No final dos anos 80, quando Berlim ainda tinha o status de uma ilha, o privilégio de ver filmes em versão original era coisa rara. A única exceção eram filmes em língua inglesa, exibidos em cinemas especialmente construídos para os soldados norte-americanos, estacionados na parte ocidental de Berlim.
Logo logo esses poucos cinemas viraram cobiçados oásis para aficionados da sétima arte, que fugiam da poderosa indústria de dublagem até hoje persistente na Alemanha. Esse setor de peso dentro da indústria cinematográfica, que é de grande relevância econômica, oferece real possibilidade de empregos para tradutores, diretores e vozes de sincronização, desenhistas e pintores dos cartazes dos filmes traduzidos para a língua alemã, alimentando no país a longa tradição de filmes dublados que acostumaram mal a maior parte dos alemães, que até hoje permanecem numa zona linguística de conforto. A maioria esmagadora, independente de faixa etária e público-alvo, continua preferindo os filmes dublados em alemão.
Foi-se o muro, na sequência os soldados, ficaram os cinemas. A dinâmica veloz da globalização que relativiza as distâncias geográficas, somada ao avanço da tecnologia na simplicidade e rapidez da transferência de grandes volumes de dados, trouxe a regularidade de filmes em versão original para cinéfilos do país e vai enriquecendo a oferta cultural, hoje muito além da época de pequenas salas de cinema com programação alternativa, culturamente muito valiosas, mas de infraestrutura pessoal e técnica rudimentar.
Também a mudança de paradigma com o aumento de importância do papel do Brasil, agora como força política e econômica perante à comunidade internacional, somada às leis de incentivo para divulgação da cultura brasileira no exterior, formam um pacto de fatores chave na mudança desse cenário cultural de percepção da cultura brasileira no exterior.
O Festival Première Brasil que já acontece há 9 anos em Nova Iorque, iniciou nesta quarta-feira (16/11) a sua terceira edição na capital alemã, na Casa de Culturas do Mundo, instituição cultural de maior prestígio do país, com uma média anual de 1 milhão de visitantes, um subsídio anual de 1,9 milhões de Euros vindos do Ministério da Cultura alemão e 1,25 milhões do Ministério das relações exteriores.
Première Brasil na Casa das Culturas é a dobradinha cultural perfeita. Mesmo ainda galgando um lugar fixo no calendário cultural eclético e muitíssimo concorrido da cidade de Berlim, PB traz em 2011 uma excelente coletânea de filmes exibidos nas duas últimas edições do Festival do Rio. A curadoria é assinada por Ilda Santiago.
Essa parceria de alto valor político-cultural, com promessa de continuidade, tem do lado alemão a Casa das Culturas do Mundo e do lado brasileiro o Festival Internacional do Rio de Janeiro, o Ministério da Cultura, o Instituto Goethe (sucursal Rio) e a Embaixada Brasileira em Berlim.
Hector Babenco que seria o homenageado do Festival, cancelou sua vinda para Berlim por questões de saúde. “Pichote, a lei do mais fraco” e “O Passado” serão exibidos mesmo sem a presença do Diretor.
Silvio Tendler, já na capital, traz na mala “Utopia e Barbárie”. O Diretor Karim Anöuiz, natural do Ceará, berlinense desde 2004 e com certeza um dos mais instigantes diretores brasileiros contemporâneos, apresenta “Abismo prateado”, pelo qual recebeu recentemente o prêmio de melhor diretor no Festival do Rio.
O filme de abertura foi “VIPs”, do diretor Toniko Melo, muito bem recebido pela platéia. A organização do festival ficou devendo um bate-papo com a platéia depois do filme.
O painel agendado para o próximo sábado promete: “Documentários brasileiros de cunho politico: Biografias, Movimentos, Discurso” tem a participação dos diretores Eryk Rocha, Flávia Castro e aquele que é indispensável quando se trata de um formato documentário: Silvio Tendler.
Première Brasil vai até 27 de novembro.
1Comentário