A notícia de que um projeto de poesia de Maria Bethânia, teve aprovação pelo Minc para captar R$ 1.350 milhão, através da Lei Rouanet, vem causando uma enorme polêmica na mídia, ressuscitando uma outra polêmica mais antiga, essa, criada pelo ex ministro Juca Ferreira. Ele deixou um legado perverso para cultura brasileira, dividindo a classe artística, antagonizando o norte/nordeste do país com o sul/sudeste, alegando que os recursos da Lei Rouanet ficavam concentrados nessa última região. No entanto, no marketing de suas idéias equivocadas e de seu esquerdismo infantilóide, ele foi eficiente. Gastou uma fortuna (dinheiro público) rodando o Brasil para destruir a imagem da Lei Rouanet, que mesmo com suas falhas, trouxe benefícios extraordinários para a cultura brasileira.

Mas não se enganem, o único objetivo que o ex-ministro tinha, era ter o controle absoluto da destinação das verbas. Ele não se conformava que o orçamento do MinC era menor do que a verba do incentivo fiscal e ao invés de brigar com seus pares no governo para aumentar o orçamento de seu ministério, preferiu brigar com os artistas, produtores, gestores etc. Para conseguir seu intento, divulgou dados e números nunca comprovados e sempre rebatidos. Era só pesquisar no site do próprio MinC, para que as contradições de seu discurso aparecessem. Porém,  Juca é um grande comunicador, sua campanha difamatória teve sucesso, e é por isso que hoje acompanhamos a polêmica com Maria Bethânia.

A mídia, em alguns casos, tem sido cúmplice desse patrulhamento, fornecendo dados imprecisos e muitas vezes, sem checar suas fontes, acaba levando a opinião pública ao engano. Até mesmo jornalistas importantes como Ricardo Noblat, entraram no jogo. Em sua coluna de 21 de março no “O Globo”, repetiu o discurso inconsistente e os números nunca comprovados de Juca Ferreira.

Não sei porque, sinto um cheiro de revanche e amargor, querendo prejudicar a gestão de Ana de Hollanda, à frente do MinC.

Basta de hipocrisia com a Lei Rouanet. Porque essa fúria ideológica que recai sobre os incentivos fiscais na cultura? Não vejo os que bradam contra a lei Rouanet, se insurgirem contra os incentivos fiscais da indústria eletro-eletrônica, da indústria têxtil, dos taxis, das TVs de plasma, da indústria automobilística e de tantos outros setores. No bolo dos incentivos fiscais do Brasil a cultura tem aproximadamente 1.6% do total. Que fúria é essa? Aliás, só precisamos do incentivo fiscal, porque o orçamento de nosso ministério é o penúltimo da União. Só perdemos para o ministério da pesca. Esse fato demonstra o apreço e importância que a cultura tem para nossos governantes.

Em sua matéria, Noblat cita que a Lei Rouanet só tem boas intenções, mas que sua prática é “quase toda ruim”. Essa informação só pode ter vindo de alguém que nunca pesquisou os resultados da lei nos últimos 15 anos. Noblat assume o discurso beligerante de Juca Ferreira, acusando artistas, produtores e gestores de fazerem negócios escusos com as verbas incentivadas. Se isso for verdade, o ex-ministro Juca Ferreira deveria ser processado por prevaricação, por não ter zelado pelo dinheiro público, pois, não me consta, que alguém tenha sido preso pelos delitos alegados. Se houve alguma ação ilegal, aplique-se o rigor da lei, punam-se os culpados, sejam eles quem forem. Mas, basta de jogar lama em nossa combalida atividade cultural.

Noblat, continua o discurso do ex-ministro, quando alega que, são os departamentos de marketing das empresas que definem a destinação das verbas da Lei Rouanet, mas talvez não tenha se dado conta, que quase 50% desses recursos vem das estatais, ou seja, do governo ou por pressão dele. Por isso a maior concentração de recursos da lei está no Rio de Janeiro, por conta da sede de muitas estatais estarem na antiga capital. Talvez não seja do conhecimento do jornalista, que, apesar da implacável cruzada contra a Lei Rouanet, várias órgãos governamentais se beneficiam dela, como a Funarte (órgão do MinC) e a própria presidência da república, por exemplo, concorrendo de maneira desleal com os produtores culturais. Isso sim, é um escândalo.

Ainda em seu artigo o jornalista traz à tona, um dos episódios mais deselegantes protagonizados pelo ex-presidente Lula, que, no dia do lançamento da “pedra fundamental” do Vale Cultura, acusou empresários paulistas de fazer propaganda com dinheiro do incentivo fiscal. Só a título de esclarecimento, as acusações de Lula nunca foram comprovadas e o Vale Cultura, que não passou de um lançamento festivo em plena campanha eleitoral ainda não saiu do papel, apesar de ser uma unanimidade nacional.

Por fim, o prezado Noblat fala da centralização de recursos incentivados no sul/sudeste, citando números maquiados pelo MinC e acusando um dos mais sérios produtores de São Paulo, Paulo Pélico, de defender essa centralização, fato que nunca aconteceu. Ele, como muitos outros, foram estigmatizados porque sempre combateram as idéias do ex-ministro. Paulo Pélico, sendo um dos maiores conhecedores das leis de incentivo nesse país, sabe muito bem, que a centralização de recursos de fato existe, mas sabe também, que ela foi intensificada pelo aumento da burocracia na gestão de Gil/Juca, não só nos recursos incentivados, mas também no Fundo Nacional de Cultura, o que é mais grave, pois, no FNC é o ministro quem assina o cheque. Pesquisa no banco de dados do Minc nos permitia chegar a essas conclusões, mas, Juca dizia que, “nós não sabíamos ler números”. Números são números e estão à disposição no site do MinC, para quem tiver paciência de estudá-los.

Mas sempre foi assim, Gilberto Gil assumiu o Ministério da Cultura, bradando contra os artistas consagrados que, segundo ele, consumiam quase todos os recursos do incentivo fiscal. Ele estava muito mal assessorado, pois logo se comprovou que a informação era incorreta e ele teve que se retratar. Quando Juca (ex-assessor de Gil) assumiu o MinC, retomou a campanha difamatória contra artistas consagrados, esquecendo que eles são um dos pilares das economias criativas, defendidas pelo MinC, e que tantos benefícios trazem ao país (5% do PIB, segundo o IBGE)

E então me pergunto: Porque uma das maiores artistas brasileiras como Maria Bethânia não pode receber recursos incentivados para fazer seu projeto poético, que vai divulgar e popularizar a arte da poesia? Um projeto que apresentará 365 vídeos dirigidos por outro grande profissional, Andrucha Waddington, o que em termos de tempo, daria aproximadamente 3 longas-metragens. O projeto de Bethânia  disponibilizará tudo isso gratuitamente e tenho certeza, com a qualidade que sempre admiramos em seus trabalhos, desde seu surgimento no Grupo Opinião. Se eu fosse poeta, daria a vida para que ela gravasse uma das minhas poesias, como não sou, dou todo meu apoio, para que a poesia a literatura e a beleza estejam sempre disponíveis na voz de Maria Bethânia.

Isso não tem preço.


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Ator e produtor de teatro, Odilon Wagner é presidente da Associação de Produtores Teatrais Independentes (APTI).

20Comentários

  • Carlos Henrique Machado, 30 de março de 2011 @ 20:13 Reply

    Odilon

    É profundamente lamentável a situação constrangedora que viveu a Bethânia. Isso dá um gosto de amargo e até de injustiça. Na mesma semana do episódio do seu blog, eu a vi no programa de Regina Cazé cantando lindamente ao lado de Arlindo Cruz, o que chateou ainda mais porque, na verdade, houve toda uma política para se manter a Lei Rouanet em que se anestesiava a consciência de todos com duas palavras, sistema e mecanismo. Todos querem esconder a fonte dos recursos que, na verdade não são as empresas patrocinadoras e sim o suor do povo brasileiro.

    Lula está coberto de razão, as empresas usam os recursos da lei de incentivo para erguer e manter as suas fundações e institutos, tanto que a proposta do Sindicato que você preside é de ampliar de 4 para 8 o percentual do imposto devido pela empresa e empregado em patrocínio cultural, sem que as fundações e institutos se apropriem dos 4% adicionais propostos por vocês. Porque é sabido, ainda por pequena parte da sociedade, que o maior banco privado da América Latina e um dos maiores do mundo ergueu a sua fundação num dos espaços empresariais mais valorizados do Brasil com recursos públicos. Além de, no penúltimo balanço feito pelo Ministério da Cultura, esse banco, o Itaú aparecer como o maior captador de recursos da Lei Rouanet.

    Imagine só! A Fundação CSN, por exemplo, mantém um dos maiores complexos esportivos do Brasil, mais duas sedes e um hotel de luxo, tudo isso misericordiosamente com dinheiro da Lei Rouanet, são milhões anualmente. Não bastasse, nesse último balanço, vemos a Vale manipular, sobretudo politicamente mais de 100milhões desses mesmos recursos extraído da sociedade.

    Acho Odilon que tudo isso tem que ser muito bem colocado para chegarmos a um conceito de política pública autônoma, onde a sociedade determina através do governo as prioridades desses inventimentos, já que é a sociedade a grande mecenas deles. Da mesma forma o setor privado tem que ter a responsabilidade de, se quiser autonomia, lançar mão de seus recursos e fazer a publicidade que quiser, aonde e como quiser, mas sem restituição fiscal.

    Creio que se separássemos as duas formas de investimento, o que nasce dos investimentos públicos que se mantenha público e o que nasce dos investimentos privados que se mantenha privado. Assim, os conflitos se acabam. Se, ao contrário, a lei se mantiver da forma que está, a sociedade a cada dia mais informada, irá mesmo mostrar a sua fúria, e não é uma fúria ideologizada não, será uma fúria por seus direitos, já que seus deveres são casados neste imbróglio chamado Lei Rouanet compulsoriamente. E o povo, depois de vinte anos, está descobrindo isso. Por isso o fogo tende a aumentar a pressão da panela.

  • Robson Santana, 30 de março de 2011 @ 20:16 Reply

    Odilon Wagner, segundo o Juca você é artista consagrado. Então você não pode falar, defender outro artista consagrado, como se você tivesse com a vida ganha, não fosse obrigado a ralar, pagar contas. Para o outro, quer tirar o direito autoral, para você, consagrado, quer tirar a Lei Rouanet. Democratizar, no vocabulário de Juca, significa fragilizar a produção cultural a ponto de torná-la refém do governo e seu governante. Foi assim que as ditaduras brasileiras fizeram e é assim que os autocratas querem fazer.

    Não tem nada não, Odilon. O Juca foi embora e logo logo vai cair a ficha da sociedade brasileira para o mal que esse sujeito fez ao Brasil. O mais curioso é que ninguém sabe onde foi parar o Juca. Fiquei sabendo que ele vai ter um cargo de terceiro escalão numa repartição pública em Madrid, na Espanha. A Dilma tá certa, é bom deixá-lo bem longe da produção cultural e da política brasileira.

    Vai tarde Juca!

  • Sergio Henrique, 30 de março de 2011 @ 20:20 Reply

    Independentemente de outras questões pertinentes levantadas pelo texto:

    Devemos ter respeito pelos recursos públicos, ainda que indiretos. Devemos ter comedimento. É uma atitude saudável.

    O tal projeto do blog Bethania é bacana. Tem implicações bonitas para além das poesias que, certamente, Bethania sabe declamar com maestria.

    Mas está luxuoso. Demais.

    Maria Bethania é uma gigante nas artes, tenho certeza de que merece remuneração de topo de mercado.

    Mas atribuir, para si, quase metade de todo o valor a ser captado — o que corresponde a uma remuneração mensal de R$ 50 mil, certamente por uma semanada bem abaixo de 40h — é incompatível com a necessidade que temos de comedimento com a coisa pública.

    Exatamente porque, ao longo do Estado, tantos desperdiçam tanto dinheiro, é que um nome distinto da cultura nacional deveria diferenciar-se.

  • gil lopes, 30 de março de 2011 @ 20:44 Reply

    Mas conteúdo estrangeiro ninguém fala…as brigas, todas elas, são relacionadas ao conteúdo nacional…enquanto isso…

  • Rafael, 30 de março de 2011 @ 23:20 Reply

    Prezado Odilon, não concordo com você.

    Por simples razões:

    1) a lei Rouanet é renúncia fiscal; dinheiro público que deve ser bem fiscalizado, principalmente pela população. Remuneração mensal de R$ 50.000 para uma pessoa deve ser mesmo denunciada e combatida porque não se justifica. Se nem a presidente da república ganha isso porque qualquer outro cidadão teria esse benefício? Se a lei não coíbe isso há uma distorção. Se o parecerista do MinC permite que um orçamento deste porte seja aprovado sem revisão há uma flagrante incompetência ou, como você disse, prevaricação. Se o proponente segue adiante, sem pudor, há um oportunismo enorme. Sem milongas, Odilon, vc concorda em pagar com dinheiro público um salário mensal de R$ 50.000 ? Sim ou Não?

    2) a Maria Bethânia é uma cidadã como qualquer outra ou outro. Nada devemos a ela além do respeito e da admiração que temos por uma artista sensível com uma bela voz. Há muitas cantoras assim no Brasil, historicamente com a mesma importância dela. Mas a partir do momento que ela se propõe a ganhar R$ 50.000 de dinheiro público, o respeito e a admiração são substituídos por sentimentos opostos, igualmente legítimos. Bethânia pode ter o direito, que uma lei distorcida lhe dá, mas não tem imunidade para fazer o que quiser com o dinheiro de renúncia fiscal. Nem ela, nem nenhum cidadão. Ou vc concorda com as barbaridades que os corruptos do legislativo, do executivo, do judiciário e do mercado fazem com o amparo das leis?

    3) essa consagração que se faz de artistas como os Veloso é quase uma coisa do passado. Tipos cultivados ou que se auto-cultivam como monstros sagrados, divas e outras bobagens estão ficando à margem. Um outro protagonismo se manifesta na comunicação de massa e também nas manifestações culturais com amparo estatal. O fenômeno dos Pontos de Cultura está nos mostrando isso. O escândalo promovido pela Maria Bethânia expõs muita coisa podre, como por exemplo, o caráter duvidoso e truculento de Caetano Veloso e Jorge Furtado. Pisaram na bola. Não precisavam, mas quiseram mamar silenciosamente nas tetas do Estado e se deram mal. Agora berram, tal como berraram Malufs, Jaders e outros tantos. Odilon, acho sua posição um equívoco.

    Saudações democráticas.

  • Wellington R. Costa, 31 de março de 2011 @ 0:48 Reply

    Ponderemos:
    O artigo de Odilon Wagner (Apresentado em Cultura e Mercado) é lúcido por nos fazer notar o embrião de como estamos sendo manipulados ate mesmo com o uso de algumas verdades como o adensamento de projetos na região sudeste (verdade), mas que traduz a quantidade esmagadora de artistas de todas as regiões que buscam seu lugar ao sol no cenário nacional e se deslocam para o Sudeste do Brasil, se alguém acha isso indevido não deve atacar as leis de incentivo e os programas de fomento ou qualquer iniciativa que não tente fingir ser democráticas (fazendo uma divisão por estado das verbas ou vagas) quando na verdade não trata todos de modo igual e sim os regionaliza de modo equivocado, pois tais regionalismos não atendem a realidade da distribuição populacional… Se as preocupação fosse seria deveriam atacar outras leis; como aquela que fala que artistas de teatro e cinema para ser considerados profissionais são obrigados a abandonarem os locais onde moram e já atuam e se dirigirem aos grandes centros, principalmente na região sudeste onde conseguem obter ou comprarem os carimbos que os considera profissionais; carimbo estes que às vezes são provisórios (ou seja, provisoriamente alguém é considerado profissional depois de pagar uma taxa e um ano depois se desejar ser considerado novamente profissional paga outra taxa ou segue outros ritos da alegada profissionalização) um verdadeiro escândalo, mas por atender certos cartórios culturais ligados a políticos ninguém comenta ou combate tais desvios.
    Sem duvida alguma há algo atrás dos ataques constantes a Lei Rouanet… Aqui e ali vemos políticos querendo intervir nas leis de incentivo fiscal (exemplo parte da bancada evangélica de certos clubinhos de políticos querendo os recursos da cultura para seus pastores, fato este muito combatido pelo setor cultural)…
    Mas sejamos realistas há sim uma concentração de projetos em certas regiões do Brasil, mas tal acompanha o percentual populacional de tais regiões e poucos se dão conta deste fato. Tomemos por exemplo a região sudeste que atraiu e atraem artistas de todo o Brasil para seus Teatros, empresas de TVs, galerias, museus, teatros de danças, empresas produtores, publico que prestigiam eventos… Verbas estaduais mais elevadas… Mas nada disso é dito ou avaliado por imperar o conceito pseudo democrático da divisão das verbas pelo numero de Estados que muitos desejam… Mas vejamos os resultados práticos disso: Alguns concursos nacionais que disponibilizam a mesma quantidade numérica de verbas (dividida igualmente entre os vários estados) para setores artísticos abrem inscrições e para digamos 10 vagas para cada estado e vemos na região sudeste mais de 600 inscrições concorrendo a 10 vagas , da região norte umas 2 inscrições para 10 vagas (há um remanejamento de verbas ou as verbas que seriam dedicadas a 8 vagas não são pagas e os recursos direcionados a outras coisas ou indivíduos), ou … Ou seja, a crueldade que esta dita e aparente democracia gera para as artes e cultura é inadmissível e poderia gerar até os desvios das poucas verbas que possuímos para outras atividades, setores ou interesses.
    O Brasil é grande e possui projetos, artistas e enfoques culturais fantásticos e detentores de qualidade em todas as regiões, mas a quantidade em cada região é proporcional a densidade populacional… ou seja, se um projeto é de qualidade ele será superior a outro independente da região na qual seja proposto e não há necessidade de protecionismos tolos como alguns pretendem , pois tais imbecis protecionismos gerar anormalidades nas quais o publico consumidor dos projetos culturais fiquem ainda mais desassistidos do que se encontram, quase sendo castigados por viverem em locais onde haja adensamentos populacionais. Isso não atende a democracia, atende sim interesses poliqueiros outros.
    Wellington R Costa

  • Antonia, 31 de março de 2011 @ 8:47 Reply

    Nao fala bobagem

  • Gilson Oliveira, 31 de março de 2011 @ 8:52 Reply

    A tramitação do projeto do blog de Maria Bethânia não é ilegal, é imoral. Comparar os custos de uma produção audiovisual para internet com a produção cinematográfica tradicional é no mínimo um equívoco, são duas linguagens distintas, seria como comparar os custos da produção de um espetáculo de teatro com uma novela, por exemplo. Esse entendimento deveria estar no cerne da proposição e da análise do projeto.

    A “insurgência” à Lei Rouanet caro Odilon, dá-se por que trabalhamos com Cultura, não com fabricação de tecidos ou geladeiras, ainda que a militância cultural junto a comunidades tradicionais, na defesa do patrimônio imaterial, na defesa da diversidade cultural, dentre tantas outras bandeiras tremuladas por agentes da cultura brasileira, nos coloca atuando em diversas frentes do estado, inclusive nas discussões do protecionismo a certos grupos econômicos que veja só, também são grandes financiadores da cultura através do mecenato, ou a famosa cortesia com o chapéu alheio.

    Que a Lei Rouanet deve ser revista isso é fato, seu modelo é distorcivo sim, reproduz uma lógica de concentração de renda do mercado tradicional, a mesma que é responsável pela secular desigualdade social brasileira. Reformar apenas a Rouanet resolve? Não, claro que não, há uma série de medidas legais, estruturais, burocráticas complementares para que o quadro mude e traga uma distribuição equânime de recursos e oportunidades. O Sudeste continuaria recebendo a maior parcela de recursos? Sim claro que sim, a maior fatia do PIB está lá é natural que seja assim, agora o difícil é concordar que o imposto pago pela riqueza gerada no interior de Goiás por exemplo, seja integralmente gasto numa ópera em São Paulo, sem que nenhum centavo desse recuso seja investido em sua cidade de origem. Isso significa que não gosto de Ópera? Claro que não, não gosto do mecanismo que gera essa distorção.

  • Pedro Henrique Gomes, 31 de março de 2011 @ 10:24 Reply

    “…Lei Rouanet, que mesmo com suas falhas, trouxe benefícios extraordinários para a cultura brasileira.”

    Um pouco inocente demais, não é mesmo Odilon?

    Ok, trouxe benefícios. Aí as falhas a gente assume na boa, já que, “se de 10 pessoas, só 3 passam fome, tá bom, né”?

  • ODILON WAGNER, 31 de março de 2011 @ 13:41 Reply

    Caros amigos,
    desculpem a demora em responder os comentários, uma gripe forte me derrubou. Queria apenas fazer algumas considerações.
    Falar da Lei Rouanet e suas implicações é muito complexo, porque envolve vários aspectos, como sua gestão, seus resultados, aspectos legais etc. Quero deixar claro que, acho sim, que a lei tem que ser reformada e atualizada para que as distorções que ela provocou nesses anos de vida possam ser corrigidas. Porém, é inegável o papel que ela teve no desenvolvimento da produção cultural nos últimos 10 anos. Basta uma breve pesquisa no banco de dados do MinC para se ter a idéia da quantidade de projetos maravilhosos que foram realizados nesse período. Pesquisa recente referente aos 7 ultimos anos, na área teatral, por exemplo, mostra que os recursos foram distribuidos de uma maneira bem equilibrada, aproximadamente 50% para produções independentes e outros 50% para grupos de repertório, festivais variados, etc. Não é a toa, qua a Cooperativa Paulista de Teatro aparece entre os 10 maiores proponentes da Lei Rouanet, em volume de projetos. Não podemos jogar isso no lixo.
    As distorções da Rouanet surgiram, porque seus mecanismos nunca funcionaram adequadamente (Gestão), o FNC que é parte da Lei Rouanet nunca cumpriu seu papel de “corrigir distorções do Mecenato” e distribuir recursos por todo país, fomentando atividades culturais. O Fundo foi criado pra isso e o que vimos em sua história, é que ele concentrou seus recursos ainda mais no Sul/Sudeste. No FNC o ministro não precisa pedir a benção para ninguém, ele decide como gerir. Portanto podemos concluir que: Ou não houve vontade poítica, ou os recursos foram desviados para custeio do MinC, ou não havia políticas públicas para a cultura. O FNC sempre teve recursos e sua aplicação nem sempre foi transparente. (Apesar do orçamento do MinC ser ridiculamente pequeno, no ano passado o ministério não conseguiu executá-lo por completo e devolveu recursos para União! Pra mim isso tem uma só explicação. Falta de políticas Públicas)

    Ainda em relação ao meu artigo, creio que há sim uma campanha difamatória da Lei Rouanet, mas também a classe artística, que é sempre retratada como usurpadores do dinheiro público, com informações falsas e de má fé. No projeto poético da Bethânia a única coisa inadequada era a solicitação do valor de sua remuneração, R$ 50 mil por mês. A Lei não permite isso. Mas o que não foi publicado e pesquisado pela mídia, É QUE A CNIC NÃO APROVOU ESSES VALORES, mostrando que a Lei tem critérios e estão sendo observados. O que se espalhou pela mídia, foi o valor de remuneração que constava do projeto apresentado, mas não o que foi aprovado. Curiosamente quem revelou esse fato, foi a Revista Veja dessa semana, numa reportagem que denigre ainda mais a imagem dos artistas brasileiros.
    Creio amigos, que temos de estar atentos.
    abraços
    Odilon

  • Paulo Silva, 31 de março de 2011 @ 16:47 Reply

    Parabéns Odilon!
    Extremamente lúcido é pertinente o seu artigo.
    A fúria dos caluniadores da Ministra é mesmo essencialmente ideológica e visa dividir o movimento cultural e os brasileiros em geral, em relação ao que seja uma política cultural brasileira,voltada para o progresso e o desenvolvimento do país.
    Esse furor contra artistas consagrados, na verdade é um furor contra a nossa cultura, já que são imprescindíveis. São eles e elas que contribuem enormemente para reforçar a identidade nacional , favorecendo a unidade do país. É esse senso de nacionalidade, de unidade, que os exaltados ideólogos, atrelados a teorias formuladas em e para outros contextos econômicos e sociais,almejam destruir.
    Nada é por acaso.Trata-se de um movimento orquestrado e com finalidades políticas bem claras.
    Acabou-se o tempo da inocência em relação a esse esparramo fora de propósito contra a brava e lúcida Ana de Hollanda.Muitos já começam a compreender a grande inteligência e preparo que ela possui e que fará dela uma grande Ministra da Cultura.
    Todo o apoio à Ana de Hollanda que vem conduzindo com sapiência e tranquilidade a sua gestão!

  • Neuza Fernandes, 31 de março de 2011 @ 21:51 Reply

    Odilon Wagner nos brinda com um excelente artigo,que honra o necessário debate sobre as múltiplas questões culturais,que a atual administração do MinC, com transparência,abre no país. Nós todos que amamos a cultura brasileira,queremos que esse debate seja sério e profundo e verdadeiramente democrático.
    Cultura é Pátria,necessário que suas questões sejam analisadas com os devidos respeito e seriedade.
    O debate estava se barateando pelo ódio, a intriga e a evidente inveja que grupos minoritários estavam querendo impor.Esses grupos quiseram impor uma pauta falsa e mentirosa ao debate cultural, que deve ser permanente,dando ênfase a questões irrisórias e extremamente discutíveis, como, por exemplo, essa “obrigatoriedade” de vinculação do Portal do MinC ao Creative Commons.Que indivíduos ou empresas privadas queiram partir para essa vinculação é um direito deles e delas. Mas a um órgão público como o MinC não cabe essa vinculação, que é visivelmente um interesse de grupos privados.Temos em nosso país leis que permitem, com toda segurança, definir a política de compartilhamento que é justo e prudente adotar, num portal dessa natureza.
    Cumprimentos ao Odilon, que trouxe ao debate sua visão equilibrada e competente sobre aspectos muito importantes, que merecem ter soluções encaminhadas em caráter prioritário.

  • jair Alves, 31 de março de 2011 @ 23:35 Reply

    Odilon,

    Estou respondendo ao seu artigo, nem me preocupando com o seu comentário logo abaixo. Vou falar de forma direta e franca, esperando que não fuja de debates futuros. Sua presença pode ser decisiva, depende mesmo é de sua disposição. Senão, vejamos:

    Sou absolutamente contra esse truque, desconstrutivo, com que a questão arte & cultura é discutida. Surpreendo-me, às vezes, ao ler que determinados personagens que povoam as páginas dos jornais e principalmente a blogsfera digam que atuam no meio cultural há mais de trinta anos. Caramba meu, onde estavam essas pessoas, no auge do confronto artistas e ditadura? Nem falo isso, em nome daquele orgulho provinciano, “eu estava lá, brigando e vocês?”. Nada disso. Falo que a Ditadura e seus beneficiários tinham um projeto, e os artistas mais engajados pensavam outro. Veja só o surgimento da FUNARTE um projeto da filha do Geisel! A essência dessa diferença era demonstrada nos palcos, na qualidade das músicas, das peças teatrais e dos livros. Ópera do Malandro seria impensável nos dias de hoje, sem a participação do dinheiro público. Diga-se, é impensável até com dinheiro público.

    Está faltando sinceridade, informação e, ao mesmo tempo, que sobra gana para avançar no pescoço do oponente (???). Por quê isso?

    Você me disse, antes de ler seu texto, que Fúria Ideológica era uma contestação a Noblat na sua performance contra Maria Bethânia. Não li assim. Li uma preocupação maior de sua parte, ao firmar posição de coisas que você considera imutáveis. Você teve grande oportunidade efetiva até o ano de 2009 de liderar um movimento contra as malvadezas de Juca Ferreira, mas acho que se perdeu na expectativa de um resultado eleitoral diferente. Você dançou ali, todos dançamos.

    O que pensa hoje, efetivamente, o empresariado artístico? Seria de grande valia se conseguisse demonstrar que Juca estava fazendo demagogia com um exército de descamisados, e que acabariam ficando sem nenhuma garantia de que o Paraíso estava próximo. Essa equação, Lei de Incentivo de um lado e FNC de outro é falsa. Você sabe que o empresariado artístico era um antes de Sarney, e depois foi outro. O empresariado que pensou a Lei de Incentivo, nada se parece com o artista produtor, como é o seu caso. Por que não explicitar isso, como também coisas mais prosaicas como a classificação do projeto de Maria Bethânia não ser Lei Rouanet e, sim, Lei do Audiovisual?

    Longe de mim chamá-lo de narcisista, mas acho que você entrou no narcisismo de Juca Ferreira. Hoje, se você procurar aliados vai encontrar. E que tremam os aventureiros. É preciso desenvolver o mercado de trabalho sim, afinal. Qual é o maior trunfo desse governo? Orgulho de ter aumentado o número de empregos formais. Onde é que a política nefasta de Gilberto & Ferreira garante maior empregabilidade? Eu não vi, você viu?

  • gil lopes, 1 de abril de 2011 @ 10:55 Reply

    E tem a sutileza do ambiente da Cultura, não se trata de construção civil. Incentivar a produção de poesia em língua portuguesa interpretada por uma diva nacional, cujo conteúdo é direcionado para um novo meio de circulação é uma coisa, outra coisa é trazer a Broadway pra cá com 100% de isenção. Ambos empregam, mas e aí? Temos que ampliar a discussão para o conteúdo, para o critério de avaliação de conteúdo também. Um projeto de Choro não pode ter a mesma avaliação de incentivo que um festival de música estrangeira. Quando o Banco do Brasil patrocina Amy Winehouse com isenção fiscal parece uma coisa natural, mas não deveria ser. Subsidiar as apresentações nacionais de Caetano Veloso não é a mesma coisa que fazer Amy Winehouse ou SWU, é diferente, culturalmente é diferente e o país precisa avaliar essas coisas também. Sem preconceitos mas com realismo.

  • armando, 3 de abril de 2011 @ 16:48 Reply

    Parabéns, Odilon!
    Concordo com sua análise. A patrulha é pesada, você continuará pagando um um preço bem alto por defender a cultura do Brasil.

  • Bruno Cava, 4 de abril de 2011 @ 10:29 Reply

    As pessoas não são bobas, hoje menos ainda com as redes sociais.

    Toda a vez em que esse MinC reacionário pisar na bola, e for injusto e virulento com a população e o movimento cultural que elegeram Dilma, pode ter certeza que haverá muita batucada, muito protesto, muita pressão.

    A ministra até acha que pode desprezar isso, “podem falar o que quiserem”, mas o governo certamente não pode se dar ao luxo de perder as bases populares que o sustentam. Especialmente quando das campanhas golpistas que certamente virão, como ensina a história do governo Lula.

  • Fabio Cesnik, 4 de abril de 2011 @ 12:07 Reply

    Caro Odilon
    Concordo com seu artigo. Mandei um nessa direção pro Globo dessa semana… deve sair em breve. Abraços, Fabio

  • Paulo Morais, 4 de abril de 2011 @ 13:48 Reply

    “(…) mas também a classe artística, que é sempre retratada como usurpadores do dinheiro público (…)”

    Artistas globais, eruditos e das “altas artes” adoram se auto-referir como “classe artística”, como se as companhias de teatro do interior do Tocantins ou os mestres de Folia de Reis do Norte de Minas também não o fossem. Quando fazem essa discriminação, os “grandes” artistas se postam como vítimas de um discurso teoricamente maquiavélico do Juca Ferreira.

    Ora, o MinC não inventou essas estatísticas da Lei Rouanet porcaria nenhuma! Elas estão mais do que claras, basta acompanhar a movimentação de projetos aprovados e captados. Se não concorda com os números, que se prove o contrário! Convoque a tão especial “classe artística”, o Dieese, o IBGE, quem quer que seja, a estabelecer estatísticas que provem que os recursos do mecenato não são concentrados e não atendem a meia dúzia de agentes especializados em angariar recursos no mercado viciado das grandes empresas.

    Para todo mundo sair ganhando, é evidente que alguns poucos terão que sair perdendo. E esse chilique de artistas consagrados, como Caetano, Jorge Furtado e agora Odilon Wagner é um sintoma de que a reforma está no caminho certo.

  • Manoel J de Souza Neto, 5 de abril de 2011 @ 15:06 Reply

    Odilon é triste perceber que este culto ao mito nos leva a destruição da verdadeira cultura. Os Ícones e medalhões que você defende seriam responsáveis por 5% do PIB, na verdade são apenas responsáveis pela manutenção do modelo do monopólio internacional do entretenimento de áudio visual e indústria fonográfica.
    A música dos medalhões na maioria dos casos sequer pertence a editores e empresas brasileiras. A onda reacionária que tomou o Brasil na defesa destes ícones que agora defendem suas verbas, direitos autorais, jabá e direito ao monopólio baseados em sua magnânima superioridade cultural e artística “genial” me lembram algo antiquado como o conceito do filosofo Kant que tratou do espírito criativo, do gênio, como um encontro com o divino (no século XIX). Ignora quem acredita nisso que a cultura é o manifesto do coletivo e que a arte é um fenômeno burguês da indústria que valora (com imposição de signos) as obras com intenção de obtenção de lucro.
    Mas o mais cruel destes discursos reacionário que nos envergonha quando vemos alguns artistas na defesa do famigerado ECAD é que a defesa de seus direitos é contra os direitos do povo, dos consumidores e dos demais artistas.
    Nunca é colocada a mesa a verdade, de que a música independente é responsável hoje pela maioria dos lançamentos (mais de 90%) e que o mercado informal e independente é responsável pela maioria da economia da música (mais de 60%) e não apenas os medalhões.
    Toda tentativa de impedir a circulação de música na internet, manter o modelo velho de direitos autorais, de reforçar os direitos de autor, de distribuir fortunas sempre para os mesmos, não operam no sentido de defender os autores (342.000 filiados segundo Glória Braga do ECAD), mas de defender apenas alguns destes, justamente os medalhões.
    Portanto o conflito, que alguns ignorantes tentam afirmar ser contra a Ministra, contra a Dilma, contra os medalhões, ou em favor das telefônicas ou empresas de difusão de conteúdo na internet, na verdade é um conflito que clama pela liberdade e autonomia regulatória dos autores ante aos monopólios e pela direito constitucional da população ao acesso a cultura, portanto um conflito entre interesses econômicos de elites contra os interesses gerais.
    Desculpe os gênios não são tão gênios assim, mas com certeza os monopólios são oligarquias… Não podemos mais aceitar o monopólio da política, dos sobrenomes, dos departamentos de marketing, das empresas de comunicação…
    Dilma!!! Cadê a revolucionária Maoista??? Venha nos salvar destes imperialistas! Rsssss…
    Brincadeiras à parte, vamos admitir não tem revolução! Não no quesito cultural, mas sim revolução da burguesia industrial se adaptando aos novos meios de produção virtual para impedir o avanço dos novos concorrentes, sejam as teles, o governo, os independentes, ou próprio povo (que de usuário passou a categoria de criminoso porque baixou uma música na internet)… aqui o povão é criminalizado, mas 1 milhão e 300 mil pra Blog da Bethania aqui não é crime, mas lá no Irã dava apedrejamento…
    Manoel J de Souza Neto (membro do Conselho Nacional de Políticas Culturais)

  • gil lopes, 6 de abril de 2011 @ 0:40 Reply

    A questão é a legitimidade desses interesses gerais, depende de quem fala por eles. Não dá pra abrir mão dos interesses de elites econômicas quando não são conflitantes com o desenvolvimento nacional. Ignorância é querer impedir a discussão das vantagens na adoção de políticas que grupos minoritários desqualificam. De resto, toda música é independente e deve circular na Internet e nos meios disponíveis, mas a música tem autoria e performance. Não queremos destruir a política, os sobrenomes, os departamentos de marketing, as empresas de comunicação e por fim, não queremos ser o Irã.

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