O Ministério da Cultura apresentou em cerimônia na sede da Fundação Casa de Rui Barbosa, na noite desta terça-feira (3/5), as Políticas de Estado para Música. No pacote de 24 estratégias e 42 ações, destacam-se a linha de crédito que disponibilizará R$ 100 milhões para micros e pequenos empreendimentos musicais, as novas regras que possibilitarão aos músicos brasileiros maior controle sobre seus direitos autorais no ambiente digital e o apoio do MinC à criação de uma agência federal específica para o setor.

Foto:  Libert SchmidtO ministro Juca Ferreira lembrou que a música é a mais internacionalizada das expressões artísticas brasileiras, a que mais divulga a língua portuguesa e a que possui maior potencial de crescimento econômico. Porém, falta uma atuação sistêmica do Estado que vise a modernização dessa cadeia produtiva, sem dirigismo estatal, processo semelhante ao que impulsionou o audiovisual nacional e permitiu que a produção de filmes de longa-metragem crescesse mais de 1500% nos últimos 14 anos.

De acordo com a Associação Brasileira dos Produtores de Disco (ABPD), o mercado de música gravada no país movimentou, em 2014, mais de R$ 580 milhões, com forte expansão em mídia digital: 22,4% no mesmo período. O mercado de trabalho do setor acumulou, nos últimos 10 anos, uma expansão de mais de 60% em empregos formais, abrangendo, sobretudo, a juventude: 39,5% dos músicos profissionais têm entre 18 e 35 anos.

Com o futuro da música diretamente ligado ao desenvolvimento da internet, o MinC tem como desafio buscar um sistema de proteção de direito autoral no ambiente digital mais equilibrado e justo, enfrentando as baixíssimas remunerações destinadas aos criadores musicais e a falta de transparência quanto ao controle da exploração das obras.

O secretário de Políticas Culturais do MinC, Guilherme Varella, destacou que a construção das Políticas de Estado para Música partiu de um diagnóstico que apontou questões cruciais a serem enfrentadas, como a concentração do mercado em poucas empresas; a verticalização da cadeia, com muitas etapas produtivas sendo realizadas pelo mesmo agente; a precariedade do sistema nacional de circulação e a baixa difusão da diversidade musical; a escassa integração de infraestruturas e circuitos locais e regionais; e pouca diversificação de mecanismos de financiamento. “A partir daí, estruturamos as políticas em quatro sistemas por meio dos quais vamos atacar todos os elos da cadeia da música: regulação, formação, financiamento e pesquisa”, explicou.

Cada um desses quatro sistemas tem um conjunto de estratégias e ações a serem desenvolvidas ao longo do tempo. No sistema regulação, estão previstas iniciativas para gestão e fiscalização de direitos autorais e aperfeiçoamento da legislação trabalhista e previdenciária. A esfera da formação preza tanto pelo ensino de música nas escolas como pela qualificação dos profissionais do setor. Já o financiamento vislumbra a criação de um ecossistema de mecanismos, ampliando o leque de recursos acessíveis para além dos tradicionais editais. No campo da pesquisa, as ações se destinam à promoção da inovação e do conhecimento do setor.

Direito Autoral – Durante a cerimônia, Juca Ferreira assinou duas instruções normativas visando possibilitar aos músicos brasileiros maior controle sobre seus direitos autorais no ambiente digital.

A primeira tem por objetivo garantir um correto cumprimento da obrigação legal de informar o repertório musical utilizado em obras e outras produções audiovisuais. De acordo com o diretor de Direitos Intelectuais (DDI) do MinC, Marcos Souza, a falta de organização dessas informações tem provocado a “exportação” indevida de recursos provenientes do direito autoral de obras brasileiras. “Quando uma produção nacional passa na TV por assinatura em um canal como FOX ou HBO, por exemplo, o direito autoral da música é recolhido e é enviado todo para o exterior pra ser distribuído lá, no país de origem do canal. Isso acontece – nas plataformas de vídeo on demand ou no cinema também – porque não havia regulamentação sobre como informar as músicas que estão inseridas em obras e produções audiovisuais”, explicou.

Agora, as fichas técnicas de obras audiovisuais deverão trazer claramente identificados todas as obras musicais e seus respectivos titulares nela inseridos. A Agência Nacional do Cinema (Ancine) complementará essa instrução com uma normativa própria, dispondo sobre exigências adicionais para a emissão do Certificado de Produto Brasileiro (CPB).

A segunda instrução normativa esclarece os conceitos da legislação brasileira aplicáveis à internet, possibilitando que entidades de gestão coletiva de direitos autorais atuem nesse ambiente, assim como já ocorre em diversos países do mundo. Esse reconhecimento permitirá aos criadores brasileiros exigirem informações e eventuais recursos diretamente de plataformas estrangeiras que disponibilizam música por meio de streaming. “Essas normativas são apenas um passo para dotar nossos criadores de instrumentos para que possam receber pela exploração de suas criações em qualquer tipo de tecnologia. Mas muito ainda precisa ser feita nesta seara, como a revisão de nossa lei de direitos autorais e a harmonização internacional do tema quando incidente no ambiente digital”, disse Souza.

Linha de crédito – O ministro do Trabalho e Previdência Social (MTPS), Miguel Rossetto, informou que a linha de crédito que disponibilizará R$ 100 milhões para micros e pequenos empreendimentos musicais poderá ser acessada a partir da próxima segunda-feira (9). “O mecanismo será operado pelo Banco do Brasil e poderá ser contratado por projetos de até 400 mil, com prazo máximo de financiamento de cinco anos, tendo dois anos de carência”, explicou.

Publicada pelo MTPS no Diário Oficial da União nesta terça-feira (clique aqui para ler), a linha de crédito foi criada em parceria com o MinC para diversificar as modalidades de financiamento para empreendimentos musicais. Com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), a linha se destina a pessoas jurídicas e microempreendedores individuais (MEI) do campo musical com faturamento bruto anual de até R$ 3,6 milhões.

Os financiamentos contratados no âmbito do FAT Cultura terão encargos financeiros anuais calculados pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) acrescidos de 5%, o que atualmente representa juro de cerca de 12,5% ao ano, taxa consideravelmente abaixo da média de mercado.

De acordo com o ministro, a linha de crédito permitirá o financiamento de praticamente todos os itens que envolvem a cadeia da música. Só estão vedados financiamentos para compra de imóveis, terrenos ou para buscar capital de giro para pagar dívidas contraídas anteriormente.

Polêmica – Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas José Roberto Afonso, especialista em contas públicas, criticou a concessão de empréstimos com recursos do FAT. “O FAT está deficitário. O que se gasta com seguro-desemprego, abono salarial e programas de treinamento supera a arrecadação. O Tesouro é que cobre o déficit”, explicou.

Em resposta, o MinC disse que o FAT é “um fundo equilibrado, e o recurso é sempre direcionado a beneficiar os trabalhadores, como é o caso do FAT Cultura. A grande preocupação do fundo é com relação às desonerações que impactam na receita do fundo”.


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