Conheça as propostas de alguns estados da região nordeste, na terceira matéria da série com perfil e visão de políticas culturais dos secretários recém-empossados

Alagoas
Convidado pelo atual governador de Alagoas, Teotônio Vilela Filho, o biólogo e professor da Universidade Federal de Alagoas, Osvaldo Viegas, ao assumir a Secretaria Estadual de Cultura (Secult), já definiu suas principais metas para sua gestão: viabilizar o sistema estadual de cultura e reformular o conselho estadual do setor.

Para isso, o secretário, que esteve na direção do Sebrae Alagoas por oito anos, e é um dos idealizadores do “Jaraguá Cultura e Negócios”, pretende contar com a participação de todos os setores envolvidos com a área cultural. “A Secult tem de funcionar como o cérebro desse sistema. Como órgão articulador e de implementação de política cultural, deixando de ser uma realizadora de eventos”, declarou em entrevista concedida ao jornal Tribuna de Alagoas.

Conhecedor das limitações orçamentárias da pasta, que atualmente possui um orçamento anual de R$ 4,5 milhões; e da responsabilidade em manter os oito equipamentos sob os cuidados da Secult —são três museus, dois memoriais, o Cenarte, a Biblioteca Pública e o Papódromo—, Viégas diz que vai buscar recursos por meio de editais disponibilizados pelo Governo Federal, prática que ele também pretende implementar na Secult.

“Vamos definir as prioridades para a locação de recursos da pasta. Tem de haver critérios, que não podem sair da cabeça do secretário. Vamos pensar a cultura de forma ampla. Ir descentralizando. Criando ações para que os próprios municípios conduzam suas políticas. Vamos seguir a mesma lógica a partir do Sistema Nacional de Cultura, que repassa projetos aos Estados e este por sua vez aos municípios. A Secult fica na articulação e a execução fica lá na ponta”, ressalta o secretário, que também promete para o final desse primeiro semestre a elaboração de conclusão de um plano, destinado à área, com ações até 2011.

O secretário afirmou também que vai reivindicar ao governo do Estado a implantação do percentual destinado à cultura, de 1% do orçamento estadual, determinado por lei. Caso tenha êxito, os recursos da secretaria vão saltar dos atuais R$ 4,5 milhões para 24 milhões. “Vamos lançar editais para apoio a eventos. Com isso, pretendo evitar influências. É preciso que todos tenham oportunidades de apresentar suas propostas. Vamos criar uma situação mais isenta”, adianta.

“Entre nossas metas estão: a apresentação ao MinC de projeto de modernização da Secult; viabilizar no Estado o Sistema Nacional de Bibliotecas; implantar o Núcleo de Audiovisual e criar várias frentes de trabalho, para que possamos construir nossa cultura de forma participativa”, acrescenta o secretário, nascido em Porto Alegre (RS) e residente de Maceió há 31 anos. E completa: “Buscar, ao máximo, recursos federais, verificar a possibilidade de recursos internacionais e trabalhar muito próximo à iniciativa privada”.

Alguns editais, como “Alagoas em Cena”, realizado em mais uma edição no final de 2006 e que premiou com recursos, projetos em várias áreas da cultura alagoana, deverão continuar em sua gestão, assim como, o projeto Núcleo de Audiovisual, que deve ser aperfeiçoado. Realizado em parceria com o Governo Federal, deverá se instalar no Museu da Imagem e do Som (Mis), em Jaraguá.

As Redes dos Pontos de Cultura, outra ação do governo federal, através do Ministério da Cultura (MinC), que tem viabilizado oficinas de arte para jovens de vários municípios alagoanos serão ampliadas. “Vamos implantar o Pontão no Cenarte e tentar ampliar as ações”, revela.

Bahia
Para o secretário do Estado de Cultura da Bahia, Márcio Meirelles, a Secretaria de Cultura deve descentralizar as políticas culturais, chegando a todos os municípios, além de buscar o intercâmbio com as outras regiões e países.

Para que essa descentralização aconteça, além do intercâmbio entre várias culturas, a secretaria está elaborando um Plano Estadual de Cultura, que contará com a realização de fóruns regionais no interior, culminando com a realização da II Conferência Estadual de Cultura ainda no primeiro semestre deste ano.

A proposta da Secretaria da Cultura é “descentralizar as políticas culturais e garantir o acesso à produção e consumo de cultura aos baianos em todos os municípios, dando visibilidade às produções culturais de todas as regiões”, afirmou a Superintendente de Cultura, Ângela Andrade.

Na região do Baixo Sul baiano, especificamente, está em processo de instalação a Câmara Setorial de Cultura, proposta pela Superintendente de Cultura, Ângela Andrade, e acatada pelos prefeitos da Associação dos Municípios do Baixo Sul, que reúne 11 municípios. No plano de ação da Secretaria Estadual de Cultura está em desenvolvimento um projeto integrado para a região com todas as instituições vinculadas (Irdeb, Fundação Pedro Calmon, Fundação Cultural e Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural) e com a participação da sociedade. Esse plano vai funcionar como piloto para as ações da Secretaria em outras regiões do Estado, em articulação com as outras secretarias e integradas com as diretrizes prioritárias do Governo Jaques Wagner.

“Vamos elaborar junto com a sociedade o programa piloto para essa região, valorizando sua diversidade cultural”, afirmou o Secretário Estadual de Cultura, Márcio Meirelles, em reunião na Secretaria Estadual de Cultura realizada na última segunda-feira, dia 22 de janeiro, com representantes do Conselho de Gás e Petróleo do Litoral da Bahia, que reúne empresas, representantes do Governo e de 49 municípios, através da Associação dos Municípios do Baixo Sul (Amubs) e da Associação dos Municípios da Região do Extremo Sul e Sudoeste (Amurc).

A proposta é que junto com o Conselho de Gás e Petróleo do Litoral da Bahia, a secretaria implante uma nova forma de gestão integrada para o desenvolvimento do Baixo Sul. Durante a reunião, o secretário sugeriu aos representantes do Conselho incluir a cultura nos seus planos de trabalho e aos prefeitos criar a Secretaria Municipal de Cultura, salientando que “a cultura é fomentadora e fortalecedora de identidades e também geradora de economia”.

O desafio apresentado pelo Conselho é fortalecer um plano integrado de trabalho para o desenvolvimento regional, a partir da chegada das concessionárias à região. Entre as primeiras ações definidas para este ano, o secretário executivo do Conselho, Fábio Góes anunciou “ações integradas relacionadas à cultura, qualificação profissional para a geração de trabalho e renda, cidadania, meio ambiente e consensos em tributação”.

Além disso, o secretário pretende criar uma parceria cultural com Salvador. “É impossível pensar a cultura da Bahia sem a participação de Salvador. É importante atuarmos em parceria para potencializar recursos, redimensionar o papel das instituições e, assim, cuidarmos melhor da cultura”, declarou Márcio Meirelles, durante visita ao prefeito de Salvador, João Henrique Carneiro, ocasião em que discutiram uma extensa pauta para a realização de trabalho conjunto.

O prefeito pretende com essa parceria colocar em primeiro plano o valor cultural da capital baiana. “É justamente esse valor cultural que caracteriza o seu povo e tanto tem projetado Salvador aos olhos do mundo”, ressaltou João Henrique.

A pauta principal da visita foi a proposta de realização conjunta do plano diretor para revitalização do Centro Histórico de Salvador. Meirelles explicou que é necessária uma força de todas as esferas de Governo para, junto com as representações sociais, empresarias, acadêmicas e de moradores, reorganizar o Centro Histórico de Salvador, onde vivem cerca de 13 mil pessoas, e buscar sua integração com a cidade.

O prefeito também sugeriu a parceria para revitalização dos fortes da cidade. Segundo ele, apesar de Salvador contar com 12 fortes, somente quatro estão recuperados, dentre eles, o Forte São Marcelo. Ele salientou que, junto com outros espaços culturais e até mesmo as estações de transbordo de passageiros, os fortes devem ser utilizados para fins culturais.

Além da parceria cultural com Salvador, a Secretaria de Cultura também vai atuar em parceria com a Prefeitura de Valença para dinamizar o centro cultural do município e promover uma gestão participativa da cultura na região, também através de fóruns regionais.

Para viabilizar essas e outras ações, a superintendente de Cultura, Ângela Andrade, e o prefeito de Valença, Cláudio Queiroz, acertaram em reunião no dia 16 de janeiro, a realização de um encontro em Valença, no início de fevereiro, com os artistas, produtores, empresários e representações sociais.

Com essa iniciativa a Secretaria e Prefeitura querem que o Centro Cultural de Valença passe a funcionar como “um pólo de referência voltado para formação e difusão cultural regional”. O prefeito de Valença, Cláudio Queiroz, fez questão de afirmar que está “à disposição da nova Secretaria de Cultura” para realizar parcerias também “para a criação do Conselho Municipal de Cultura e das leis do Fundo Municipal de Cultura, de patrimônio e também de incentivo à cultura”. Segundo ele, a cultura é uma das prioridades da sua gestão, junto com educação e saúde.

Segundo Ângela Andrade, essas parcerias com as Prefeituras visam “mobilizar os recursos no sentido de uma formulação conjunta de políticas públicas culturais para a área municipal, com definição de competências, complementaridade de ações e uma gestão compartilhada com a participação dos atores sociais”.

Além da dinamização do Centro Cultural, o prefeito de Valença solicita também apoio da Secretaria Estadual de Cultura, através da Fundação Pedro Calmon, para implantar uma biblioteca pública municipal e, através do Instituto do Patrimônio Artístico Cultural (Ipac) para continuar o trabalho de revitalização dos prédios da Praça da República e das ruínas da primeira indústria têxtil do país, além de desenvolver um programa de educação patrimonial.

Ceará
Convidado pelo governador do Estado do Ceará, Cid Gomes, o atual secretário do Estado de Cultura do Ceará, que é doutor em Filosofia e professor de filosofia e economia política da Universidade Estadual do Ceará, Francisco Auto Filho, pretende criar uma política cultural “democrática e republicana fundada nos princípios de que a cultura é um direito fundamental de cidadania e não uma simples atividade econômica, regida pelos imperativos do mercado”.

Em seu discurso de posse, o secretário ressaltou que nessa perspectiva, gestão cultural democrática significa que a secretaria priorizará o diálogo permanente com todas as instituições culturais e acadêmicas da sociedade, com o jornalismo cultural, e com personalidades artísticas, literárias e do campo da ciência. Auto quer também ouvir instituições, artistas, jornalistas, enfim, todos envolvidos com a Cultura no Estado do Ceará.

O secretário ressaltou ainda, que a secretaria terá como fundamento a “universalidade e transparência”, tendo como missão promover a cultura como princípio fundamental de valorização do homem, propondo e desenvolvendo políticas para a inclusão social através da cidadania cultural.

Entre as propostas do secretário, há um ambicioso programa ligado a leitura. Em um convênio com países como o Canadá, Auto pretende melhorar as bibliotecas públicas não só de Fortaleza, mas também de todo o Estado. Serão cerca de um milhão de livros para a Capital e 1,5 milhão destinados às bibliotecas do interior. Para implementação do programa, o secretário pretende investir no treinamento profissional, além da reforma das bibliotecas públicas, para que sejam capazes de armazenar adequadamente os livros.

“Queremos promover debates entre escritores e as comunidades sobre os livros mais lidos”, declarou o secretário em entrevista ao jornal Diário do Nordeste. Além disso, Auto pretende realizar a tradução de livros ainda não publicados no Brasil – alguns clássicos de Friedrich Engels e Marx, sem esquecer a publicação de teses de mestres e doutores de universidades do Ceará.

Ressaltando que sempre defendeu “a administração pública tem que ser transparente”, o secretário promete mudanças no processo de editais. “Na minha gestão tudo será transparente”. Para isso, o novo secretário está montando uma equipe de técnicos (advogados, administradores, contadores etc.) de sua confiança para que não surjam possíveis desvios. Além disso, será criada uma ouvidoria, que receberá críticas que serão enviadas tanto para ele quanto para o Governador Cid Gomes. Auto Filho promete, ainda, tornar públicos os relatórios da ouvidoria. Auto lembra que somente “amigos do rei” são bem tratados pelas instituições públicas. Para ele, todos são iguais numa República e ninguém em sua Pasta receberá tratamento diferenciado.

“Não podemos mais compactuar com projetos que beneficiem pequenos grupos”, declarou o secretário, que pretende voltar-se para a cultura do interior e para a cultura indígena da região, recuperando práticas hoje em extinção como os mamulengos, maracatus, reisados, entre outros.

Auto Filho também pretende realizar propostas culturais com o restante da América Latina. O secretário promete que a relação Ceará-America Latina, será mais intensa do que se pensa. Ele cogita inicialmente realizar um projeto ligado às artes plásticas. “O objetivo é buscar a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações”. Além disso, Auto Filho tem um ousado projeto: firmar convênio através da TVC, TV da Assembléia, televisões universitárias e as futuras tevês de Fortaleza e de Sobral com a Telesur, com sede na Venezuela, uma espécie de CNN da América Latina.

Reclamando dos elevados custos de manutenção do Centro Dragão do Mar de Arte Cultura, o secretário pretende estudar melhor a questão antes de propor alternativas, mas estuda a possibilidade de reativar o Instituto Dragão do Mar, importante instrumento de fomento para a formação de dramaturgos, atores e cineastas.

Projetos já firmados no Estado devem ser mantidos pelo secretário, porém pretende reestudá-los. Eventos como o Cine Ceara, festivais de música no Estado, entre outros projetos já firmados no calendário da cultura cearense, são acontecimentos que já se sustentam por si mesmos, não precisando de grandes investimentos públicos, por esse motivo, o secretário pretende também focar em outras carências culturais do Estado, com a reestruturação de teatros e cinemas do interior.

Outro ponto é com relação aos museus. O secretário também prometeu investir no setor. Para isso, pretende transformar cada estação rodoviária das cidades cearenses numa espécie de museu, num memorial ou num centro de convivência. O patrimônio histórico é outra preocupação, seja de Fortaleza ou de outras cidades do Estado.

Para conseguir recursos para realização de suas propostas, Auto Filho pretende chegar a 1% do Orçamento do Estado, meta jamais alcançada por nenhum outro secretário. Atualmente o orçamento da Secretária da Cultura gira em torno de 0,4% do orçamento do Ceará.

Carina Teixeira


editor

2Comentários

  • Julian Santos, 1 de fevereiro de 2007 @ 15:29 Reply

    Magnífica esta matéria de Carina Teixeira. Descreve as intensas atividades culturais desenvolvidas nos Estados do Nordeste, fatos raramente divulgados no Sudeste ou Sul de nosso país. Cultura e Mercado é um “must” e Carina Teixeira, uma jornalista de alto nível. Muito obrigado! Julian Santos, São Paulo, Capital.

  • Ana Carla Fonseca, 6 de fevereiro de 2007 @ 8:16 Reply

    Extremamente útil esse panorama das políticas públicas de cultura em nosso país. Um belo modo de observar como o governo está ou não reagindo a um tema tão crucial. Parabéns!

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