Na manhã de ontem, dia 04 de setembro, o ministro da Cultura, Juca Ferreira, participou do programa Bom dia Ministro, coordenado e produzido pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República e transmitido via satélite a rádios de todo País. Durante a entrevista, o ministro falou sobre as metas e desafios do MinC para os próximos anos.

Destacando o Programa Mais Cultura como principal estratégia do MinC para ampliar o acesso dos brasileiros à Cultura, o ministro ressaltou a necessidade de ampliação dos recursos orçamentários para a Cultura e das políticas de acessibilidade do governo, apresentando números da pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que revelam a realidade de exclusão de grande parte dos brasileiros aos bens e serviços culturais. “O estudo mostra que 87% da população nunca foi ao cinema, 92% nunca foi ao museu e 78% nunca foi a um espetáculo de dança. Isso é um escândalo, esses números caracterizam um verdadeiro apartheid no Brasil”, declarou.

Sobre a iniciativa, o ministro disse que o programa pode ser solicitado tanto pelo governo local – prefeituras –, como também por entidades não-governamentais. “O programa tem algumas prioridades, como por exemplo, alcançar as áreas onde os índices de violência e pobreza são altos e com baixos níveis de escolaridade e desenvolvimento humano. O programa vem basicamente para ampliar o acesso à Cultura. Nós priorizamos as populações com menor poder aquisitivo, que estão submetidas a situações degradantes de violência. Portanto, a solicitação deve estar dentro das condições sociais, porque é um programa de construção de igualdade e acessibilidade à Cultura”.

Juca destacou ainda que boa parte dos recursos do programa serão disponibilizados em parceria com os governos estaduais. “O Mais Cultura já está mapeando as áreas em que vamos trabalhar. Pretendemos dar acesso ao livro, instalar algumas bibliotecas e centros culturais de multiuso nas áreas populares e aumentar o número de Pontos de Cultura em todo o país”, informou.

O Mais Cultura é o maior programa em termos orçamentais do Ministério da Cultura e, até o final de 2010, pretende aplicar R$ 5 bilhões, entre recursos orçamentários e captados na ampliação do acesso a cultura. “Também queremos disponibilizar meios para que a população freqüente cinemas, teatros, espetáculos de dança. E tem uma novidade nessa mudança que estamos fazendo na Lei Rouanet: o programa Vale Cultura. É o primeiro programa de financiamento do consumo cultural. Em vez de financiar a produção de peças e filmes, o Vale Cultura financiará o consumo. O sistema é muito parecido com o vale-refeição. Ou seja, o trabalhador recebe um bônus que permite que ele compre livros ou vá ao cinema. Queremos estimular o consumo cultural. O dinheiro aplicado certamente terá um retorno importante porque vai dinamizar a economia cultural. O Vale Cultura vai reforçar o acesso a todos esses processos culturais que hoje estão restritos a uma parcela pequena da população”.

Ainda sobre as ações do programa Mais Cultura, o ministro citou a diminuição do número de municípios sem biblioteca. “Quando chegamos ao Ministério eram mais de mil. Reduzimos para 600. Esse ano há pouco mais de 300 e a gente espera para o máximo até o ano que vem não haver um município sequer sem, pelo menos, uma biblioteca no País. E a gente quer criar uma segunda geração de bibliotecas. Muitas delas são uma espécie de depósito de livros. Só se relacionam com quem já tem o livro no seu horizonte. Queremos que sejam verdadeiros centros culturais, que motivem a leitura. Queremos que vá até o potencial leitor e mostre os segredos do livro, o prazer de uma leitura bem-feita. E a experiência mundial é muito boa neste sentido. A Colômbia hoje é um exemplo de utilização deste novo conceito de biblioteca. Em geral, as bibliotecas têm que ser instaladas onde a população vive, para poder facilitar e estimular esse acesso”.

Já sobre o orçamento do Ministério da Cultura, o ministro destacou o aumento dos recursos desde 2003. “Nós melhoramos muito. Quando chegamos no MinC o orçamento era de R$ 300 milhões e agora passou para mais de R$ 1 bilhão. Crescemos mais de seis vezes, mas é pouco, muito pouco. Há uma necessidade de que essa responsabilidade do Estado brasileiro para com a cultura se manifeste de forma orçamentária. Somente a Lei Rouanet não é capaz de financiar o conjunto das manifestações culturais em todo o Brasil”. O ministro aproveitou a ocasião para mobilizar os artistas e a sociedade a se unir na busca de mais verbas para a cultura: “a responsabilidade de disponibilizar recursos para o acesso à cultura não é só tarefa do ministério, mas de todo o setor cultural”.

O ministro afirmou ainda que é um “ministro de continuidade”. “O presidente Lula, na solenidade de posse, afirmou que tinha me escolhido justamente para dar continuidade à administração do ministro Gilberto Gil. Encontramos um Ministério que não estava a altura da grandeza cultural do povo brasileiro. Não havia indicadores, não se trabalhava com o conceito de política pública, o Ministério não atuava por todo o território nacional e 90% dos recursos se concentravam em dois Estados. Nesses quase seis anos, trabalhamos para ampliar o acesso aos recursos do Ministério da Cultura. Já adotamos o edital como principal instrumento de disponibilização de recursos. Estamos trabalhando com um espectro bem mais amplo de cultura brasileira. Não trabalhamos só com arte, mas também com manifestações tradicionais, cultura dos povos indígenas, jogos eletrônicos, cultura digital. Assumimos o conjunto da produção simbólica brasileira. Isso, evidentemente, ampliou a atuação do Ministério”.

“Somos um ministério pequeno, mas estamos demandando mais recursos e estrutura. O presidente Lula, um dia após a minha posse, encaminhou um projeto de lei de reforço institucional do ministério. Estamos trabalhando para implementar uma política de Estado na área da cultura. Ou seja, temos que satisfazer as demandas e necessidades culturais, porque é uma necessidade básica. O ser humano, ao contrário de todos os outros animais, não se satisfaz apenas com as necessidades materiais, temos também as demandas de simbolização. Acesso à cultura é uma necessidade básica, além de ser um direito de todo brasileiro. Até o presidente Lula ser eleito, a cultura ainda não tinha sido tratada como deveria. Então, a minha preocupação não é a novidade, a diferenciação. Por outro lado, continuidade não é sinônimo de mesmice. Darei continuidade ao trabalho, mas terei novos desafios, como a reforma da Lei Rouanet, aprovação do Plano Nacional de Cultura, modernização do conceito de direito autoral no Brasil e o fortalecimento das políticas de arte”.

Sobre o fortalecimento da Fundação Nacional de Artes (Funarte), Juca Ferreira disse que é preciso reformular todas as políticas das artes. “Temos que investir no desenvolvimento de políticas para as linguagens artísticas e esse investimento terá de ser feito junto com o setor. Estou esperando só organizar a casa, que será em um prazo médio de dez dias, para então abrir um diálogo com toda a área cultural para discutirmos a Funarte que nós queremos.”

Já sobre a valorização dos nossos patrimônios culturais, Juca declarou que se empenhou pessoalmente, a pedido do ministro Gil, para chegar ao tombamento da capoeira. “Na realidade, não é um tombamento. O Instituo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) chama de registro no livro de tombos, pois é um patrimônio imaterial. Reconhecemos a capoeira como uma das principais manifestações culturais brasileiras por sua singularidade, riqueza e complexidade. Espontaneamente, sem nenhum apoio governamental, ela já está presente em mais de 150 países. Em pouco tempo, estará em todos os países membros das Nações Unidas. É um fato fantástico para a cultura brasileira. Esse reconhecimento por parte do Estado é muito importante, porque interrompe um processo de descriminação e estigmatização. A capoeira, até a década de 30, era proibida no Brasil. Getúlio Vargas foi o primeiro presidente a fazer uma sinalização positiva para a capoeira. A modalidade foi admitida, mas a partir de então o Estado alternou indiferença e repressão no tratamento da capoeira. Chegou-se a cogitar a transferência da responsabilidade da capoeira dos mestres para os professores de educação física, o que seria um erro monstruoso. Ela é uma demonstração cultural que tem várias dimensões – é esporte, arte marcial, dança e música. Só pode ser tratada em sua integralidade e os mestres são os depositários desse saber. A presença da capoeira no imaginário dos brasileiros não tinha uma correspondência no Estado, que era preconceituoso em relação a ela. Hoje, o Estado reconhece a importância da capoeira. Já disponibilizamos quase R$ 8 milhões, através de editais, para projetos em que ela é utilizada como instrumento de construção de auto-estima e de sentimento de pertencimento. Também é usada até no tratamento de pacientes com síndrome de Down. O reconhecimento da importância da capoeira é praticamente mundial. Só faltava o Estado brasileiro reconhecer também”.

Ao final da entrevista, o ministro Juca Ferreira respondeu aos jornalistas sobre o preconceito cultural em cidades interioranas. “A discriminação é regional, é por classe social, as manifestações culturais ligadas às camadas mais pobres da população dificilmente conseguem patrocinadores pela Lei Rouanet. Nós temos no interior do Piauí, na Serra da Capivara, um trabalho realizado por uma organização-não governamental reconhecido no mundo inteiro, o Parque Nacional Serra da Capivara, mas ninguém quer colocar dinheiro público ali por ser no interior do Piauí. Nós precisamos que o MinC tenha acesso a recursos orçamentários que não passem pela ‘boa vontade do investidor privado’ para aplicar na Cultura como um todo.”
Ainda sobre o assunto, o ministro declarou ainda que a diversidade cultural é reconhecida pelo MinC como um patrimônio brasileiro. “Cada região tem suas singularidades, que têm que ser respeitadas em uma política nacional de cultura. Para que a gente possa levar em consideração essa diversidade cultural, é necessário que os protagonistas culturais do Brasil inteiro se apresentem com seus projetos e propostas. O Ministério da Cultura não acredita na construção de políticas públicas dentro de gabinete. Temos trabalhado com sistemas de consulta, estimulado os fóruns para captar essa diversidade cultural. É preciso também qualificar os atores culturais, os gestores públicos e as estruturas municipais e estaduais de cultura. A gestão privada e as organizações não-governamentais têm também que passar por um processo de organização que satisfaça as demandas legais. Não podemos passar por cima das estruturas legais, porque se não teríamos problemas com o Tribunal de Contas da União. Então, é necessário elevar o padrão cultural do Brasil inteiro para que essa diversidade cultural seja atendida não só pelo governo federal, mas também pela estrutura pública em geral”.

O ministro finalizou a entrevista declarando: “Todo brasileiro é igual e tem direitos iguais. A Cultura é um direito, é uma necessidade de todo o brasileiro e o Estado tem obrigação de disponibilizar de maneira igualitária a todos”.


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