fosse uma avaliação puramente técnica. Esta é a opinião de Eduardo Tolentino, que já foi jornalista e atualmente é diretor do Grupo Tapa. Na avaliação do diretor, o que falta é um corpo crítico, que não se resuma a dois ou três jornais com apenas um crítico em cada.

Além disto, não se pode tratar do mesmo jeito manifestações culturais com propostas totalmente diferentes – por exemplo, um teatro universitário como o TUSP e um grande teatro comercial como o Abril. Fazer uma crítica de teatro não é o mesmo que repassar a ficha técnica do espetáculo e destacar o nome das grandes estrelas. “Antes os jornalistas eram formadores de opinião” – compara Tolentino.

Sérgio Carvalho, da Cia. Do Latão, também vê a atitude mercadológica da crítica como um problema. Contestando a frase de Samuel Wainer, segundo quem “a pena é livre, mas o papel é do dono”, o diretor afirma: “A pena não é livre. Ela é condicionada pelo olhar do mercado”. Ele compara o momento atual com a crítica do século XIX, orientada em torno do culto às estrelas do palco.

Nas palavras de Carvalho, foi no século XIX que a noção da individualidade dos atores (surgida após a Revolução Francesa) se transformou em culto a personalidades. Os críticos novecentistas não usavam mais os valores da aristocracia e sim os do mercado. Seus textos seguiam o modelo cronístico de comentar o texto, o primeiro ator e o público – sempre elogiando a estrela.

Segundo o diretor, a crítica ainda não conseguiu lidar com a encenação contemporânea, que questiona as regras do mercado. Desde o final do século XIX, com o naturalismo, as vanguardas artísticas questionam conceitos ligados à encenação, como a idéia de separar peças por gêneros (drama, comédia). Porém, o jornalismo não acompanhou este passo e, na opinião de Carvalho, valoriza o consumo hedonista de um público idealizado. “Os editores ainda preferem falar das grandes estrelas a receber novos atores”.

“Falta imaginação e espaço para o alternativo”. Como exemplo de jornal alternativo de cultura, Carvalho se lembra de “O Sarrafo”, publicação produzida por companhias teatrais de São Paulo e cuja linha editorial era condizente com o título. As matérias, podiam ser assinadas com pseudônimo e propor polêmicas, como uma que acusava a Volkswagen de financiar eventos com dinheiro público.

A crítica teatral Beth Néspoli avalia que falta espaço para a crítica teatral nos jornais. Também faltam críticos. Para ela, o trunfo do jornalismo na era da Internet é hierarquizar a avalanche de informações da rede. “Pago para ler aquele jornalista que faz a escolha da informação. Mas ele deixa de me interessar quando tem apenas 20 linhas”.

No caso do jornalismo cultural isto é mais difícil, porque ele ocupa uma posição marginal nas redações. “É difícil entender as especificidades do jornalismo cultural. No teatro, você vive aquele espetáculo, aquele dia, tem que ir lá e ver”. O repórter de cultura, numa rotina de redação pensada para outras coberturas, acaba assumindo uma jornada tripla.

O enxugamento de redações é um empecilho, porque diminui o debate. “Quando entrei, havia jovens e experientes, aprendia-se nas reuniões de pauta”. Havia intercâmbio entre os jornalistas mais experientes e os ingressantes. Beth se lembra de uma das primeiras pautas que sugeriu, sobre o diretor Zé Celso. Na redação, aceitaram a pauta, mas foi indicado um repórter experiente para a tarefa difícil de entrevistar o tropicalista.

O II Congresso de Jornalismo Cultural foi realizado de 3 a 6 de maio, no TUCA, em São Paulo, e contou com mais de 70 participantes do Brasil e do exterior.


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Jornalista, formando pela ECA-USP. Pesquisa jornalismo, teatro e censura.

1Comentário

  • Andrea Carvalho Stark, 14 de maio de 2010 @ 21:13 Reply

    Saudades de Michalski, Decio de Almeida Prado e Sábato Magaldi… A crítica caiu no cronismo, na divulgação imediata, na “política” de meio para se construir redes de contato. Falta “in-formação” histórica e estética a muitos que escrevem sobre teatro nas redações e tb na web. Por outro lado, falta mesmo uma relação dos próprios artistas com a crítica, pois eles se ferem suscetíveis a qualquer “crítica”. A crítica não deveria reprovar, não deveria apontar erros e acertos (qual o critério?), deveria sim alargar o entendimento da obra, iluminar o trabalho da criação, valorizar sempre o artista, observando atentamente o que ele cria como linguagem de arte…

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