Em linguagem de conversa de bar, jornalista da TVE reúne em livro nove anos de artigos de jornal e pesquisas acadêmicas sobre a relação conflituosa entre MPB e televisãoPor Sílvio Crespo
14/05/2003
De fato, o jeito particular de levar a vida dos ?emepebistas? e de seus ouvintes parece não combinar com o linguajar pesado exigido pelo rigor acadêmico. O que não impede que a nossa MPB seja ouvida e debatida com a mesma seriedade no boteco e na academia.
No livro ?Sobre cultura e mídia?, o jornalista Roberto Moura, da TVE do Rio de Janeiro e do jornal Tribuna da Imprensa, reuniu artigos publicados ao longo de nove anos, em jornais e revistas acadêmicas, discutindo a tensa relação entre a cultura brasileira e os meios de comunicação de massa, utilizando uma linguagem que, como afirmou Nelson Hoineff, diretor de TV e editor-executivo do Jornal do Brasil, tem o “ritmo cadenciado das conversas gostosas das mesas de bar”.
Livro
Sobre Cultura e Mídia
Autor: Roberto M. Moura
Editora Irmãos VitalePreço: R$ 35,00 ? 203 páginas
Leia abaixo entrevista com Roberto Moura.
Como você selecionou os textos para o livro?
Nos últimos nove anos, escrevi vários textos que demonstram a minha indignação com a relação à mídia eletrônica e a cultura brasileira. Percebi que a cultura brasileira estava extremamente prejudicada por uma mídia perversa. Quanto mais eu ando por New York, Paris, Buenos Aires, vejo o respeito que a nossa cultura tem no exterior. Aqui, a gente liga o rádio e a TV e só tem estupidez. Não é só a burrice que manda na programação. É sacanagem. Fui escrevendo para diversos congressos e fui tentando mostrar objetivamente o que vinha acontecendo.Eu havia escrito um livro a pedido da embaixada do Brasil em Buenos Aires, chamado MPB ? Caminhos da arte brasileira mais reconhecida no mundo. Ele foi lançado primeiro na Argentina, Chile e Paraguai para depois ser lançado no Brasil.
Como você vê a evolução do espaço da MPB na mídia brasileira ao longo das últimas décadas? Por que a MPB consegue mais espaço lá fora?
Primeiro, é indispensável definir de que MPB estamos falando. A televisão continua programando Zezé di Camargo e Luciano, Só Pra Contrariar, Lacraia. O rádio aí está, inclusive com duas emissoras, a Cidade e a Fluminense, explícita e exclusivamente devotadas ao rock. E, o mais lastimável, é a pusilânime submissão da mídia impressa, que vem sendo pautada por interesses que podem até ser televisivos (na maioria das vezes, nem isso), mas musicais e jornalísticos não são.
Porque o “arranjo” TV e música não vinga?
A TV vem interferindo negativamente no produto musical brasileiro há anos. Por falar em arranjo, música que pretende brecha em novela e tocar no rádio não pode ter introdução de mais de dez segundos, não pode ter solo instrumental no meio – e tudo isso tem a ver com a sintaxe televisiva. Mas, respondendo objetivamente à sua pergunta: primeiro, porque os músicos não se organizaram corporativamente para reivindicar mais presença – tanto junto às emissoras como junto ao governo; segundo, porque o governo brasileiro faz o possível e o impossível para não mexer nessa casa de marimbondo chamada televisão.
Quais são os erros e acertos da mídia brasileira com relação à programação cultural?
Os erros mais grosseiros estão no horário nobre das TVs abertas, evangélicas aí incluídas. Os poucos acertos, quando não vêm das tevês educativas, vêm dos canais por assinatura e/ou em horários alternativos. É possível imaginar cinismo maior que o anúncio da Record, dizendo que o programa do Leão só vai começar “depois da novela”?
A grande indústria fonográfica atuante no Brasil combina com música de qualidade ou esse seria papel das gravadoras independentes?
Já combinou. Hoje, por causa da crise mundial do setor, as grandes gravadoras não arriscam nada. Os alternativos, por absoluta falta de alternativa, são obrigados a segurar a barra e ousar. Vem da produção independente ou de selos pequenos o que de melhor a música brasileira tem produzido nos últimos anos.
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