Hoje vamos contar a história de um cara que usou o rock para mudar a realidade dos jovens das periferias curitibanas. Ele é Getulio Guerra, nosso segundo personagem da série #quemfazcultura. E por isso, nada melhor do que ouvir os Garotos Podres, cantando Rock de Subúrbio, para entrarmos no clima deste perfil e conhecermos o projeto que ele criou e toca há cinco anos: o PrasBandas.

s://www.youtube.com/watch?v=7bFDNSKxvBM

– Ei você, por favor, se apresente!

– Sou Getulio Guerra, tenho 40 anos, gosto de punk e rock brasileiro. Sempre fiz cultura. Organizava shows, mostra de bandas, de fotos. Fazia fanzine nos anos 1980, fui office-boy, estagiário em agência de propaganda, tive um escritório de desenho… Mas, a música sempre pesou mais.

Para as bandas e para todos

A ideia é simples. Em toda garagem, em todos os cantos das cidades, existem jovens querendo fazer música, seja um rock, um metal ou um pagode. Mas, nem sempre os festivais, as casas de shows ou mesmo os vizinhos dão espaço para as expressões dessa juventude criativa (que maneira elegante de dizer).

Então, ele juntou uns amigos, pegou equipamentos emprestados, montou um palco, chamou a família e abriu inscrições para os artistas dos bairros: poetas, pintores, músicos, fotógrafos. Assim começou o PrasBandas, que é uma associação, com 30 pessoas envolvidas, que promove oficinas culturais e uma mostra itinerante da produção dessas pessoas que não encontram onde mostrar sua arte. Uma verdadeira invasão cultural da capital paranaense, que acontece desde 2005, nessas áreas de risco, onde a falta de grana limita as arranca algumas possibilidades.

Reunião de Abertura da Associação PrasBandas. Foto Douglas Fróis.

“Nos anos 1980/90, teve muito marketing em cima de Curitiba, dizendo que era a ‘Cidade Sorriso’, ‘Cidade Modelo de 1º Mundo’… Esta era a forma que os governos acharam para capitalizar suas gestões, com esses bordões bobos. O que sei, é que aqui também tem mendigos pelas ruas, crimes, favelas, brigas em saídas de jogos de futebol. Até chacina no meio da rua onde demos aula rolou”, conta Getulio.

O projeto já deu voz a bandas e aos públicos de seis bairros periféricos: Sítio Cercado, em 2005; Xaxim, Boqueirão e Vila Hauer, em 2006; Uberaba e Bairro Alto, em 2009. Este ano, a invasão está indo para a 7a edição.

Festivais de música para a periferia, com bandas da periferia

– E como funciona, Getulio? Como vocês conseguiram tocar o projeto? Dinheiro de leis de incentivo, patrocínio, correria?

– Bom, as quatro primeiras edições foram na ‘brodagem’, equipamentos de amigos e equipe de voluntários. Cobrávamos apenas os ingressos para os shows, dois a três reais mais um livro usado que doávamos para as bibliotecas das escolas públicas do próprio bairro.

Correr por fora sempre foi o caminho, mas Getulio nunca abriu mão de nenhuma possibilidade:  “Entre 2006 e 2009, tentamos vários editais de incentivo e enfim conseguimos na Fundação Cultural de Curitiba. Assim, nas edições seguintes nada foi cobrado. Artistas do bairro com inscrições gratuitas e entrada franca para a comunidade. Os quatro primeiros foram no fluxo da boa vontade. Os seguintes no fluxo do incentivo.”

Além dos festivais, foi possível oferecer oficinas semanais e gratuitas na Escola Municipal Maria Marli Piovezan. Hoje, o PrasBandas está alugando uma casa dentro da Vila Icaraí, para dar as oficinas diárias de jornalismo, literatura, inglês, teatro, marcenaria e cinema: “Tudo de graça pra moçada de uma área de invasão – vulgo favela – que não tem muita opção de entretenimento e cultura, que geralmente aparece na mídia quando rola tiro, facada, sangue”, afirma Getulio cheio de esperança.

Porque o ar não tem dono

Enquanto a grana não rolava, um braço importante que o PrasBandas desenvolveu foi um programa na Rádio Bairro Novo, no Sítio Cercado, uma rádio comunitária.  Todos os domingos de 2008, das 18h às 20h, rolavam entrevistas com poetas, escritores, produtores, cineastas e bandas curitibanas que tocavam ao vivo no estúdio.

“Era um braço do projeto sim, onde o técnico de som era o meu irmão Gilberto Guerra e outros amigos, como Téo Arruda (jornalista) e João Acuio (psicólogo e astrólogo). Eles faziam comigo a bagunça toda”, conta.

A rádio ainda existe, mas o programa não acontece mais porque mesmo sendo comunitária, um candidato a vereador era o “proprietário”, afirma Getulio: “a direção queria que nós da equipe do programa fizéssemos campanha para o tal. Negamos. Resolvemos sair fora, mas neste ano vamos retomar com força.”

Tudo ao mesmo tempo agora

Getúlio é um cara família. Seu pai faleceu quando tinha 12 anos – era ora economista, ora professor de datilografia, ora corretor de imóveis: versátil. Sua mãe é professora aposentada, dava aulas para o primário para sustentar seus dois filhos: guerreira. Com esses valores, hoje, a família de Getulio também participa do PrasBandas.

Seu irmão Giberto, faz o site do projeto e dará aulas de Naturoterapia nas oficinas, seu filho Filipe, toca baixo na banda de apoio na oficina de Música. Sua prima dará aula de inglês. Seus sobrinhos também participam. “Mas não é só família, é um movimento que envolve todos da comunidade.”

Um movimento que envolve pessoas e formas de expressão. O PrasBandas acontece nas praças. Os gêneros que percorrem os palcos também são vários. Tocam bandas de qualquer estilo, desde que autoral, “mas a maioria são bandas de rock mesmo, o nome da mostra sugere, né? Site preto, logo preto (risos). Mas, já teve dupla caipira, sertanejo, grupo de rap, reggae, emo…”

Getulio Guerra na Praça Renato Russo. Foto Douglas Fróis.

Na terra, de bandas como 5 Graus, Charme Chulo, Terminal Guadalupe, em média, 25 bandas são inscritas em cada edição do festival, fora as bandas convidadas. Nas últimas edições, Maxixe Machine, Cásimu, Poléxia, Anacrônica e Carlos Careqa tocaram junto com as bandas da comunidade. “Antes, as bandas não tinham cachê, depois que ganharmos esse edital, pagamos cachê simbólico de 400 reais”, um estímulo para a cena e para a produção de mais coisas novas.

Hoje Getulio está na Coordenação do Fórum Permanente de Música do Paraná e desde o ano passado é Conselheiro Municipal de Cultura na área de Música com a intenção de agregar essas ações todas quebrar certos muros e criar certas pontes. Uma forma de reconhecimento de seu trabalho pelo poder público e pela sociedade organizada. “Sempre formamos parcerias com todos que se aproximam”, afirma.

Na data da publicação desta matéria, o CNPJ do projeto saiu na Receita Federal. Eles tem uma grande empresa interessada em apoiar o projeto “Casa de Cultura PrasBandas 1 – Jardim Icaraí”. Na reunião de abertura da ONG, Getulio chamou o assessor dessa empresa para explicar a todos o porquê de montar a associação, e ter o CNPJ: “Era a formalidade necessária para conseguir patrocínio.”

Para conhecer mais sobre este projeto do Paraná, acesse o www.prasbandas.mus.br e navegue pelas redes desse pessoal.

Getulio Guerra faz cultura.


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Repórter. Escreve sobre pessoas, convergência e cultura.

15Comentários

  • Priscila Rangel, 11 de fevereiro de 2011 @ 22:29 Reply

    Conheço o Geto, e sim, o cara faz e produz cultura!

    Tive o prazer de participar da primeira edição do projeto, e desde aí acompanho o PrasBandas…

    Iniciativas como esta, além de levarem cultura para a periferia, ainda dão uma força pros músicos e afins mostrarem o seu trabalho!

    Salve GG!!

  • Fagner, 12 de fevereiro de 2011 @ 13:44 Reply

    O Getúlio Guerra é um cara que não foge da luta (desculpa o trocadilho).

    Já faz um tempo (anos…) a gente organizou um evento musical aqui em Porto Alegre, RS. Esse é um cara que tem fibra, é um alquimista social.

    Faz de verdade e com menos recursos muito mais do que muita gente que só teoriza.

    Abraço pra vc GG!!!

  • Júnior, 12 de fevereiro de 2011 @ 13:52 Reply

    Caracas Geto!

    É isso ao irmão!
    Fazendo a cultura rolar onde muitos pensam ser impossivel!
    Se tivessemos mais pessoas como vc no mundo pode ter certeza que não teriamos guerras!

    Aquele abraços!

    Há!! Um salve pra toda galera do Prasbandas!

  • Getulio Guerra, 12 de fevereiro de 2011 @ 19:49 Reply

    Valeu Pri, Fagner e Junior!

    Pessoas como vocês entenderem qual é a nossa, é um incentivo e tanto =)

    Beijos!
    G

  • Isabela Matoso, 14 de fevereiro de 2011 @ 13:42 Reply

    Parabéns GG!

    E dá-lhe rock!
    beijo!

  • Michellito, 18 de fevereiro de 2011 @ 14:55 Reply

    Esse é o titio do coração que tanto da orgulho pra gente.

    Certamente em alguns anos veremos seu nome nos livros da história curitibana como um grande idealista revolucionário, acredito inclusive que terá o período apb e dpb (antes do prasbandas e depois o prasbandas), e o mais legal disso tudo é que posso chama esse cara que está revolucionando o conceito de cultura em curitiba de titio Geto…

    e como o titio sempre diz… ahushushuhsauhduhasuhasd

    Parabéns de novo mano, e rock prasbandas!

  • Marcus Pereira, 18 de fevereiro de 2011 @ 15:22 Reply

    Grande Getulio!

    Parabéns pelo PrasBandas que é uma iniciativa muito importante para movimentar a música nessa cidade, não apenas nos lugares velhos conhecidos da cena.
    Fomento pela música, seja da onde for!

    Salvê!

  • Getulio Guerra, 18 de fevereiro de 2011 @ 15:57 Reply

    Isa, Michelitos, Marcus… vocês fazem parte disso tudo, quando o projeto é para vocês e às vezes se faz através de vocês. Estamos juntos!

  • Carla Gavilan, 19 de fevereiro de 2011 @ 10:53 Reply

    Que iniciativa plausível,

    Do Getúlio pelo que é e da reprotagem em chegar até ele.
    Falo porque conheço Curitiba e nunca ia imaginar um projeto como esse. Quando se fala em Curitiba as imagens e referências são limitdas em museu do niemeyer, as ruas limpas, calçadas de paralelepípedos, o melhor transporte do brasil. realmente uma bela cidade. mas e o getúlio? não conhecia. quero retornar a curitiba e conhecer esse espaço.

    Parabéns a jornalista!

  • Getulio Guerra, 20 de fevereiro de 2011 @ 10:50 Reply

    Cara Carla =)

    Aquela Curitiba elitista, onde as produções culturais se concentram nos anéis centrais e nos bares da Trajano Reis, também tem outros tentáculos pela periferia.

    Quando vier pra cá, mantenha contato!

    Abraço

  • Luiz Giasson, 20 de fevereiro de 2011 @ 11:18 Reply

    O Getúlio tá de parabéns!

    O PrasBandas é inspirador!

  • Luciano Lacerda, 20 de fevereiro de 2011 @ 12:10 Reply

    O PrasBandas é um projeto maravilhoso. Além da oportunidade que oferece a muitos jovens coloca em discussão o prórpio sentido da arte.

  • Edu Baggio, 20 de fevereiro de 2011 @ 12:15 Reply

    Matéria muito bem escrita, à altura do brilhantismo deste projeto ímpar e vital à cultura de Curitiba. Matéria interessante até pra quem já conhece o projeto. Viva PrasBandas!

  • Getulio Guerra, 21 de fevereiro de 2011 @ 20:34 Reply

    Luizão, obrigado!

    Lu, a compreensão de vocês sobre nossas ações também é inspiradora! Vamos em frente, pra lá no futuro podermos continuar gerando isso…

    Edu, a Luana realmente mergulhou por duas semanas via GTalk e email querendo saber de tudo. Dedicada!

  • jaqcdbr, 27 de fevereiro de 2011 @ 3:07 Reply

    Bravo ! Arriba a musica ctbana!

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