A primeira reunião, da qual participei, deu-se em Roma. Um dos jurados, naturalmente brasileiro, afirmou algo assim: o prêmio é bom e necessário, mas sua simples existência, ainda mais em homenagem à língua portuguesa, sem falar no valor pecuniário, provocará urticárias no mundinho literário brasileiro. A mesma inflexão diminutiva foi empregada, na semana passada, por um articulista de jornal – não sei se era ironia dele ou conhecimento de causa.

babelClaro que a 3ª edição do Babel Book Award, segundo corre, idealizada para dar fôlego à literatura contemporânea de todos os países lusófonos, tinha que chegar tarde ao conhecimento geral desse planeta tão distante, o Brasil. No entanto, exatamente como previsto, a boataria das redes desabalou com o pedal no talo. A suspeição quanto aos objetivos do prêmio e até mesmo quanto à sua existência salpicou o coro dos desorientados. Daí para as suposições mais divertidas foi um salto vital.

No momento, a voz unânime brada que, veja bem, não se provar, mas tudo indicaria que o Babel Book Award não é real. Seria tudo tão suspeito… A cada lance, uma nova descoberta; a cada nova descoberta, o velho gozo. Seria mesmo receio ou desejo de que, na impossibilidade de vencê-lo, o prêmio não existisse? Suspeitas.

Como não sabem de que maneira poderia irromper no solo da grande arte esse prêmio para o qual não se foi convidado, fez-se necessária a formulação de hipóteses, das quais reproduzo três:

PERFORMANCE LITERÁRIA

Supõe-se que, por detrás do Babel Book Award, haveria uma pessoa ou um grupo contratando serviços, cooptando outras pessoas, apenas e tão-somente para, ao final, influir de algum modo no compêndio da literatura. Pessoalmente, se observasse de fora, descartaria de antemão essa hipótese. Ora, todos os prêmios seriam então performance! Calculem comigo: pela matemática dos conjuntos, se algo engloba o todo, este e aquele se equivalem.

ESCÁRNIO DE UM SONHO

Há quem cogite que a intenção do Babel Book Award seria a de iludir os romancistas. Aqui o raciocínio é simplório e deve ser afastado. Em nenhuma hipótese, eu teria participado em qualquer fase de um galardão que tivesse semelhante meta. Além disso, é da própria natureza dos concursos que participem, espontaneamente, aqueles que concordam com o regulamento, podendo ser frustradas ou contempladas as suas expectativas. A isso se soma mais essa verdade: que cada um é dono da própria ilusão.

ROUBO DE ORIGINAIS

Ganhando impulso inesperado, a boataria perdeu o controle, capotou e ficou nesse estado: Babel Book Award possibilitaria o roubo de originais de escritores brasileiros para venda no estrangeiro. Com o devido respeito, em que pesem os giros menos sutis, essa hipótese, por impossível, é que está absolutamente divorciada da realidade. Até as raposas menos letradas sabem que, na Europa ou em qualquer parte, ninguém quer saber de literatura brasileira contemporânea – nem mesmo no Brasil; não a querem nem de graça, que dirá roubada.

E o que resta como opção? Resta a realidade. E, vejam que sorte, o testemunho da realidade, esse está em meu poder dá-lo. Babel Book Award é um prêmio com acertos, imprecisões e mistérios – como, aliás, tudo no mundinho. O prêmio não só existe, mas também legará ao final o merecido descanso a muitas línguas. Portanto, espíritos aflitos, sabendo que andei distante, apresento-me exatamente como o boêmio: aqui me tens de regresso.

 

Antonio Salvador é escritor e PhD-Candidate em Direitos Culturais pela Humboldt-Universität zu Berlin. Escreve a coluna “O Coice” às segundas-feiras.

Berlim, segunda-feira, 05 de março de 2018.


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Escritor. PhD Candidate em Direitos Culturais pela Humboldt-Universität zu Berlin.

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