Pela primeira vez em seus 70 anos, a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) fará, em maio, seleção no exterior para contratar instrumentistas. É o que informa reportagem do jornal Folha de S. Paulo publicada nesta quarta-feira (23/3). As sessões acontecerão em Londres, Nova York e no Rio. Há 13 vagas abertas – algumas há mais de dois anos -, mas o número de contratações é indefinido.
Desde janeiro, a OSB enfrenta uma crise por causa da decisão de avaliar seus músicos. Apenas 35 dos 82 instrumentistas compareceram às audições. Enquanto os músicos querem a suspensão das avaliações, a direção propõe a reabertura do plano de demissões voluntárias e sinaliza que aqueles que não participaram das avaliações serão dispensados. Em reunião nesta tarde no Ministério de Trabalho, as duas partes tentarão chegar a um acordo.
Em entrevista à Folha, Minczuk nega a fama de ríspido e diz que não pretende, por ora, levar a OSB ao exterior.
Folha – As audições de avaliação terminaram na segunda. Qual é o balanço final?
Roberto Minczuk – Dos 82 músicos que deveriam se apresentar, 35 vieram. Temos seis atestados médicos, então essas audições serão remarcadas. Fiquei surpreso. Desde o início, deixamos claro que o intuito não era demitir ninguém, mas dar “feedback” para os músicos e resolver questões da orquestra.
Quais?
A OSB não tem relatórios escritos de avaliações até 2006. A partir daí, temos registro de tudo. Sabemos que, antes, as audições eram feitas com certa informalidade, com repertório simplificado. Vários músicos nunca fizeram concurso para entrar na orquestra. Temos casos de posições chave, de solistas e até de spallas [o primeiro violino da orquestra] que nunca passaram por audição. Outra finalidade era dar oportunidade aos integrantes de ocupar categorias superiores. Tenho 13 posições abertas na orquestra há muito tempo. Vários músicos se candidataram a essas posições nas audições. Um de nossos violistas foi promovido após a avaliação.
Só com audições individuais é possível identificar exatamente a afinação de cada um, o vibrato [a oscilação da corda de um instrumento], a qualidade dos instrumentos de cada um… Percebemos que alguns precisam adquirir instrumentos de qualidade superior. Agora, com a remuneração entre as melhores do país, eles poderão fazer isso. É o que vai fazer a diferença do bom para o ótimo, do ótimo para o soberbo.
Os músicos se queixam de que o nível de exigência do repertório escolhido para as avaliações foi muito elevado.
O exigido é o “standard”, o que foi tocado nas últimas temporadas: Beethoven, Brahms… Além disso, pedi uma peça solo, que demonstra o conhecimento de estilo, sonoridade, afinação, coisas básicas, e uma peça de livre escolha. É o básico para qualquer bom músico em qualquer lugar. Tiveram dois meses, um de férias, outro de trabalho, em que a orquestra pagou para que se preparassem. Um bom músico, em minha opinião, prepara um repertório desses em três semanas. Estamos oferecendo salários de R$ 9,3 mil a R$ 11,3 mil. Vemos a Osesp crescendo, a orquestra de Minas crescendo. Como a OSB pode ficar acomodada? Teremos audições abertas em maio no Rio, em Nova York e em Londres. Já temos brasileiros que estudam ou atuam lá fora inscritos.
É a primeira vez que fazemos isso. Agora, com salários competitivos, conseguiremos até repatriar os nossos “Ronaldinhos”. No primeiro semestre, vamos completar a orquestra e, no segundo, quando passa a vigorar a nova remuneração, teremos mais ensaios, mais dedicação. Os ensaios serão de manhã e à tarde, coisa que a OSB nunca fez.
Como é atualmente a rotina da orquestra?
O máximo que a orquestra trabalha é até sete ensaios ou concertos por semana, cada um com no máximo três horas. Vamos passar a ter nove funções semanais, com ensaios à tarde como faz a Osesp e orquestras lá fora.
Isso vai exigir dedicação maior. Temos músicos que tocam em mais de uma orquestra. Cada um vai ter que tomar sua decisão.
O que vai acontecer com os músicos que faltaram?
Essa é uma questão administrativa, jurídica, que não cabe a mim.
Mas como diretor artístico, o que o senhor pode fazer?
O conselho vai decidir sobre essa questão. A partir daí, vamos ver como proceder artisticamente.
Será possível continuar a trabalhar com os músicos que se recusaram a ser avaliados?
É cedo para dizer. Temos que nos reunir, conversar. A questão foi levada à Justiça.
Como foi o desempenho dos que participaram?
Foram bem avaliados. Pretendo me reunir com cada um, fazer ajustes.
Os músicos se queixam de que o senhor é ríspido.
Gostaria que os ensaios fossem transmitidos pela internet. Isso acabaria com esse negócio de dizer que sou ríspido. Sou intenso, muito exigente, mas não sou ríspido. Sei exatamente como cada músico deve tocar.
Evidentemente, se uma pessoa comete o mesmo erro três, quatro vezes, mudo a forma como estou pedindo.
De zero a dez, que nota daria à orquestra?
Há aspectos técnicos, de emoção e de performance a serem levados em consideração. Seriam notas diferentes.
A orquestra tem muita garra, mas precisa aperfeiçoar afinação; é brilhante, mas tem que ser mais precisa tecnicamente. Há ainda variação de concerto a concerto. O que queremos é constância, uniformidade. Na temporada 2010, fizemos concertos excelentes, outros abaixo da expectativa.
O senhor teria confiança de levar a orquestra hoje para uma turnê no exterior?
Ainda não. Por isso precisamos passar pelo processo pelo qual estamos passando.
*Com informações da Folha de S. Paulo