Analisado e debatido publicamente em dois encontros realizados em São Paulo no último final de semana, a proposta de substitutivo ao projeto do Procultura, elaborado pelo Deputado Pedro Eugênio (PT/PE), obteve uma inédita – e até pouco tempo impensável – aprovação unânime das lideranças e representantes de entidades da sociedade civil dos mais diversos setores da cultura que participaram do Seminário #Procultura, promovido pelo site Cultura e Mercado e pelo Cemec.

A proposta conta também com total apoio dos atuais gestores do Ministério da Cultura, conforme ficou claro nas explanações feitas pelos Secretário Executivo e de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC, respectivamente, Vitor Ortiz e Henilton Parente de Menezes.

Assim, a unanimidade absoluta em torno da proposta apresentada por Pedro Eugênio só não é ainda possível devido à existência de grupos que continuam defendendo publicamente a proposta da extinção sumária de qualquer legislação de incentivo e fomento à cultura fundamentada em mecanismos de renúncia fiscal. Tais grupos, que organizaram um protesto na frente local onde foi realizado o Seminário, apesar de serem atualmente visivelmente minoritários dentro do processo de discussão da matéria, prometeram continuar se mobilizando, protestando e fazendo barulho pelo menos enquanto o projeto não tiver sido definitivamente aprovado pelo Congresso e sancionado pela Presidenta Dilma Roussef.

Além de manter o principal objetivo do projeto original, que previa o aumento de recursos e fortalecimento do Fundo Nacional de Cultura (FNC), a proposta apresentada pelo deputado pernambucano apresenta várias inovações no sentido de corrigir muitas das distorções provocadas pela legislação atual. Entre as propostas, merecem especial atenção as que prevem a ampliação de 4% para 6% do percentual do Imposto de Renda devido destinado pelas empresas a investimentos; a incorporação de empresas com faturamento de até R$ 300 milhões ao universo de potenciais investidores, ampliando também de 4% para 8% o percentual do IR devido que estas empresas poderão aplicar; e a destinação ao FNC de 5% da renda de loterias federais.

Outra novidade diz respeito ao estímulo que deve ser dado ao funcionamento do Fundo de Investimento Cultural e Artístico (Ficart), destinado a aplicações financeiras em projetos culturais e artísticos, garantindo aos investidores uma dedução no Imposto de Renda devido de até 50%  do valor das cotas adquiridas.

Feitas todas as contas, segundo Pedro Eugênio, caso sua proposta seja aprovada, os recursos do FNC serão praticamente triplicados, devendo alcançar já no próximo ano cerca de R$ 900 milhões de reais.

A nova proposta estabelece também um sistema de pontuação que beneficia projetos e atividades que apresentem maiores “contrapartidas sociais”. Assim, quanto maior forem tais contrapartidas, como por exemplo, a gratuidade do produto e/ou serviço cultural, acessibilidade facilitada, difusão no exterior e ações educativas, maior será o abatimento do IR, estabelecendo através destes critérios percentuais de 30%, 50% ou 100% de dedução total do montante investido.

Está ainda previsto que as empresas que investirem em projetos e/ou atividades que receberem pontuação equivalente às faixas de apenas 30% e 50% de dedução poderão abater o valor total do investimento como despesa operacional, o que acarretará em mais descontos no final do processo.

Finalmente, modifica também pontos da legislação atual considerados injustos por vários setores da cultura, determinando que os critérios de classificação não se darão por segmento cultural e privilegiando projetos apresentados por produtores independentes.

O substitutivo busca ainda dar conta de resolver os problemas relacionados à concentração da captação e da aplicação dos recursos incentivados dentro do eixo Rio-São Paulo.

Praticamente todos os demais convidados que também “palestraram” no Seminário #Procultura, elogiaram efusivamente o trabalho desenvolvido pelo deputado pernambucano, apresentando apenas críticas amenas e bastante pontuais sobre a proposta apresentada.

A exceção ficou por conta da consultora e ex-secretária da Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural do MinC, Marta Porto, que foi bastante ácida e contundente em sua fala. Apesar de deixar bem claro que não é contra a continuidade da existência de mecanismos de financiamento baseados em mecanismos de renúncia fiscal, Marta deixou de lado a análise da proposta apresentada e criticou veementemente o fato do debate sobre financiamento da cultura no Brasil continuar centrado “apenas nos mecanismos relacionados à renúncia fiscal”.

Neste contexto, segundo Marta, “é preciso ressaltar que apesar dos avanços propostos no substitutivo apresentado pelo Deputado Pedro Eugênio, não existe nenhum dado ou estudo concreto que realmente aponte os impactos econômicos e financeiros que serão provocados pela aplicação destes novos mecanismos, sequer no orçamento do MinC”. Finalmente, também criticou “a falta criatividade e ousadia não só no debate sobre os mecanismos de financiamento da cultura, mas em relação a toda a política cultural que vêm sendo atualmente implantada no Brasil”.

Apesar dos avanços, antes mesmo de ser apresentada à Comissão de Tributação e Orçamento da Câmara, o projeto proposto pelo Deputado Pedro Eugênio parece já ter sofrido um primeiro e significativo retrocesso, já que, ao contrário de uma proposta que circulava anteriormente, o texto divulgado mantém a possibilidade da captação de recursos por organismos de caráter “estatal”.

Esse retrocesso foi criticado pelo Marv@da C@rne, que na condição de presidente do Congresso Brasileiro de Cinema também participou do Seminário #Procultura.

Infelizmente a manutenção da possibilidade de captação de recursos incentivados por qualquer tipo que for de ‘entidades’ que deveriam ser financiadas através de recursos orçamentários destinados por estados e municípios, além de ser injusta, não ajuda nem um pouco que consigamos avançar na tramitação da PEC 150 no Congresso.

Afinal, é inegável que essa situação é bastante confortável para governadores e prefeitos, que continuarão fazendo cortesia com o chapéu alheio e utilizando recursos federais para sustentar entidades e atividades culturais que deveriam ser financiadas com recursos dos orçamentos locais.

*Publicado originalmente na coluna Marv@da C@rne


Presiente do Congresso Brasileiro de Cinema

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *