Terceiro evento local da série “Da democratização à digitalização das comunicações” foi marcado por um resgate da história de 15 anos do FNDC e da denúncia da forma como vem sendo conduzido o processo de digitalização das comunicações no Brasil

O seminário foi realizado no Plenarinho da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, no centro de Porto Alegre, em 9/5, e contou com a participação de mais de 50 pessoas. Na mesa, a representante da coordenação executiva do Fórum, Berenice Mendes, o representante do Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do RS, Giba Assis Brasil, e o representante da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Josué Lopes, mediados pela coordenadora do comitê pela democratização da comunicação do RS, Cláudia Cardoso.

Berenice abriu a noite resgatando um pouco da história da entidade: o movimento das Diretas Já e a percepção de que alguma coisa precisava ser feita com relação à forma de atuação dos meios de comunicação; a formação de uma Frente Parlamentar pela Democratização da Comunicação, em 1991, que culminou, em junho daquele ano, na formação do FNDC. Em 1994, o Fórum contava com o apoio de cerca de 300 entidades que trabalhavam fortemente pela aprovação da Lei do Cabo. O jornalista Daniel Herz foi lembrado por Berenice, pela sua atuação política decisiva para aprovação da Lei n° 8.977/95, que é também o ano em que o FNDC constitui-se juridicamente como uma associação civil.

Produção de conteúdo

A coordenadora do Fórum abriu os debates sobre a questão da digitalização comparando a possibilidade de se desenvolver um sistema próprio de TV digital tão importante para a soberania brasileira quanto o domínio do aço e do petróleo no século passado. Berenice falou que a digitalização proporciona uma mudança nos paradigmas, e que isto não pode ser esquecido. “É uma oportunidade única para promover a regulação do setor de telecomunicações, e esta discussão precisa ser feita antes da definição do padrão, se não corremos o risco de colocar um cadeado em uma fechadura arrombada”, disse.
“A discussão é muito importante porque sabemos que 80% da população é formada pela televisão”, acrescentou, lembrando que a produção de subjetividades dos brasileiros está diretamente relacionada ao que é veiculado na TV.

“Nós temos um País múltiplo, e no entanto, uma cara audiovisual uniforme”, disse o cineasta Giba Assis Brasil, que criticou o modelo de implantação da radiodifusão no Brasil, inspirado no norte-americano, mas que tornou-se privado e sem separação entre os processos de produção e transmissão do conteúdo audiovisual. “Temos um modelo único no mundo, em que as emissoras trabalham a maior parte do tempo em rede nacional”, disse Assis Brasil, argumentando que este modelo, além de inibir a veiculação de audiovisual local, acaba tornando as emissoras dependentes de grandes anunciantes.

“A Ancinav (Agência Nacional de Cinema e Audiovisual) foi o melhor projeto que já houve de regulação audiovisual e, no entanto, foi cassada pela grande mídia”, denunciou. “Houve uma avalanche de informações distorcidas e mentirosas a respeito do projeto do Ministério da Cultura, e a idéia ficou tão arraigada, que até hoje quando se fala nela saem bruxas do armário”, disse o realizador, que também é membro do Conselho Superior de Cinema. “A gente quer que a sociedade brasileira tenha uma maneira mais plural de colocar sua produção na rede, para isto é preciso salvaguardas”, disse o cineasta, defendendo a necessidade de regulação das comunicações.

Rádio digital

Josué Lopes centrou sua exposição sobre o processo de digitalização do rádio. “Muitos têm dito que é preciso primeiro definir a TV, que o rádio vem atrás. Mas isto não funciona”, disse ele, relatando que algumas emissoras comerciais já têm feito testes com a tecnologia norte-americana chamada Iboc, que custaria U$ 5 mil só em royalties para utilização do equipamento. “Este formato desconsidera as milhares de rádios comunitárias que existem hoje no Brasil, além das pequenas emissoras, que não terão chance de adquirir uma tecnologia tão cara quanto esta”, acrescentou. “É preciso que parem estes testes para primeiro discutir o que é melhor para o Brasil”, disse. Para o representante da Abraço, o ideal seria desenvolver um sistema que utilizasse os softwares livres como base. Da platéia, o professor da PUCRS, Osvaldo Biz, conclamou uma atitude com relação aos milhares de processos de outorgas de rádios comunitárias que se encontram parados em Brasília. “Ninguém pode ir no ouvido do presidente Lula e dizer que esta situação não pode continuar assim?”, indagou Biz. Berenice relatou que um mutirão foi montado logo no início do governo petista para acelerar o processo de outorga dos canais comunitários, mas que a situação não se alterou muito. “Não existe vontade política”, afirmou ela.

Júlia Pitthan


editor

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